O Silva que deu asas ao Brasil - PORVIR

Inovações em Educação

O Silva que deu
asas ao Brasil

Fundador da Embraer, ministro e presidente de empresas como Varig e Petrobras, aos 82, Ozires Silva agora se dedica à educação

por Patrícia Gomes ilustração relógio 15 de maio de 2013

O passo curto e a estatura um tanto curvada se contrastam com o vaivém desse homem que, numa tarde gelada de terça-feira, percorria diligente o andar de um prédio num dos centros empresariais nervosos de São Paulo. Ele começa a conversa pedindo duas desculpas. A primeira, porque precisaria que falasse alto, uma vez que seus ouvidos de aviador não andam funcionando bem. A segunda, porque seu tempo é breve, já que precisa arrumar as coisas e embarcar para Belo Horizonte naquele mesmo dia. “Hoje não sei a que horas vou dormir”, diz, cheio de ideias e vitalidade, Ozires Silva, piloto de avião e engenheiro aeronáutico que fundou a Embraer e coleciona muitos grandes feitos ao longo de sua vida profissional. No auge de seus 82 anos, não pensa em parar e está com a agenda lotada de compromissos profissionais para os próximos meses. Na semana que vem, por exemplo, é um dos principais palestrantes da Educar Educador, maior feira de educação da América Latina, que ocorre em São Paulo, e falará de alguns dos temas que mais lhe têm empolgado ultimamente: inovação, empreendedorismo e transformação do Brasil pela educação.

Além de fundador da Embraer, empresa onde passou mais de 20 anos de sua vida, Silva também é ex-presidente de empresas como Petrobras e Varig, foi  ministro de Infraestrutura do governo Collor, em 1990. Há cinco anos, entrou de cabeça novamente no mundo dos bancos escolares, se tornou reitor da universidade Unimonte, localizada em Santos, e dá palestras nas outras instituições de ensino superior do Anima, grupo educacional que controla três universidades, num total de 42 mil alunos. Mantém um blog e escreve artigos periodicamente na imprensa tentando fazer com que a sociedade assuma a educação como uma bandeira. De quebra, anda por Brasília tentando convencer o governo a desonerar impostos da educação.

Ozires Silva, o homem que deu asas ao Brasilcrédito dlrz4114 / Fotolia.com

Com o projeto Transformando o Brasil pela Educação embaixo do braço, bateu à porta do Congresso e do MEC. Está agora com conversas marcadas para debater sua ideia. “Não tive notícias de que educação seja taxada em algum país do mundo. Mandei um e-mail para a Austrália e eles nem sequer entenderam a pergunta, de tão absurda que lhes pareceu”, disse. No seu plano, ele defende que os alunos não sejam tributados, que se estimule as doações e que não se cobre imposto das empresas que treinem seus funcionários. “As rupturas do conhecimento, que levam às quebras de paradigmas, são cada vez mais frequentes e é possível antecipar que, pela frente, vamos ver coisas muito novas, não somente transformando o mundo, mas substituindo empresas líderes por outras que trazem produtos diferentes que vençam a preferência dos consumidores”, disse ele.

Ele [um professor de matemática de sua adolescência] me dizia que a educação tem o potencial de mudar vidas. Eu acreditei

O desejo de se dedicar exclusivamente à educação se deve à vontade de falar aos jovens sobre a necessidade de se preparar para essa realidade que se aproxima e é uma forma, diz ele, de levar adiante palavras que ouviu de um professor de matemática ainda na adolescência, em Bauru (SP), e que martelaram na sua cabeça ao longo de toda a sua vida. “Ele me dizia que a educação tem o potencial de mudar vidas. Eu acreditei”, diz Silva. Para um jovem de família humilde e que não queria seguir a vocação ferroviária da cidade, foi o incentivo de que precisava para procurar novos caminhos. E seu caminho não estava nos trilhos, como era de se esperar, mas nos céus. O encanto pelo que um brasileiro chamado Santos Dummont havia feito, em Paris, algumas décadas antes o fez procurar o aeroclube baurulino. Lá ele teve a certeza de que o que queria mesmo era construir aviões. Ousadia demais? Ele não achava. Era só estudar.

Mas o plano, nos idos da década de 30 e 40, tinha um problema: no Brasil, não havia escola que ensinasse a fazer aviões. A frota brasileira era composta por aeronaves trazidas dos EUA e da Europa. O jovem Silva chegou a ensaiar uma conversa por carta com empresas norte-americanas, mas logo entendeu que havia um meio mais viável de estar perto de asas, turbinas e hangares: se não podia fazer um avião, ele podia tentar pilotar. As palavras do tal professor ecoram novamente na cabeça de Silva, que decidiu deixar Bauru para se matricular na escola de formação de pilotos da Aeronáutica.

Ozires SilvaDivulgação

Conheceu o Brasil inteiro nas cabines de comando dos aviões da FAB, ofício que adorava, mas ainda não era o suficiente. Foi aí que um dia, meio que por acaso, ouviu falar do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), uma escola de engenharia que começava a se estruturar no fim da década de 50. E a educação entra mais uma vez colocando a vida de Silva, já um piloto respeitado, de ponta-cabeça. Buscou as permissões necessárias e voltou a ser aluno para se tornar engenheiro aeronáutico. Na época, fora considerado “o mais aeronauta dos engenheiros” e acabou designado para o setor de aeronaves da FAB (Força Aérea Brasileira). “Foi aí que comecei a pensar que o Brasil tinha que começar a construir aviões.”

A indústria aeronáutica, na época, era incipiente e com iniciativas isoladas aqui e ali. Silva se inquietava com isso. Achava que deveriam inovar. “Eu dizia para os meus colegas: temos que iniciar um projeto de um avião diferente. Um avião que nem os franceses nem os americanos façam.” Numa madrugada de trabalho, então, veio o clique. Em meio a uma papelada sem fim de um relatório que precisava entregar, o engenheiro viu dois documentos que o fizeram entender do que o Brasil precisava. Um documento de 1957 mostrava que 360 cidades atendidas pelo transporte aéreo. Em 1964, eram 45. O número havia caído drasticamente, “o que não fazia o menor sentido”, considerou. O que o Brasil precisava, entendeu ele na hora, era de um transporte regional, menor, adaptado às pistas brasileiras.

Por várias vezes na minha vida, eu estava no lugar certo, na hora certa e com a qualificação certa. Mas se eu não tivesse me qualificado, a sorte ia bater à porta e eu nem ia reconhecer a oportunidade

Nascia a ideia do Bandeirantes, o avião que faria com que a Empresa Brasileira de Aeronáutica fosse criada, em São José dos Campos, do ladinho do ITA. Hoje, 50 anos depois da criação da Embraer, os frutos que a empresa liderada por Silva já deu não são poucos. Não só a empresa deu consistência à aviação comercial do país e o colocou como um importante ator no mercado internacional, mas fomentou, na região onde está, o espírito de empreendedorismo entre os jovens que saem do ITA. “Tenho ido falar com esses meninos e o terreno é muito fértil. A gente tem mais é que estimular”, diz Silva, que ultimamente também tem se dedicado a falar sobre empreendedorismo e inovação para as novas gerações.

Mas o que será que esses jovens precisam ter para impactar a realidade onde vivem? Capacitação, espírito inovador e, claro, um pouquinho de sorte. “Por várias vezes na minha vida, eu estava no lugar certo, na hora certa e com a qualificação certa. Mas se eu não tivesse me qualificado, a sorte ia bater à porta e eu nem ia reconhecer a oportunidade”, avalia o empreendedor. Brincando com a sua idade avançada, diz esperar que a educação mude a vida dos jovens, assim como mudou a sua. “Só a educação pode transformar o Brasil”, conclui a conversa e sai correndo. Já estava atrasado para o voo.

Educar Educador

Silva dará uma das palestras magnas da feira Educar Educador, na próxima quarta-feira, das 18h às 19h30. O tema deste ano é Educação 3.0. A Escola do Futuro chegou? O evento, que vai de 22 a 25 e maio, reúne um congresso sobre educação com mais de uma centena de participantes e uma feira para exposição de produtos educacionais. A entrada para a feira é gratuita. Para o congresso, as inscrições variam de R$ 690 a R$ 1.200, a depender da quantidade de dias ou do número de palestras desejados. O Porvir ganhou duas cortesias e vai fazer uma promoção para oferecê-los a seus leitores. Acompanhe!

 


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