‘Levar foco no resultado a escola já foi mais difícil’
Tatiana Filgueiras, do Instituto Ayrton Senna, conta experiência de traduzir universo das empresas ao do governo, e vice-versa
por Patrícia Gomes 23 de agosto de 2013
Há 15 anos, quando Tatiana Filgueiras, do Instituto Ayrton Senna, começou a trabalhar com educação no terceiro setor, havia um problema quase “de linguagem”, lembra a gerente de avaliação e inovação da organização. De um lado, as escolas e os gestores públicos com os quais iniciava parceria não estavam familiarizados com a visão do foco em resultado importado do meio empresarial. De outro, o empresário, que financiava os projetos, não entendia o que era nem do que necessitava a educação pública brasileira. Alguns anos depois, com a educação entrando na agenda pública, esses universos tão diferentes começam a se entender. A especialista participará da sessão que discutirá a importância na articulação dos setores público, privado e social para a educação durante o congresso do Todos Pela Educação, em setembro.
“Levar foco em resultado para as escolas públicas já foi mais difícil”, afirma Filgueiras, sobre o início de seus projetos com professores e diretores de escola, nos anos 90. “Trazíamos a lógica do universo empresarial para a escola, e isso era totalmente novo para eles. Quando falávamos da necessidade de termos dados sobre o trabalho que faziam, havia um estranhamento. Aos poucos, entendiam a proposta e a confiança se estabelecia”, diz a especialista. Na época, lembra ela, era muito difícil encontrar uma rede educacional que tivesse a cultura de coletar e analisar dados. Mas, com o tempo e com os trabalhos de várias entidades do terceiro setor mostrando resultados, a resistência foi diminuindo, diz ela. “Hoje, as pessoas das redes de ensino já estão convencidas de que isso é importante, apesar de nem todas terem implementado seus sistemas de trabalho com base em evidências.”
Da parte dos empresários, também foi preciso o que Filgueiras chama de “ajuste de olhar”. “Quando eles investiam em uma ação, esperavam resultados baseados nos parâmetros que eram acostumados com seus negócios. Eles precisaram entender que educação não é assim”, afirma a especialista. Apesar da boa vontade de ajudar – potencializada por um volume importante de verbas que o setor privado passou a destinar a projetos de responsabilidade social – nem sempre a visão que os empresários tinham de educação básica se aproximava da realidade. A base de comparação era a educação a que seus filhos tinham acesso ou sua própria experiência décadas antes. “Nosso papel, no terceiro setor, foi apresentar um mundo para o outro, traduzir as necessidades de cada um”, resumiu ela.
Apesar de esses mundos estarem mais próximos do que há alguns anos, Filgueiras destaca a necessidade de os três setores agirem em uma concertação para colocar os saberes e especialidades de cada setor em favor de uma educação melhor. “É preciso haver um diálogo intersetorial para que se deixe claro que rumo vamos dar para a educação. Se não, uma escola assistida recebe 20 pequenos projetos e ninguém sabe o que é prioridade”, alerta Filgueiras. “Ainda há muito a se fazer, principalmente com planos inteiros que se perdem devido a mudanças de governo. Mas o inegável é que alguns passos foram dados e isso não tem mais volta”, diz a especialista, otimista com o que vem pela frente.
O Porvir é parceiro do Todos Pela Educação no congresso que traz para a discussão a educação como uma prioridade nacional. O evento, que é gratuito, acontece nos dias 10 e 11 de setembro, em Brasília. Se você não puder participar, acompanhe os destaques por nossas redes sociais.