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Inovações em Educação

Arte e música personalizam ensino público argentino

Rede com 38 escolas experimentais não separa alunos por séries e aulas acontecem em rodas de discussão

por Vagner de Alencar ilustração relógio 11 de junho de 2013

No primeiro dia de aula, os alunos mais novos, de três anos, já são colocados em contato com as artes: lidam com pincéis e tintas, flautas e violão. Cada uma das disciplinas, dadas por professores diferentes, é trabalhada em rodas de discussão, sem separação por séries ou idade. Isso acontece na La Bahia, uma das 38 escolas públicas integrantes da rede argentina Escuelas Experimentales, que desenvolve uma metodologia nos moldes da educação democrática, a partir de uma grade curricular personalizada voltada para artes plásticas e música. “Nesta escola não se ensina nada, mas aprende-se muito”, brinca Emilio Urruty, diretor da unidade que fica em Ushuaia, cidade que beira os 60.000 habitantes, no extremo sul da Argentina.

“Há muitas características nessas escolas que parecem fórmulas. A receita não é explicada por meio de palavras, mas a partir do aprendizado experimental que cada estudante vivencia”, afirma Urruty. Cada escola da rede tem entre 100 e 200 alunos de ensino infantil ou fundamental e adota modelo similar ao de algumas escolas nacionais e internacionais – como a Amorim Lima e a Politeia, no Brasil, ou até mesmo a Inka Samana, no Equador. A diferença é que as Escuelas Experimentales usam as artes como fio condutor para abordar as disciplinas obrigatórias do currículo. “Valorizar as artes plásticas e a música é importante para descobrir a interioridade de cada aluno”, afirma o diretor.

crédito jazzia / Fotolia

Cada roda de discussão é composta por, no máximo, 15 estudantes. De acordo com Urruty, a metodologia adotada pela rede é fundamental para trabalhar um dos principais pilares da rede: o ensino personalizado. “O trabalho em grupos pequenos permite um vínculo direto do professor com cada aluno. Nas Escuelas Experimentales todos os professores conhecem todos os alunos e vice-versa”, diz. Essa relação mais próxima permite aos educadores acompanhar de perto aspectos que, muitas vezes, não são observados no modelo tradicional de ensino. Entre eles, saber como o aluno se sente, se dormiu bem ou não, como foi seu almoço ou até mesmo diagnosticar se está com problemas de visão ou audição. Do ponto de vista dos alunos, eles vão aprendendo, na prática, a aprender com colegas, respeitar diferenças e ser solidários.

“Essa relação mais próxima permite aos educadores acompanhar de perto características que, muitas vezes, costumam não existir no modelo tradicional de ensino”

Assim, uma aula de artes plásticas pode dialogar com a de história. Enquanto os alunos pintam uma figura conhecida, eles aprendem em que contexto histórico e social aquela personalidade atuou. Essa correlação transdisciplinar acompanha a rotina dos estudantes, que não precisam provar o que sabem por meio de exames, mas de produções realizadas ao longo das aulas. Para estimular habilidades musicais, os instrumentos ficam ao alcance de todos os alunos, que têm liberdade para pegá-los no momento em que se sentem à vontade para tocá-los. E a cantoria de musicas e dança locais, assim como a poesia e o teatro, sempre constantes, ajudam a trabalhar especialmente aspectos da tradição regional.

Outra característica presente nas escolas argentinas é a autonomia, tanto de alunos quanto de professores. Embora haja um diretor em cada unidade, Urruty afirma que a figura desse profissional só existe por uma questão administrativa. Na escola, as decisões acontecem por meio de uma assembleia docente, sempre em consenso. Ao final de cada dia de trabalho, os professores se reúnem durante duas horas para ter feedback do trabalho, falar sobre o rendimento dos alunos e da programação das atividades do dia seguinte. “Se temos que corrigir algum procedimento, esse é o momento ideal. Quando um professor discorda da maioria, é pedido a ele um voto de confiança”, afirma.

Já para os alunos, a autonomia aparece muito na possibilidade que cada um tem de escolher o que pretende estudar (violão, flauta, guitarra, pintura, artesanato etc.), mas, principalmente, da chance de buscar seu próprio conhecimento de maneira independente. Segundo Urruty, para o professor que tem que ser um mediador desse cenário pouco usual, jogo de cintura e improviso em sala de aula são indispensáveis, “no sentido mais rico do termo”. “É ter a oportunidade de se jogar no rio, que tem seu próprio ritmo, para aprender junto com ele e sair nadando.”

Assista, em espanhol, ao depoimento de Urruty para o filme Educação Proibida:


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