Para desenvolver crianças, programas apostam em formar pais
Experiências demonstram a importância de oferecer espaços para que as famílias também possam aprender dentro da escola
por Marina Lopes 8 de junho de 2016
Quando a Fundación CAP, criada por executivos e trabalhadores de um grupo de mineração chileno, observou que o envolvimento da família era importante para impulsionar o êxito escolar dos estudantes e, consequentemente, contribuir para o desenvolvimento socioeconômico do país, a instituição decidiu criar uma estratégia sistemática para formar pais. O programa Aprender em Família nasceu em 2010 com este objetivo: potencializar o impacto das famílias na aprendizagem e no desenvolvimento dos estudantes. Inicialmente, foi implantando em 12 instituições parceiras. Hoje já são 60 escolas públicas de 10 municípios chilenos que participam do projeto.
Um diagnóstico inicial, realizado após o desenvolvimento de outros programas de formação pedagógica e gestão institucional em escolas públicas, apontava para a presença de uma sensação de culpa entre ambos os lados. “Os docentes diziam não ter preparo ou ferramentas para o envolvimento da família na escola. Por outro lado, a família se sentia distante dos professores”, recorda Teresa Izquierdo, coordenadora do projeto. “Nos demos conta de que se não envolvermos as famílias, os resultados não vão continuar subindo. Porque o gosto pela leitura, por exemplo, são os pais que apoiam”, afirma.
Para desenvolver uma estratégia de colaboração entre escolas e famílias, o programa Aprender em Família está baseado em três pilares. Na primeira ação, as atenções são direcionadas à capacitação de diretores, professores e voluntários para abrirem as portas da escola, o que envolve desde a elaboração de um plano de ação até a entrega de ferramentas para potencializar o espaço das reuniões escolares.
“Nós apostamos primeiro em um diagnóstico de cada escola para depois elaborar uma política e um plano de ação. Se queremos formar pais, os professores precisam de formação antes. Esse é o fracasso de muitos programas, que começam a formar pais sem envolver toda escola”, explica Tereza.
Após preparar a equipe escolar, em uma outra linha o projeto foca em formar pais. A Escola de Pais cria um espaço de envolvimento da família, onde podem compartilhar experiências sobre o desafio de educar seus filhos, além de participarem de formações voltadas para identidade familiar, apoio à aprendizagem e desenvolvimento das crianças. “Também capacitamos a família como monitores voluntários para aplicações com outros pais de cada curso”, complementa.
As formações da Escola de Pais utilizam manuais elaborados por uma equipe de sociólogos e educadores, que se baseiam em diagnósticos realizados nas escolas e em recomendações feitas por elas. Os monitores desta ação recebem um material com descrição de atividades, jogos didáticos, materiais de apoio e fichas informativas para orientar o trabalho com as famílias. Além disso, outra ação de capacitação acontece no âmbito do projeto Ler em Família, que busca o envolvimento da família nas estratégias de aproximação dos alunos com a leitura.
Já na terceira linha do programa são realizadas ações para fortalecer o vínculo entre as famílias e a comunidade. Anualmente, são realizados dois grandes eventos, a Festa das Artes e as Olimpíadas Familiares, que contam com o apoio dos departamentos de cultura e esportes de cada município.
Enquanto as escolas participam do programa, Tereza conta que elas recebem uma consultoria mensal da Fundación CAP para acompanhar os processos formativos. “No primeiro ano com mais força, no segundo com menos e no terceiro já preparamos para que o programa seja incorporado de uma maneira sustentável na escola”, conta.
Após seis anos de histórico do projeto, a coordenadora do Apreender em Família diz que os resultados nas escolas já são significativos. “Percebemos uma mudança na cultura escolar de relacionamento com a família.” Para avaliar o programa, a fundação conta com o apoio da J-PAL (Abdul Latif Jameel Poverty Action Lab), uma rede de acadêmicos de todo o mundo, criada no MIT (Massachusetts Institute of Technology), que busca evidências científicas de programas desenvolvidos em distintas áreas.
De acordo com os resultados da avaliação parcial de impacto, 77,5% dos professores de escolas inseridas no programa dizem que os pais são solidários com eles, enquanto apenas 58,1% dos professores dizem o mesmo em instituições não participantes. Entre os pais, a percepção também muda. Se 42,5% dos participantes ligados ao Aprender em Família afirmam que a escola considera a sua participação importante, entre os pais de escolas não participantes esse número cai para 33%. “Os pais dizem estar mais satisfeitos com a escola e as reuniões de trabalho”, diz Tereza.
Comunidade de Aprendizagem
No Brasil, outra experiência também aposta em formar pais e no envolvimento de toda a escola para a construção de estratégias que aproximam as famílias. O projeto Comunidade de Aprendizagem, implementado no país com o apoio do Instituto Natura, está baseado em um conjunto de ações que ajudam a integrar a escola ao seu entorno. A iniciativa teve origem em 1990, no Centro de Investigação em Teorias e Práticas de Superação de Desigualdades (CREA), da Universidade de Barcelona. A partir de uma base científica, ela identifica estratégias educacionais que melhoram o impacto na aprendizagem e superam desigualdades.
“O projeto tem uma proposta rigorosa de implementação. Quando conhecemos em 2013, o Instituto Natura estava pesquisando sobre o conceito de comunidade de aprendizagem. Depois de passar por diferentes autores que tratavam desse conceito, chegamos ao grupo de pesquisa da Universidade de Barcelona”, conta Fernanda Pinho, do Instituto Natura, que coordena o projeto Comunidade de Aprendizagem. “A Comunidade de Aprendizagem transforma o modo de interação entre as pessoas na escola”, defende.
O programa é implementado através de parcerias com secretarias de educação. Depois que uma rede adere ao projeto, são feitas apresentações para as escolas, que decidem se desejam participar ou não. Em geral, o projeto conta com diferentes fases: a sensibilização das escolas; a tomada de decisão para se transformar em uma Comunidade de Aprendizagem; o momento de reunir a comunidade educativa para refletir sobre o que sonham para o futuro; a seleção de prioridades da escola e do seu entorno; e, por fim, o momento de planejar as ações que serão colocadas em prática.
Como estratégia para alcançar os sonhos levantados pela comunidade escolar, o programa sugere algumas ações, chamadas de “Atuações Educativas de Êxito”, que são colocadas em prática pelas escolas conforme as suas necessidades. Entre elas, estão as Tertúlias Dialógicas, em que as pessoas se reúnem para compartilhar sobre literatura, arte e música, e a Biblioteca Tutorada, que abre o espaço da biblioteca fora do horário letivo para que os jovens encontrem um lugar de aprendizagem livre.
Uma das atuações educativas de êxito sugeridas consiste em formar pais, o que oferece situações de aprendizagem diversas para os pais dentro do ambiente escolar. A instituição faz um levantamento de temas de interesse dos pais e organiza cursos para eles, que podem ser desde alfabetização ou cursos profissionalizantes e até mesmo de assuntos relacionados ao desenvolvimento dos alunos.
“Por muito tempo, as pesquisas indicaram que o sucesso ou fracasso do aluno na escola está relacionado com o grau de escolaridade dos pais. Se o pai tem ensino superior, o menino é um bom aluno. Se o pai ou a mãe são analfabetos, o menino vai ser um mau aluno”, lembra. No entanto, ela menciona que, conforme as pesquisas do Centro de Investigação em Teorias e Práticas de Superação de Desigualdades, da Universidade de Barcelona, o importante é que o familiar esteja em uma situação de aprendizagem para ele apoiar o filho nos seus estudos. “Não importa se eu estou fazendo um curso de alfabetização de adultos ou pós-doutorado. O importante é que os pais estejam vivenciando um processo de educação”, explica.