Escolas prontas para o futuro? A desigualdade tecnológica diz o contrário
O avanço tecnológico contrasta com a falta de infraestrutura e gera uma pergunta central: quem está entrando, de fato, na educação do futuro?
por Débora Garofalo
8 de dezembro de 2025
A educação brasileira vive um momento de profundas transformações. Tecnologias como IA (Inteligência Artificial), realidade aumentada e mista, microlearning (aprendizagem baseada em conteúdos curtos) e plataformas adaptativas consolidaram-se como tendências educacionais em 2025. Elas trazem a promessa de personalizar o ensino, apoiar a prática docente e ampliar as possibilidades de aprendizagem dos estudantes.
No entanto, ao mesmo tempo em que essas ferramentas avançam, o país enfrenta desafios estruturais importantes: desigualdade de acesso à internet, escolas com infraestrutura insuficiente, dificuldades de manutenção e uma demanda crescente por formação docente para o uso efetivo das tecnologias.
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Sem uma estratégia cuidadosa, a inovação corre o risco de aprofundar desigualdades que já marcam a educação brasileira. Por isso, pensar em tecnologia é também pensar em inclusão digital e educacional — garantindo que todos tenham condições de aprender, criar e participar.
Panorama atual da tecnologia na educação brasileira
Embora a conectividade tenha avançado, a realidade ainda é desigual. Dados do Censo Escolar 2023 mostram que cerca de 94% das escolas urbanas têm acesso à internet, mas apenas 61% possuem conexão adequada para uso pedagógico. Em áreas rurais, esses números são ainda menores. Além disso, menos de um terço das escolas públicas conta com laboratórios de informática atualizados e plenamente funcionais.
Esses indicadores revelam que a transformação digital depende não apenas de equipamentos, mas de infraestrutura contínua, suporte técnico e, principalmente, de formação de professores para integrar essas ferramentas ao currículo.
Inovações que estão transformando a prática educativa
Apesar dos desafios, redes públicas e privadas têm implementado práticas inovadoras que mostram o potencial da tecnologia na aprendizagem. Confira alguns modelos:
Aprendizagem adaptativa e personalização – Plataformas com IA identificam dificuldades dos alunos, sugerem trilhas personalizadas e ajudam o professor a planejar intervenções mais precisas.
Gamificação e metodologias ativas – Desafios, missões, avatares e recompensas aumentam o engajamento e favorecem a participação ativa dos estudantes.
Realidade aumentada e virtual – Ferramentas imersivas tornam conceitos complexos mais acessíveis, especialmente em ciências, geografia e história.
IA como assistente pedagógica – Correção automática de textos, criação de atividades, diagnósticos formativos e organização da rotina são alguns dos usos que têm ganhado força.
Tais práticas mostram que a tecnologia não substitui o professor: ela expande suas possibilidades de atuação.
Cuidados com os alunos e com os professores
Para que a inovação seja verdadeiramente transformadora, é essencial considerar seus riscos, como a desigualdade de acesso — que ainda afeta especialmente estudantes de baixa renda, áreas rurais e periferias — e a formação docente insuficiente, pois muitos professores desejam usar novas tecnologias, mas carecem de tempo, suporte e orientação prática.
Soma-se a isso o desafio da manutenção e da sustentabilidade, pois, sem suporte técnico e atualização, laboratórios e equipamentos tornam-se rapidamente obsoletos. Além disso, quando a tecnologia não é integrada ao currículo com intencionalidade pedagógica, ela corre o risco de se tornar apenas um adereço, sem impacto real na aprendizagem
Para que a tecnologia realmente beneficie os estudantes, seu uso precisa ser intencional e cuidadosamente planejado. Isso começa com um alinhamento claro ao currículo, orientado por perguntas pedagógicas essenciais: o que os alunos precisam aprender? Como a tecnologia pode apoiar esse processo? Quais atividades favorecem investigação, criação e resolução de problemas? A tecnologia deve ser escolhida não pela novidade, mas pela capacidade de aprofundar a aprendizagem.
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A formação continuada dos educadores é outro eixo fundamental. Professores precisam de tempo, espaços seguros e oportunidades práticas para explorar ferramentas, testar possibilidades e refletir sobre suas experiências. Formações mão na massa, grupos de estudo e comunidades colaborativas ajudam a transformar o uso da tecnologia em prática cotidiana, e não em esforço pontual.
A inovação precisa ser acessível e equitativa. O uso de tecnologias de baixo custo, como atividades desplugadas, cultura maker e robótica com sucata, democratiza a aprendizagem e evita que escolas com menos infraestrutura fiquem para trás. Criar uma cultura de experimentação, começando pequeno e ajustando continuamente, fortalece a inovação pedagógica. Acima de tudo, é essencial priorizar os estudantes que mais precisam, garantindo acessibilidade, diversidade e participação plena em todos os processos.
Para que os avanços sejam reais e consistentes, a integração entre políticas públicas, escolas e educadores precisa ser intencional e colaborativa. A tecnologia tem potencial para transformar a aprendizagem, personalizar trajetórias e ampliar oportunidades, mas isso só acontece quando está conectada a práticas pedagógicas significativas e a um compromisso genuíno com a inclusão e a equidade.
O sucesso da educação brasileira depende, sobretudo, da capacidade de colocar o estudante no centro e de apoiar continuamente os professores, que seguem sendo os verdadeiros protagonistas da inovação.
Débora Garofalo
Professora, mestra em Educação, gestora em inovação, integrante da comissão municipal de Direitos Humanos, embaixadora do Instituto Ayrton Senna e da Varkey Foundation. Considerada uma das 10 melhores professoras do mundo pelo Global Teacher Prize.





