Jornada de coordenadores de tecnologia demanda competências além das digitais - PORVIR
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Inovações em Educação

Jornada de coordenadores de tecnologia demanda competências além das digitais

Para tornar a escola uma aliada da tecnologia, profissionais precisam saber se comunicar para estabelecer consensos, conhecer novas leis e mostrar benefícios para o dia a dia das equipes

Parceria com Isaac

por Ana Luísa D'Maschio ilustração relógio 30 de maio de 2023

Quando foi entrevistada para trabalhar na Escola Castanheiras, em São Paulo, Graziella Matarazzo contou sobre sua experiência na gestão e como costumava implementar a tecnologia educacional por onde passou. “Precisamos repensar esse posto. Vamos refazer a proposta e ligar novamente”, disseram os recrutadores. Eles entenderam que precisavam de mais do que um gestor: criaram, então, a vaga de coordenação de tecnologia educacional, que Graziella ocupa há quase três anos. 

“Quando entrei, começamos a pensar na área de tecnologia como uma área pedagógica. Eu sou pedagoga, com mestrado em educação, sei que existe resistência de alguns educadores com a tecnologia, com aquela ideia de que pode vir mais demanda. Sempre digo: ‘Sou professora igual a você’ e essa abordagem ajuda muito”, explica Graziella. Ela é uma das responsáveis pelo currículo de tecnologia da escola, inspirado no Currículo da Cidade e no Currículo de Tecnologia e Computação do CIEB (Centro de Inovação para a Educação Brasileira).

Empatia e boa comunicação estão entre as competências do líder responsável pela tecnologia, explica Ana Paula Gaspar, especialista em tecnologias educacionais. “Por saber que a tecnologia é um campo novo na educação, o coordenador de tecnologia é uma espécie de tradutor da parte técnica para a parte pedagógica e vice-versa. Ele precisa ter bastante alteridade para compreender o vocabulário, a visão de mundo e como as pessoas dos diferentes lados entendem e resolvem os problemas juntas.”

A equipe de Graziella, formada por oito integrantes, entende que a parceria com os diferentes setores é um ponto chave para o desenvolvimento do setor. “Temos de ter a consciência de que a área está próxima e faz parte do pedagógico. Nosso currículo é transversal e eu não posso desconhecer o que está acontecendo na escola ou em outros currículos, porque senão nunca vou encontrar oportunidades de parcerias. Transitar entre todas as áreas da escola é bastante importante”, pontua. 

Comunidade digital

Trabalhar com busca ativa e mostrar ganhos e vantagens da tecnologia pode encantar os professores e a equipe escolar, comenta Graziella. Ela se lembra de um episódio no qual alguns educadores se preocuparam com o fato de os alunos acessarem conteúdo inadequado durante as aulas. Queriam uma solução técnica, como um filtro ou senha para limitar a busca. “Reunimos os professores e dissemos: ‘Que tal fazermos mais do que isso?’ Daniel, um colega que hoje mora nos Estados Unidos, levou aos estudantes uma semana de cidadania digital, destacando questões de segurança na rede, mostrando como usá-la de maneira crítica”, conta. “Se formos além das soluções técnicas, conseguimos ser mais efetivos. Todos vão se acostumando e entendendo esse equipamento como parte do dia a dia, do material pedagógico.”

Pensar holisticamente e de maneira flexível são competências do coordenador de tecnologia ressaltadas por Andrezza Amorelli, fundadora da Rede Aprendente e da A.Amorelli Gestão e Inovação. Especialista em gestão e planejamento escolar, Andrezza relembra os três níveis de planejamento que envolvem o dia a dia do gestor: o estratégico, ligado aos mantenedores; o tático, com as demais lideranças e o operacional, nas mãos dos demais funcionários. 

“Se não temos um planejamento estratégico com indicadores possíveis e coerentes, o tático não funciona porque não tem referência da estratégia. E aí todo mundo vai para a operação fazendo a mesma coisa, fazendo a gestão da sala de aula. Olhar para isso é olhar para qual tipo de formação o gestor precisa ter hoje, seja ele diretor ou coordenador, a fim de trazer esses saberes que não estão ali em uma formação da escola”, avalia. Ela sugere que o diretor conte com metodologias ágeis para apoiá-lo nesses processos.

O que é metodologia ágil, ou Agile, no processo de gestão esclar?
Lifelong learning (ou aprendizagem ao longo da vida, em tradução livre) é algo inerente a quem trabalha com educação. Com o coordenador de tecnologia não é diferente: o processo deve ser contínuo e amplo. Andrezza sugere algumas metodologias ágeis que podem ser utilizadas no apoio da gestão efetiva, voltadas ao acompanhamento do processo, análises de indicadores e de resultados:

Método SMART, composto por cinco pilares:
S (specific): a meta deve ser específica, objetiva; M (measurable): a meta deve ser mensurável; A (attainable): a meta deve ser de fácil alcance para a equipe; R (relevant): a meta deve ser relevante; T (time-related): a meta deve ter uma data final de entrega.

Scrum: proposta para executar projetos complexos em menor tempo e com o uso de menos recursos.

Kamban: criado na década de 1960 como parte da metodologia da montadora japonesa Toyota, significa “tabuleiro” e segue o princípio de fazer o necessário, quando necessário e na quantidade exata, com uma equipe sincronizada.

Para Andrezza, além dos estudos contínuos, é preciso entender a necessidade de a liderança em tecnologia “sair um pouco desse universo da pedagogia e aprender outras linguagens para poder fazer a gestão da escola.” Criar uma cultura de dados, por exemplo, é o começo do caminho que o gestor deve trilhar, avalia. 

“Fazer uma leitura de cenário e organizar os indicadores que a escola tem gerado desde o surgimento, de maneira ampla, passando pelo número de matrículas, os desafios e reclamações, por exemplo, integrando análises financeiras e pedagógicas, é o primeiro passo”, sugere a consultora educacional. 

O olhar voltado para a cultura de indicadores também é uma das indicações de Ana Paula Gaspar para os gestores. “Pesquisas mostram o quanto o uso, a aplicação e a tecnologia em si são capazes de gerar dados e evidências relacionadas às ferramentas e aos custos da aprendizagem. O coordenador de tecnologia precisa ser uma pessoa alfabetizada em dados, que consiga ter um olhar quantitativo e apreciativo que o ajude a conduzir os processos.”, enfatiza.

Integração com a equipe

Na Escola Castanheiras, que conta com um Fab Lab voltado aos alunos e à comunidade para as atividades mão na massa e o debate sobre o movimento maker (basta agendar a visita com antecedência), os docentes podem participar, de maneira voluntária, de formações em tecnologia. Em 2022, o grupo chamado “Professores conectados” se reunia quinzenalmente e, a cada encontro, era apresentada uma ferramenta ou um tema. “Também fazemos atendimentos individuais, nossa equipe conta com essa disponibilidade de orientação. Fazemos a primeira aula juntos e podemos acompanhar algumas outras”, explica Graziella.

Outra habilidade importante, inerente ao coordenador de tecnologia, é não se limitar ao aspecto técnico: deve apoiar o rumo da escola na cultura digital, olhando para as políticas e os debates ligados à tecnologia na escola. Um dos exemplos é o acompanhamento da Política Nacional de Educação Digital. Entre as ações previstas pela política, estão formações em competências digitais, midiáticas e informacionais, bem como a conscientização sobre os direitos referentes ao uso e ao tratamento de dados pessoais.

“Dentro da escola, a tecnologia é sempre uma disputa, porque demanda que os recursos sejam sempre atualizados. A gente vai comprar um parquinho novo ou uma máquina nova para o espaço maker? Se você não tem um dono dessa área, que vá brigar para conquistar esses recursos, ela ficará sempre em segundo plano”, diz a coordenadora.

Por outro lado, tudo passa pela tecnologia e é importante que esse gestor esteja presente em reuniões das equipes pedagógicas e administrativas. O que chega aos pais por meio de aplicativo e e-mail também deve passar pela gestão tecnológica. “O desenho da jornada do usuário deve ser acompanhado por esse coordenador, para manter a coerência da mensagem que se quer transmitir.” Em todas as esferas, é preciso criar conexões, com escuta ativa e trocas constantes.


5 competências de um coordenador de tecnologia

Um diretor, coordenador ou gestor de tecnologia na escola não deve ser apenas o “profissional da TI”. É preciso ter outras habilidades que vão além de conhecer tecnologias e redes. Confira as sugestões de Ana Paula Gaspar:

  • Boa comunicação
    O coordenador de tecnologia é uma espécie de tradutor da parte técnica para a parte pedagógica, e vice-versa. É preciso que ele compreenda os dois lados e trabalhe para estabelecer consensos.
  • Visão estratégica
    Todos os dias surgem possibilidades de tecnologias e recursos, e esse profissional deve conduzir a área de maneira estratégica e organizada, trazendo à escola o que faz mais sentido para a gestão e para o projeto pedagógico. 
  • Perfil integrador
    O gestor não deve ter uma mentalidade fixa, rígida. É preciso alteridade. Ele precisa ser capaz de colaborar e entender os diferentes perfis dentro da comunidade escolar. 
  • Alfabetização em dados
    O coordenador de tecnologia deve saber entender o que dizem os dados, compreendendo como a tecnologia pode gerar evidências relacionadas ao uso de ferramentas digitais para aprendizagem e gestão.
  • Entendimento das políticas em vigor
    As competências do coordenador de tecnologia contribuem para o diagnóstico e o sucesso da implementação de políticas públicas e marcos regulatórios, como a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados).

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competências para o século 21, gestão escolar, tecnologia

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