Professora usa teatro para ensinar matemática
Experiência em escola de SP mostra que a encenação de peças teatrais ajuda alunos do ensino fundamental a fixar conteúdo
por Vagner de Alencar 12 de julho de 2012
Se na escola, encenações de histórias clássicas estimulam as habilidades de comunicação dos alunos, aprimoram o vocabulário e a produção textual, ele, o teatro, também pode ser uma alternativa para melhorar o ensino de matemática. É o que propõe a professora Andréa Gonçalves Poligicchio que, desde 2004, aplica a metodologia em uma escola de educação básica de São Paulo.
Os alunos, de 5a a 8a séries do ensino fundamental da Fundação Bradesco, em Osasco, na Grande São Paulo, transformam os tradicionais conteúdos de matemática em roteiros adaptados de contos de fadas famosos, como as histórias de Cinderela e Branca de Neve. Esta última, por exemplo, ganhou uma peça teatral chamada Branca de Neve e os cê tenta, cê tenta, cê tenta e… ah não! Matemática!
Os temas matemáticos aparecem nas falas dos personagens, no enredo ou até mesmo no cenário. E, segundo Andréa, vão sendo assimilados pelos estudantes durantes os ensaios. “Nossa primeira experiência na escrita e apresentação de peças teatrais matemáticas surgiu de uma série de insights, entre eles a percepção de que os alunos adoram narrativas, toda história contada em aula é motivo de atenção e envolvimento”, afirma a professora.
Para comprovar sua metodologia, Andréa, inclusive, apresentou uma tese de mestrado, em fevereiro deste ano, na faculdade de educação da USP (Universidade de São Paulo). A dissertação Teatro: Materialização da Narrativa Matemática evidencia, a partir das experiências realizadas entre 2004 e 2010, como os alunos conseguem contextualizar mais facilmente os conteúdos. O que, segundo a professora, se deve, principalmente, ao fato de ambos exigirem imaginação. “A matemática e o teatro transitam em níveis crescentes de abstração, entre o real e o imaginário”, ressalta.
Na prática
Na escola, as peças acontecem por meio do Tema, um grupo teatral de matemática, formado por estudantes de ensino fundamental. No roteiro adaptado da história da Branca de Neve, por exemplo, estão incluídos estudos de potenciação, de árvore de possibilidades (uma espécie de raciocínio combinatório) e de lógica da dedução.
Ao fugir do palácio da madrasta, a jovem se depara com o caçador, que ao invés de capturá-la, questiona o porquê de sua fuga. A bela espera o príncipe encantado chegar em uma pajero branca de 200 cavalos. A partir daí, a Branca de Neve começa a explicar os conceitos da potenciação ao caçador.
Enquanto, na história original, a bela fica perdida na floresta, na versão adaptada é o príncipe quem se perde. Para encontrá-lo, os anões, que não são sete, mas oito – pois estão agrupados segundo a potência de base dois – vão atrás de pistas do paradeiro do príncipe. “Tudo em cena ganha vida: as falas escritas do texto ganham a voz do ator; os movimentos e sentimentos descritos na história ganham a representação do ator; a argumentação e os conflitos ganham o envolvimento e a ênfase na dramatização; os conceitos, conteúdos e raciocínios obtêm oralidade na voz do ator”, descreve a professora em sua tese.
O teatro serviu, inclusive, para estudos de física. Em uma das peças, os Jetsons, personagens do futuro, visitam os Flinstones, clássica família do desenho animado que vive na Idade da Pedra. O encontro foi encenado por alunos que estudaram, por exemplo, o conceito hipotético de física, conhecido como buraco de minhoca, em que é possível, por meio de um túnel, realizar viagens no tempo, entre o futuro e o presente. Já em outra peça, um estudante interpreta o filósofo grego Aristóteles, que fala sobre ética, lógica, silogismo e falácia em discursos publicitários. A partir dessa metodologia, Andréa espera que a mesa ideia seja aplicada em diversas escolas e sirva como aporte para o ensino não apenas de matemática, mas também de diversas disciplinas.