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Inovações em Educação

Ação faz aluno maori melhorar desempenho escolar

Projeto Te Kotahitanga fortaleceu o ensino do povo nativo da Nova Zelândia e elevou seu desempenho acadêmico

por Carolina Lenoir ilustração relógio 22 de novembro de 2013

Os fãs de rugby já devem ter visto e se encantado com a performance que a seleção da Nova Zelândia, conhecida como All Blacks, faz antes de cada partida para intimidar o adversário. A haka, dança de guerra típica dos maoris, é uma das maiores expressões da cultura nativa do país, originada de um povo que, mais de 400 anos antes de Cristóvão Colombo existir, desbravou o Oceano Pacífico em pequenas canoas. Atualmente, dos 4,4 milhões de neozelandeses, 14,6% são nativos maoris – que se misturam a descendentes de europeus, asiáticos e outros povos das ilhas do Pacífico. Porém, o orgulho de uma parte importante da identidade nacional, como demonstrado pelos jogadores de rugby, não se estende às instituições de ensino.

O índices gerais de desempenho acadêmico dos estudantes maori são bem mais baixos que os dos alunos de origem européia e, de acordo com as estatísticas educacionais, é mais provável que eles abandonem os estudos com poucas qualificações. Em consequência, a população maori registra um nível de desemprego e pobreza mais alto do que o resto da população. O projeto Te Kotahitanga, da Universidade de Waikato, no entanto, foi criado para mudar esse cenário e fomentar uma relação positiva em sala de aula entre professores e alunos maoris, a fim de melhorar a performance educacional desses jovens.

crédito Renon Rijpen/ Flickr

Por um lado, o Te Reo Māori (idioma maori), os banquetes hāngi preparados em fornos de barro e as artes visuais, como a tatuagem, estão vivos e ativos na Nova Zelândia. Por outro, a contínua desigualdade social, econômica e política entre os descendentes angloeuropeus e os nativos maori sugere que só há espaço para uma cultura. Essa realidade intriga o professor Russell Bishop desde o início de sua carreira, há 30 anos. “Eu ficava abismado ao perceber que muitos alunos maoris começavam bem, mas fracassavam ao longo dos estudos. Eu conhecia as suas famílias, sabia que eles tinham raízes profundas em sua cultura. Ficava me perguntando por que esses garotos estavam indo tão mal”, conta o professor – ele próprio descendente das tribos Tainui e Ngati Pukeko, da Nova Zelândia, e de escoceses e irlandeses – em um texto publicado no site do projeto.

Para responder à questão, Bishop – atualmente professor de educação maori na Universidade de Waikato – conduziu, em 2001, um estudo em que 70 alunos maoris do ensino secundário foram entrevistados, assim como seus responsáveis, diretores e professores. Nas conversas foram discutidas as possíveis causas das disparidades educacionais entre nativos e não nativos e como isso poderia ser solucionado. Percebeu-se, então, que muitos professores atribuíam o baixo desempenho escolar dos maoris a algum tipo de déficit de aprendizagem ou a problemas comportamentais, quando, na verdade, o desânimo e a falta de conexão com a escola se deviam em grande parte ao fato de esses alunos não se virem representados no sistema tradicional de ensino. Os professores mantinham um viés monocultural que marginalizava uma parcela importante dos alunos.

Eles mostraram que, ao mudar a maneira como os professores se relacionam e interagem com os alunos maoris, seria possível criar um contexto de aprendizagem com resultados melhores.

“Em suas narrativas, os garotos claramente identificaram que a principal influência sobre o seu desempenho escolar era a qualidade das relações em sala de aula e as interações que tinham com seus professores. Eles mostraram que, ao mudar a maneira como os professores se relacionam e interagem com os alunos maoris, seria possível criar um contexto de aprendizagem com resultados melhores. Para isso, os professores precisariam teorizar de forma diferente não só sobre esses alunos, mas também sobre a sua própria capacidade de ajudá-los”, explicam os responsáveis pelo projeto, atualmente coordenado pela professora Mere Berryman.

A partir dessas entrevistas, foi desenvolvido o Effective Teaching Profile (ETP), uma espécie de guia pedagógico desenhado a partir das sugestões dadas durante o estudo. Entre elas estão dar um enfoque interdisciplinar na relação de cuidado e aprendizagem, abrir espaço para alunos e pais contribuírem para a reforma escolar e transformar os métodos tradicionais de pedagogia em práticas que envolvem mais diálogo e interatividade. Para isso ser possível, o Te Kotahitanga capacita professores e usa as experiências contadas pelos alunos maoris nas entrevistas como ponto de partida para reflexão, discussão e elaboração de planos e estratégias. Cada escola atendida conta com facilitador para ajudar a dar continuidade ao programa. Atualmente, o Te Kotahitanga atinge 15 mil alunos maori e envolve cerca de 4 mil professores neozelandeses.

O intuito é que eles consigam cumprir seis passos básicos do ETP: o Manaakitanga, em que os professores se importam com os estudantes como seres humanos com identidades culturais acima de tudo; o Mana motuhake, em que se preocupam com a performance educacional dos seus alunos; o Nga whakapiringatanga, em que são capazes de criar um ambiente de aprendizagem seguro e bem administrado; o Wananga, em que conseguem se engajar em interações efetivas de ensino com os estudantes maoris levando em consideração sua cultura; o Ako, em que usam estratégias para promover essas interações;  e o Kotahitanga, em que estimulam, monitoram e refletem sobre os resultados dessa abordagem em parceria com alunos e comunidade.

Análises recentes do programa revelam que as escolas que implementaram o ETP de forma eficiente perceberam uma melhora dramática do desempenho dos alunos maoris, especialmente o aumento do número de estudantes no último ano do ensino médio.  O projeto – que foi anunciado como um dos seis vencedores do Wise Awards 2013, prêmio que destaca ideias inovadoras em educação em todo o mundo – tem como objetivo ser implementado em outras 100 escolas do país, atingindo um total próximo a 70% dos estudantes maoris na Nova Zelândia.


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