O Brasil precisa de mais engenheiros para inovar
Rafael Lucchesi, diretor-geral do Senai, diz que instituição criará 23 institutos de inovação e 62 centros de tecnologia
por Vagner de Alencar 1 de novembro de 2012
O Brasil forma por ano cerca de 40 mil engenheiros, segundo dados da Confea (Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia), porém, o déficit chega a 20 mil. Esse cenário é o avesso do que acontece em países como a China, onde, anualmente, são graduados 650 mil novos engenheiros. Enquanto isso, na Índia, são 220 mil e na Rússia, 190 mil, todos mercados em ascensão. Rafael Lucchesi, diretor-geral do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem) e diretor de educação e tecnologia da CNI (Confederação Nacional da Indústria), afirma que a média de engenheiros de um país tem um papel importante para a taxa de inovação e defende um olhar mais empreendedor na formação desses profissionais.
Segundo ele, é preciso repensar o modelo educacional, que ainda carrega uma formação academicista e aproximar os alunos do chão de fábrica das empresas. “Precisamos contaminar as escolas com atitudes empreendedoras voltadas para o mundo do trabalho e ter uma universidade que se liberte um pouco da torre de marfim”, afirma.
Para levar a agenda de inovação às empresas brasileiras, o Senai, em parceria com o MIT (Massachusetts Institute of Technology), está criando 23 institutos de inovação e 62 centros de tecnologia. Ainda em processo de montagem, os centros serão aliados das empresas no desenvolvimento de novos produtos, processos, pesquisa aplicada, solução de problemas complexos e antecipação de tendências tecnológicas.
Lucchesi que também é professor da Uneb (Universidade Estadual da Bahia) e ex-secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo do Estado da Bahia será um dos palestrantes na segunda edição do TEDxUnisinos Inovação na Educação, que ocorre em 29 de novembro, em Porto Alegre.
Confira abaixo entrevista com o diretor-geral.
O Brasil está inovando em educação?
Estamos em uma situação intermediária. Na América Latina e nos países emergentes, o Brasil se destaca, mas ainda estamos muito distante do que é feito nos países desenvolvidos. A média de inovação ainda é baixa se comparada, por exemplo, aos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). De um lado, precisamos avançar para que a educação assuma uma centralidade nas estratégias empresarias e, de outro, precisamos ter instrumentos públicos mais friendly para inovação, como acontece nos países desenvolvidos.
Por que parece tão difícil inovar no ensino superior?
Inovar é uma forma de agregar valor, não é inventar. É uma forma de fazer diferente, incorporando e agregando valores na educação. Precisamos acabar com os conteúdos academicistas e focar no trabalho. Sair do empilhamento de conteúdos, ensinar a criticar e a pensar. Ter um olhar cosmopolita, enxergar o mercado e a modernidade, o que está acontecendo no mundo.
A matriz da educação superior ainda é ruim. O número de formados em engenharia, por exemplo, é muito pequeno: de cada 100 universitários, apenas cinco se formam na área. Esse índice é muito baixo se comparado a outros países, tanto nos em desenvolvimento quanto nos desenvolvidos. Um bom número médio de engenheiros têm um papel importante para a taxa de inovação. É preciso falar mais com os jovens, ter metodologias mais lúdicas e contaminar as escolas com atitudes empreendedoras voltadas para o mundo do trabalho e ter uma universidade que se liberte um pouco da torre de marfim.
Quando a gente desce um pouco mais e vai para o ensino médio, que é o seio educacional regular, achamos que todos alunos se encaminharão para a universidade. Mas, na verdade, apenas uma pequena fração dos jovens – somente 14%– migram para o ensino superior. Além disso, os demais não têm ensino profissionalizante. No país, apenas 6,6% dos jovens, que estão hoje no nível médio, fazem, concomitantemente, educação profissional. Na Alemanha este índice é de 53%. No Japão chega a 55%. A média dos países da OCDE é 42%. Coreia, 41%. É uma desproporção grande.
As escolas de engenharia estão preparadas para tornar os profissionais mais empreendedores?
Não. Estão distantes do mundo real, presos. No início do século 20, houve uma revolução do ensino da medicina, onde se criou nos Estados Unidos a figura do hospital-escola. É preciso pensar em algo semelhante às escolas de engenharia. No Brasil, por exemplo, uma universidade está pensando em avançar nessa direção é o ITA (Instituto de Tecnologia Aeronáutica), mas dever-se-ia ter a mesma coisa que foi estruturada para atividade de medicina. É necessário aproximar o que é visto nas grades curriculares da escola de engenharia com o que acontece no chão de fábrica das empresas. Ter maior capacidade e impermeabilidade entre um universo e outro.
Uma discussão interessante é do Protocolo de Bolonha [documento assinado em 1999 por Ministros de Educação de 29 países europeus que unificou as universidades da Comunidade Europeia quanto à sua estrutura e duração de seus cursos de graduação e pós-graduação strictu sensu] que reduziu bastante o número de especializações em engenharia. Na verdade, o modelo de especializações ficou para trás. O engenheiro universal é extremamente bom.
No Brasil, quais exemplos você apontaria como inspiradores para a formação em engenharia?
Além do próprio caso do ITA, há também o C.E.S.A.R (Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife) [Centro privado de inovação que utiliza engenharia avançada em TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) para solucionar problemas complexos para empresas e indústrias de diversos setores, a exemplo de telecomunicações, eletroeletrônicos, automação comercial, financeira, mídia, energia, saúde e agronegócios].
O que o Senai está fazendo para investir em inovação?
Estamos criando 23 institutos de inovação e 62 centros de tecnologia. A ideia é aproximar a agenda de inovação das empresas brasileiras que tanto precisam. Os centros estão em processo de montagem e serão aliados das empresas no desenvolvimento de novos produtos, processos, pesquisa aplicada, solução de problemas complexos e antecipação de tendências tecnológicas. O objetivo é oferecer às empresas mão de obra qualificada e serviços técnicos e tecnológicos. Para isso, contamos com parcerias internacionais como o MIT (Massachusetts Institute of Technology ) e a Fundação Fraunhofer (instituição de apoio à indústria, especializada em transferência de tecnologia), que vão dar suporte tanto na capacitação de professores e técnicos quanto no desenvolvimento de soluções para o setor produtivo nacional.
Estamos criando oito centros já para o próximo ano. Depois mais oito e, em seguida, outros sete. Eles são projetos de enorme complexidade. Cada um deles vai atuar nas 23 principais áreas transversais da inovação tecnológica para a indústria brasileira como automação, micromanufatura, polímeros, desenvolvimento de software, TIC, logística, desenvolvimento de tecnologia para petróleo e outros. Nossa avaliação é que terão um impacto bom.