Diretor usa ferramentas gratuitas para envolver professores e alunos durante quarentena - PORVIR
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Diário de Inovações

Diretor usa ferramentas gratuitas para envolver professores e alunos durante quarentena

Educador diz que é preciso focar no desenvolvimento de atividades básicas enquanto durar a pandemia do coronavírus

por Felipe Nóbrega ilustração relógio 8 de abril de 2020

Volta Redonda, no Rio de Janeiro, está entrando na terceira semana de isolamento social. Um dia desses à noite, eu estava em casa e comecei a observar os desdobramentos da pandemia em outros lugares do mundo, como no Japão que, mesmo sem a quarentena, está com aulas suspensas. Foi então que me toquei que as coisas demorariam a voltar ao normal. Mandei uma mensagem no grupo de WhatsApp dos professores da Escola Municipal Walmir de Freitas Monteiro dizendo que precisaríamos começar a pensar em alternativas, pois não queria que eles sofressem o processo de angústia e desespero que estamos vendo entre docentes em nível nacional.

Como a prefeitura adiantou o recesso de julho, os professores que toparam participar entraram em um novo grupo onde começamos a conversar sobre um desenho de atividades para a nossa escola que atendesse as necessidades da nossa comunidade. Nós validamos esse fluxo com a Secretária Municipal de Educação, Rita Andrade, e sua equipe, que autorizaram a realização de tudo de forma experimental.

Como sou formador de professores da Nova Escola, tenho uma rede de contatos. A primeira coisa que vem na cabeça é “vamos buscar o que é de graça”. Óbvio que tem muita gente usando WhatsApp e Facebook, mas o primeiro questionamento dos meus professores foi como corrigir o que os alunos fariam. Então o Google Classroom era a única coisa gratuita que eu já conhecia, e os docentes tinham certa familiaridade devido a formações que realizamos na escola. Todos participaram em peso de uma formação online comandada pela Renata Capovilla, professora Google Innovator. Ela mostrou como funciona o Google Classroom, como colocar atividade com prazo e outras funcionalidades.

Surpreendentemente, estamos com um grande número de alunos conectados, mas ainda assim existe um pequeno grupo que mora em regiões onde não há torre de telefonia, ou seja, não tem internet. A partir de agora, vamos contatar essas famílias para buscar outras soluções. O desafio que estamos enfrentando nesse começo é ensinar alunos a enxergarem o celular como uma ferramenta de aprendizagem. Na rede municipal, temos aulas de robótica e informática. Quando o professor está ao lado dando as coordenadas para mexer no computador, os estudantes acompanham. Quando vão para o celular e precisam fazer pesquisa ou anexar arquivo, não demonstram essa fluência digital. Por isso, criamos um canal no YouTube e vamos subindo vídeos curtinhos ensinando eles. O que ajuda é que eles são altamente letrados. Se gravamos um vídeo orientando o caminho, eles conseguem resolver em questão de minutos.

Aliás, esse é um ponto de atenção: a impessoalidade nesse momento de pandemia é muito ruim. O aluno precisa saber quem é que está do outro lado. Tem muita gente pegando aulas enormes na internet e passando para crianças que não têm a devida estrutura, silêncio e conexão para assistir. O que estamos fazendo não dá para ser chamado de educação à distância. Estamos fazendo um paliativo para os estudantes não ficarem à toa.

Nós já disponibilizamos três atividades. Estamos indo devagar e não derrubando conteúdo na cabeça deles, pois precisam aprender a ter rotina e a mexer na ferramenta. As famílias e a comunidade têm ajudado muito, está sendo uma coisa de louco. Eu fico emocionado de ver como eles estão presentes. Infelizmente, muita gente despreza as periferias, mas elas têm algo que não é comum às outras partes: a colaboração.

Existem alguns pontos que precisam ser observados nesse processo. O primeiro é que isolamento vertical não funciona em lugar nenhum: diretores não devem ficar em um pedestal trancados em suas salas enfurnados em gestão administrativa, enquanto deixam o coordenador e os professores pensarem no pedagógico. A escola é um ambiente colaborativo. Fazer com que as pessoas enxerguem e entendam isso é um primeiro desafio (mesmo na minha instituição), porque é difícil mostrar aos outros nossos defeitos.

Também estamos vendo que há muitos professores desconectados e sem familiaridade com tecnologia. As escolas precisam abraçar esses profissionais que, nesse momento, também serão alunos. No terceiro ponto, devemos considerar que, atualmente, menos é mais. Devemos fazer o arroz com feijão que já está bom e, conforme a situação for se desdobrando e a familiaridade com tecnologia aumentando, pensamos em novos caminhos. Comunicar-se com a realidade onde estamos inseridos também é fundamental. Tem pai e mãe que ficam desesperados, devemos ouvir e dar amparo.

Acredito que, após esse período, pode nascer uma nova escola, mesmo com tudo o que está acontecendo e com as dificuldades que estamos enfrentando. Nós, educadores, devemos começar a pensar agora como serão as aulas presenciais no retorno, considerando que alunos ficaram dois, três meses em casa usando computador e celular e assistindo a aulas de YouTubers com uma linguagem muito fácil e acessível. Com certeza vão surgir questionamentos sobre o uso do celular durante a aula, e ainda precisamos refletir como a tecnologia vai impactar o retorno.


Felipe Nóbrega

Formado em história, atualmente Felipe é diretor da Escola Municipal Walmir de Freitas Monteiro em Volta Redonda (RJ). Formador na Nova Escola e mentor do Time de Autores de História, Felipe é integrante da rede Conectando Saberes e coordenador do AprendiZAP pela Fundação 1Bi. Tudo isso é pouco perto da paixão pela escola pública e do desejo de impulsionar as crianças e adolescentes das periferias de nosso país.

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coronavírus, tecnologia

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