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Inovações em Educação

Na universidade, aprendizagem criativa depende de iniciativa individual do professor

Na 3ª Conferência Brasileira de Aprendizagem Criativa, pesquisadores destacaram que, por enquanto, é o trabalho individual dos professores que tem feito a diferença. Eles também avaliaram como o currículo em diferentes carreiras pode se tornar mais prático

por Ruam Oliveira ilustração relógio 14 de novembro de 2023

Com perfil ainda muito tradicional e apoiado em aulas expositivas, cursos de bacharelado e de licenciatura, sejam online ou presenciais, ainda resistem em mudar a maneira de ensinar. Abordagens como a aprendizagem criativa, que estimula a imaginação e novas formas de construir e compartilhar conhecimento, ganham espaço apenas em iniciativas individuais de professores ou projetos de extensão e enfrentam dificuldades para se integrar ao currículo. 

É o que refletem os pesquisadores André Peres, do POA Lab, vinculado ao IFRGRS (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul) e Felipe Ribeiro, da UFERSA (Universidade Federal Rural do Semi-Árido), no Rio Grande do Norte. Ambos se dedicam à aprendizagem criativa em cursos de extensão e na formação de professores em suas instituições. 

Eles participaram do painel “Universidades Criativas”, da 3ª CBAC (Conferência Brasileira de Aprendizagem Criativa), realizada na Universidade Federal de São João del-Rei (MG) até o próximo dia 15 de novembro. Felipe, especialista na formação docente, avalia que as faculdades ainda adotam um enfoque muito tradicional, concentrando-se apenas em “como ensinar”, sem considerar diferentes métodos de aprendizagem.

Para implementar mudanças significativas e integrar abordagens mais dinâmicas, como a aprendizagem criativa nos currículos, ele destaca a necessidade de formação dos responsáveis pelas aulas em graduações e licenciaturas. “Os professores precisam incorporar isso ao seu repertório para aplicá-lo de maneira efetiva. Entretanto, frequentemente, o ambiente universitário é extremamente tradicional e os docentes não procuram essa formação específica”, afirma.

Exemplos que inspiram mudanças no ensino superior

André aponta que modificar as grades para que sejam incluídas outras formas de ensinar também é algo que parte de uma iniciativa pessoal. “Existem professores que percebem a importância da aprendizagem criativa e eles tendem a fazer uma mudança gradual na forma como atuam. Mas ainda é muito pessoal, precisamos trazer isso de maneira institucionalizada”, comenta o professor. Para ele, o caminho para essa transformação envolve criar um diálogo com os coordenadores de curso, demonstrando os resultados positivos alcançados nessa área.

O caminho para essa mudança, de acordo com o educador, seria a criação de um diálogo com os coordenadores de curso, para que vejam o que tem sido feito nesta área e, assim, conseguir mostrar que há resultados positivos. 

André conta que suas atividades com robótica e aprendizagem criativa começaram em 2012, com um projeto de monitoramento da qualidade da água usando uma caixa no rio Guaíba, no Rio Grande do Sul. “A gente foi expandindo aos poucos”, conta. Atualmente, ele atua em um mestrado profissional em informática na educação, desenvolvendo projetos interdisciplinares focados na aprendizagem criativa.

Eventos como “Scratch Day” e os FICs (Festivais de Invenção e Criatividade) funcionam como chamariz para educadores que querem conhecer a prática. Ao mesmo tempo, ele aponta que esta amostra mais prática, de atividades que funcionam, pode servir para endossar o argumento da necessidade de incluir essa abordagem de forma mais sistematizada nas licenciaturas. 

“O convencimento tem que ser feito pela demonstração. Você não consegue convencer alguém somente na retórica, por isso eu acho que esses eventos são importantes. Acredito que a linha de convencimento é através da execução cada vez frequente de ações envolvendo aprendizagem criativa”, afirma. Essa visão de um movimento crescente e de uma comunidade dedicada valida a necessidade dessa abordagem.

Colaboração entre professores

Felipe destaca a importância da colaboração entre os educadores para fortalecer essa metodologia. “Em Mossoró, temos a Feira de Ciências, que atrai educadores. Ao participar, também surge a vontade de modificar as práticas”, relata. 

Recentemente, em parceria com o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), o laboratório onde o professor Felipe atua desenvolveu um protótipo de um pequeno veículo de exploração da caatinga. O projeto envolveu estudantes de graduação de ambas instituições e 38 alunos de educação básica de escolas públicas locais, promovendo uma experiência prática a partir da abordagem STEAM (sigla em inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia, Arte e Matemática).

Ações como essa, seguindo a linha de pensamento do professor André, também contribuem para que práticas inovadoras ganhem espaço no ensino superior. No laboratório do IFRGS, a utilização de materiais variados, desde alta tecnologia até itens acessíveis como papelão e cola quente, demonstra a viabilidade de abordagens criativas em diferentes contextos. 

Da teoria à prática

O professor Felipe não descarta que a teoria seja um pilar importante dentro da formação dos professores. O departamento onde leciona criou um curso intitulado “As ideias de Seymour Papert e aprendizagem criativa”, justamente para associar aspectos práticas de teorias já estabelecidas na educação. 

Papert foi um educador e matemática estadunidense é tido como um dos principais estudiosos da educação, responsável por elaborar o construcionismo, no qual a aprendizagem criativa também se baseia. Ele também inseriu as reflexões sobre o uso de computadores na educação e a noção de que os estudantes aprendem colocando a mão na massa. 

“A teoria é importantíssima, mas ela só tem sentido quando a gente consegue trazer conhecimento teórico para nossa prática docente”, assegura Felipe. O pesquisador observa que também conheceu muitos casos que usavam somente a prática, sem que houvesse um embasamento teórico necessário. “A teoria deve ser muito bem consolidada para que eu possa adaptar a forma como pratico a educação em sala de aula. Mas ter a teoria sem trazer a prática não faz sentido nenhum.”

*O repórter viajou a São João del-Rei (MG) a convite da Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa


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aprendizagem criativa, ensino superior

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