Malala incentiva meninas brasileiras a lutarem por educação - PORVIR
Crédito: Vinícius de Oliveira

Inovações em Educação

Malala incentiva meninas brasileiras a lutarem por educação

Em um discurso de paz e empoderamento, a paquistanesa ganhadora do prêmio Nobel diz que não se pode ignorar a situação de meninas fora da escola

por Vinícius de Oliveira ilustração relógio 10 de julho de 2018

Com um chamado para que todas as meninas brasileiras lutem por educação de qualidade, reforçado por um discurso de paz e o anúncio de apoio a ativistas locais, a paquistanesa Malala Yousafzai, mais jovem ganhadora do Nobel da Paz, participou nesta segunda-feira (9) de um evento promovido pelo Banco Itaú, em São Paulo (SP).

Diante de um auditório repleto de jovens, sendo a maioria meninas, Malala até disse algumas vezes “obrigada” em sua apresentação inicial antes de se juntar ao debate com a jornalista Adriana Carranca (autora do livro “Malala, a menina que queria ir para a escola”), a escritora mineira Conceição Evaristo; Tia Dag, educadora que criou a Casa do Zezinho, Tábata Amaral, cofundadora do “Movimento Mapa Educação”, e Ana Lucia Villela, presidente do Instituto Alana.

“Eu recebi muitas cartas e bilhetes de apoio aqui do Brasil e mensagens dizendo ‘Malala, por favor, venha para o Brasil, nós queremos ver você aqui’. Era meu sonho vir aqui e finalmente aqui estou”, disse. Algumas dessas mensagens partiram de crianças como Alexya Nunes Soares, 12, João Victor Veiga Ferreira, 11, e Eduardo de Oliveira Barcelar, 11, que no ano passado conheceram o livro “Malala, A Menina Que Queria Ir Para A Escola” durante um projeto leitura do 5º ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental Professora Izabel Aparecida Cristóvão da Luz. “No passado, teve uma votação para escolher o livro de leitura e o da Malala Ganhou”, disse Eduardo. “O que chama mais atenção é que ela fez de tudo para estudar e até levou um tiro, sendo que hoje aqui ninguém quer estudar. Todo mundo quer sair da escola”, completou.

Após as falas iniciais, Malala relembrou a própria história, quando foi vítima de um atentado a tiros por parte do grupo extremista Taleban. Ela assinava um blog para a BBC Urdu e denunciou fechamento de 150 escolas e a destruição de outras cinco pela milícia radical talibã. Meninas eram ameaçadas de morte e muitas tiveram que deixar suas casas. Em outubro de 2012, as ameaças se materializaram e Malala foi baleada quando voltava para casa, na cidade de Mingora. Homens armados pararam a van escolar e um deles perguntou quem era Malala. Ao se identificar, a menina foi atingida na cabeça.

“Eles entenderam que o empoderamento das mulheres é possível por meio da educação e é por isso que não queriam deixar as meninas estudarem. A educação tem a ver com envolvimento e emancipação das mulheres. Desde então, eu tenho defendido a educação de qualidade para meninas em nível global”, disse.

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Essa necessidade de emancipação é vista por ela até mesmo na Universidade de Oxford, na Inglaterra, onde cursa Filosofia, Política e Economia. “Mesmo em uma universidade importante, de prestígio como Oxford, em que há igualdade entre meninos e meninas, eu vejo diferenças de comportamento. Eles parecem superconfiantes, acham que sabem tudo, sempre falam o que pensam, se sentem muito à vontade, enquanto as meninas hesitam, não se sentem tão à vontade falando o que pensam. Mas nós temos que acreditar em nós mesmas”.

Em outro momento, ao tratar da importância da leitura, Malala lembrou da história da própria família. “Não era minha mãe que lia para mim, eu que lia para minha mãe. Quando ela tinha 6 anos, vendeu os livros e não consegui mais estudar. Agora, ela está aprendendo novamente, está lendo, e eu me sento ao lado dela para ajudar. Como filha, ler para a minha mãe é uma experiência maravilhosa porque há tanta coisa que podemos aprender com isso. Ela é inspiração para mim”.

Ao tratar especificamente do Brasil, Malala disse que um dos objetivos é discutir meios para que 1,5 milhão de meninas que estão fora da escola tenham acesso a educação e possam dar sua contribuição ao país não apenas individualmente, mas também ajudando a melhorar a democracia e trazer estabilidade ao país. “Não podemos ignorar isso”.

Para apoiar projetos que promovem a educação de meninas no país, a visita também envolveu o Malala Fund, fundo criado por ela que combina apoio a redes de ativistas e educadores, ações de incidência política em defesa de investimentos e ações com grupos de meninas. “Meu objetivo era vir aqui para investir no Brasil, trabalhando junto com todos os defensores da educação com a esperança que um dia todo mundo desperte e cada menina tenha acesso à educação de qualidade, realize seus sonhos e se torne médica, engenheira, líder e não se torne vulnerável, alvo de discriminação ou vítima de tráfico de criança.”

Mesmo com uma trajetória de vida marcada pela violência, a jovem paquistanesa declarou que por mais que seja necessário lutar pela quebra de barreiras, esse movimento deve seguir um discurso livre de ressentimento. “Quando você transmite sua mensagem de modo pacífico, demonstra poder, e as pessoas não podem te ignorar.”

Investimento no Brasil

O Malala Fund, organização fundada pela ativista paquistanesa, anunciou nesta terça-feira (10) o apoio a três iniciativas lideradas por brasileiras em seu primeiro investimento na América Latina. Os projetos Mirim, Anaí e Ação Educativa vão integrar a Rede Gulmakai, divisão da organização dedicada a apoiar ativistas e educadores em países onde as meninas enfrentam barreiras para ter acesso à educação. O nome Gulmakai faz referência ao pseudônimo usado por Malala aos 11 anos. quando escrevia para um blog da rede britânica BBC sobre a censura imposta pelo Taleban à educação de meninas e mulheres paquistanesas.

Quem são as três ativistas:

– Sylvia Siqueira Campos: líder do Mirim (Movimento Infanto-Juvenil de Reivindicação), criado em 1990 no Recife (PE). Ela está coletando dados sobre o custo financeiro para o poder público a respeito da evasão escolar de meninas para ajudar a aumentar o número de meninas negras e indígenas que concluem a educação básica.

– Ana Paula Ferreira de Lima: coordenadora da Anaí (Associação Nacional de Ação Indigenista), criada em 1979 e formalizada em 1982, em Salvador (BA). Ex-professora, Ana Paula trabalha para aumentar o número de meninas indígenas que concluem os estudos no estado. Ela lidera um estudo que avaliará o estado atual da educação no Brasil e como as meninas são afetadas. Ela também conduz uma campanha estadual pelo aumento no financiamento da educação e a formação de 60 meninas indígenas como jovens defensoras.

– Denise Carreira: jornalista, pesquisadora e ativista educacional, atualmente coordena a Ação Educativa, fundada em 1994, em São Paulo (SP). Para promover um ambiente escolar mais tolerante, ela está desenvolvendo um curso online para formar professores em igualdade de gênero. Ela também está trabalhando na publicação de um relatório sobre violência e discriminação de gênero e planeja pesquisar a qualidade de educação em 15 escolas de ensino médio no Brasil.


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