Aula de física dá origem a projeto sobre mobilidade urbana - PORVIR
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Diário de Inovações

Aula de física dá origem a projeto sobre mobilidade urbana

Para tornar a disciplina mais próxima da realidade, professor relata como trabalhou conteúdo de cinemática com o estudo de problemas sociais e econômicos gerados pelo trânsito

por Carlos Eduardo Rosas de Toledo ilustração relógio 6 de fevereiro de 2018

O ensino de física no Brasil está escondido em um trincheira que afasta os alunos de uma das ciências fundamentais para a formação do cidadão global. Por problemas históricos e econômicos, ele se tornou cada vez mais teórico, repleto de exercícios repetitivos. As aulas se tornaram enfadonhas para a grande maioria dos alunos que, paradoxalmente, consomem como nunca a ciência e a tecnologia do século 21 através de filmes, séries, livros, revistas, aplicativos, entre outros.

Buscando aproximar a física do aluno pós-moderno, desenvolvi uma atividade sobre mobilidade urbana no estado do Rio de Janeiro. A proposta foi buscar um momento que juntasse atividades de avaliar e de aprender no mesmo instrumento. Os alunos deveriam ser mais do que testados em problemas, mas teriam que aprenderem com a prova e também refletirem sobre a aplicação real do tema.

O tópico que estava sendo trabalhado era a cinemática escalar, ou seja, o estudo do movimento ou matemática do movimento. Ao final do bimestre, foi aplicada uma avaliação para os alunos. Essa atividade foi realizada em trio e com uso de computadores, celulares e internet. A prova iniciou com um texto sobre problemas econômicos gerados pelo trânsito na região metropolitana do estado.

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Na reportagem, os alunos leram os depoimentos de pessoas de baixa renda que precisavam acordar e sair de casa muito cedo para chegarem ao trabalho no horário. A partir da realidade do depoimento de um entrevistado, os alunos tiveram que buscar, em um site de anúncio de imóveis, um local para alugar com o salário de um empregado doméstico da cidade do Rio de Janeiro.

O primeiro impacto observado foi que os alunos, residentes nas regiões mais nobres do Rio de Janeiro, não encontravam lugares para alugar dentro do valor sugerido. Os únicos imóveis encontrados ficavam localizados muito distantes da escola em que estudam. O local encontrado, em geral, fora da capital, foi o ponto de partida para toda a avaliação.

Com o endereço do imóvel, os alunos acessaram o Google Maps (aplicativo gratuito do Google que disponibiliza mapas, rotas e tempos de deslocamentos). Eles tiveram que determinar a rota a ser tomada entre o imóvel encontrado e a escola deles. Para dar realidade, o horário de partida foi colocado para às 6h da manhã, de forma que o aplicativo utilizasse os dados do tráfego para o horário. Com essa informação, os alunos tiveram que detalhar toda a viagem passo a passo. Eles determinaram a distância do imóvel e o tempo da viagem e, assim, calcularam a velocidade média da viagem, analisando, posteriormente, o baixo valor encontrado.

Com o tempo de viagem, eles calcularam anualmente quanto uma pessoa gasta para ir e vir do trabalho morando na localidade do imóvel e trabalhando na região mais cara do Rio de Janeiro, onde estão concentrados a maioria dos empregos da cidade. Os resultados impressionaram os alunos quando encontraram o valor de aproximadamente 40 dias inteiros por ano dentro do transporte público.

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Ainda com os dados da rota, eles calcularam os valores gastos com os custos de transporte. Fazendo uma troca no modal de transporte do site, de transporte público para automóvel privado, eles puderam calcular a velocidade média desse deslocamento. O valor foi comparado com o dado do transporte público. A partir deste, também, os alunos calcularam o consumo de combustível e o custo mensal da viagem utilizando automóvel privado.

Ao final de uma série de muitas questões, que misturavam a física tradicional e a relação social da ciência, os alunos tiveram que apresentar duas propostas de soluções para melhoria da mobilidade urbana na região metropolitana do Rio de Janeiro e, se possível, apresentar referências de locais em que as soluções foram aplicadas com sucesso.

O resultado da avaliação foi muito positivo. Aplicando a prova, notava-se que os alunos não se sentiam pressionados pelo momento e que estavam aprendendo com o instrumento de checagem. Eles mesmos escreveram, no final da prova, o que acharam da iniciativa. Um aluno escreveu a seguinte mensagem: “Pela primeira vez sinto que aprendi num teste, que os conhecimentos exatos e humanos se fundiram para propor uma questão pertinente, que me afetou, me sensibilizou e fez com que eu me importasse mais com a questão. Só posso dizer: OBRIGADO!!!”.

Essa avaliação buscou tornar a física mais próxima da realidade, contribuindo para a formação de um cidadão global consciente, que pensa nas relações e impactos da ciência e tecnologia na sociedade. Assim como, tentou fazer com que o “momento da prova” fosse também um “momento de aprendizagem”. Os desdobramentos desse trabalho são muitos. Eles poderiam se estender para um bimestre inteiro de aprendizado transdisciplinar.

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Carlos Eduardo Rosas de Toledo

Doutor e mestre em Educação; certificado em Gestão Escolar e Liderança pela Harvard; Líder Escolar Internacional pelo Principals' Training Center; MBA em Gestão Empresarial; pós-graduado em Administração Escolar, Orientação Educacional e Supervisão Pedagógica; licenciado em Física. Atualmente, coordena o ensino fundamental 2 da Escola Eleva e atua como consultor educacional nas áreas de Gestão, Formação de Professores e Currículo.

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ciências, ensino fundamental, ensino médio

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