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Diário de Inovações

Impactos do garimpo ilegal são foco de pesquisa de alunos da EJA

Além de pesquisar sobre a contaminação dos rios e igarapés causados pela extração de minério, estudantes conheceram lideranças indígenas que lutam para proteger a natureza

por Shirlei dos Santos Catão / Edilamar dos Santos Soares / Francimara Barbosa Gomes ilustração relógio 7 de dezembro de 2023

“A água está doente em toda a terra indígena yanomami.” A frase é do líder indígena Júnior Hekurari Yanomami e retrata a falta de água potável para consumo das comunidades locais, no oeste de Roraima e norte do Amazonas, causada pela garimpagem ilegal. Na Escola Municipal Francisco de Souza Bríglia, localizada em Boa Vista, capital de Roraima, alguns dos alunos da EJA (Educação de Jovens e Adultos) chegaram a trabalhar como garimpeiros, e hoje buscam nos estudos alcançar novas oportunidades.

Para debater o assunto com a turma do terceiro ano do ensino fundamental da EJA, mostrar as consequências do garimpo ilegal na contaminação da água e do meio ambiente e conversar com a comunidade escolar as melhores formas de minimizar esse impacto no estado de Roraima, criamos o projeto “A terra de Macunaíma pede socorro!”. 

O nome do tem dois motivos: o primeiro, é a referência histórica à Macunaíma: esperto, cheio de magias, teve como berço o Monte Roraima. Cresceu forte e se tornou um índio guerreiro; os Macuxi o proclamaram herói de seu povo. E o estado de Roraima, terra de Macunaíma, está em situação de alerta ambiental.

As atividades duraram nove meses (entre fevereiro e outubro de 2023) e contamos com o apoio da cuidadora Simone Catão durante a jornada. Ao todo, 35 estudantes, entre 16 e 74 anos, participaram do projeto.

Inicialmente, pesquisamos como a água é afetada pelo garimpo ilegal. Estudamos como a  morfologia dos rios pode ser gravemente alterada pela escavação de trincheiras e labirintos, sem contar a poluição das águas pelo mercúrio e a contaminação dos peixes.

A mídia vem comunicando com frequência a degradação da natureza causada pelo garimpo ilegal. Estudiosos dizem que, para cada 1 kg de ouro produzido, 1,3 kg de mercúrio é emitido para o ambiente. 

Fizemos debates sobre a temática “água x garimpo ilegal” a partir de uma reportagem que mostra um dado alarmante: 45% do mercúrio usado em garimpos ilegais para extração de ouro é despejado em rios e igarapés da Amazônia, sem qualquer tratamento ou cuidado. Esse material, liberado de forma indiscriminada, pode permanecer por até cem anos em diferentes compartimentos ambientais, além de provocar diversas doenças em pessoas e em animais.

Também analisamos outras matérias a respeito do tema, como esta, do portal Roraima em Foco: a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) identificou a relação entre desnutrição e consumo de água em condições impróprias em comunidades yanomami. Na sequência, a turma se dividiu para apresentar os conhecimentos trazidos pelo noticiário. 

Dessa troca, surgiu a ideia de conhecer a biografia de quatro defensores da natureza e das terras indígenas. São eles:

  • Joenia Wapichana, presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), primeira mulher indígena a exercer a advocacia no Brasil;
  • Sineia do Vale, do povo Wapichana, gestora ambiental e liderança ativa do movimento indígena de Roraima e da Amazônia;
  • Davi Kopenawa Yanomami, escritor e líder político yanomami, presidente da Hutukara Associação Yanomami;
  • Junior Yanomami, presidente da Urihi Associação Yanomami e do conselho distrital de saúde indígena yanomami.

A pesquisa fez com que os alunos valorizassem ainda mais o papel desses ambientalistas que lutam pela proteção da natureza. Para homenageá-los, os estudantes confeccionaram um grande mural, exposto até hoje no principal corredor da escola, e convidaram as outras turmas da EJA para apresentar a elas os resultados da pesquisa e a história de cada um desses defensores do meio ambiente.

📌Clique na imagem para conferir a galeria de fotos:


Leitura do mundo na EJA

Com a pesquisa teórica avançada, partimos para o trabalho de campo. Visitamos o Rio Branco, que corta quase toda extensão do estado de Roraima, com 548 km de extensão. Jornais e institutos têm feito uma série de pesquisas a respeito de sua contaminação. Também fomos até o Igarapé Pricumã, que está totalmente contaminado e do qual não podemos usufruir. A atividade mostrou aos alunos a importância fundamental do cuidado com a água para preservar o meio ambiente. 

Por fim, estudamos a música “Rorameira Makunaimando”, composição de Neuber Uchoa e Zeca Preto, cantores e compositores locais, que sempre falam da importância de cuidar da Amazônia em suas letras. A atividade inspirou o aluno Levair Santos, que tem deficiência intelectual e visual, a compor uma música sobre o ecossistema estudado, que você pode conferir no vídeo a seguir:

Resultados alcançados

O projeto teve um impacto importante. Durante o desenvolvimento, ficamos sabendo que alguns dos alunos, em algum momento da vida, já foram garimpeiros. Foi interessante e necessário ouvir suas experiências, a fim de fortalecer o papel de cada um de nós na preservação da natureza. Também passamos a respeitar ainda mais os povos originários, que cuidam tão bem do nosso bem maior, a água. 

A educação ambiental para a sustentabilidade é um processo de aprendizado permanente, baseado no respeito a todas as formas de vida, contribuindo para a formação de uma sociedade justa e ecologicamente equilibrada.

Essa experiência coletiva na EJA fez com que os estudantes se tornassem multiplicadores na própria escola e, principalmente, em suas residências. Eles passaram a ser exemplos de como cuidar e proteger a água. E, claro, defender a natureza.


Shirlei dos Santos Catão

Professora há 20 anos na rede municipal e estadual. Formação em pedagogia, educação física e química. Atual há 10 anos na EJA (Educação de Jovens e Adultos).

Edilamar dos Santos Soares

Licenciada em História e em Pedagogia, tem pós-graduação em AEE (Atendimento Educacional Especializado) e em Educação Especial e Inclusiva.

Francimara Barbosa Gomes

Cuidadora escolar há dez anos, trabalha atualmente na escola Francisco de Souza Briglia

TAGS

eja, ensino fundamental, metodologias ativas, Prêmio Professor Porvir

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