Estudante ganha prêmio internacional por criação de braço robótico
Aluno do Instituto Federal do Mato Grosso do Sul foi o melhor na categoria Engenharia Biomédica com projeto de braço sensível para pessoas que tiveram membros amputados
por Maria Victória Oliveira 8 de junho de 2016
“Eu sempre fui obcecado por ciências. Algumas pessoas têm rock stars (estrelas do rock), eu tenho Science stars (estrelas das ciências)”. Só por essa frase já dá para notar que a relação do estudante Luiz Fernando da Silva Borges com a ciência é especial. Ele começou a se interessar pela área mais ou menos aos sete anos, ao se apaixonar pelo kit de química do primo.
A vontade de aprender cada vez mais sobre experimentos acompanhou o seu crescimento. Hoje, com 17 anos, ele já participou duas vezes da The Intel International Science and Engineering Fair (Intel ISEF), maior feira internacional de ciências e engenharia. O projeto que o classificou esse ano foi uma pesquisa que visa a construção de um braço robótico que restaura a sensação tátil de pessoas com membros amputados.
Segundo o aluno do curso técnico e integrado em informática do Instituto Federal do Mato Grosso do Sul, o interesse pela área começou na infância. “Quando o kit de química do meu primo acabou, ele me deixou ficar com o manual. E aí eu comecei a fazer coisas simples, como plantar feijão no algodão”. Somado aos programas educativos que via na TV, Luiz cresceu com a vontade de atuar na área.
Quando entrou no Instituto Federal, aos 15 anos, ele voltou-se à área de tecnologia na saúde. “Sempre fiquei encantado com a possibilidade de, usando tecnologia, criar coisas. No Instituto Federal, descobri que é possível utilizar ferramentas da tecnologia para solução de problemas da saúde humana”. Com as aulas do curso técnico, ele começou a se interessar por pesquisas sobre a interface cérebro-máquina, um campo da neurociência. O estudante explica que, usando essa interface, é possível transformar as atividades de neurônios em movimento de um robô, por exemplo.
Essa possibilidade, mais uma vez, impressionou Luiz, que ligou os aprendizados no instituto aos episódios da série de TV Dr. House. Ele explica que, na época, estava tentando resolver a seguinte questão: como poderia aplicar os conceitos da interface cérebro-máquina para próteses de mão? Para isso, era preciso ter um sinal de entrada, que seriam os sinais elétricos do músculo do coto (parte do membro que permanece após uma amputação [/media-credit]da pessoa que teve o braço amputado juntamente com os movimentos da mão. Mas não é possível medir os movimentos de uma mão que não existe.
Os episódios de House apresentaram uma resposta a esse problema. “A minha primeira ideia foi registrar as atividades dos músculos do coto (parte restante de membro mutilado) da pessoa que teve o braço amputado e dos movimentos da mão. Esses dados seriam cruzados em um programa que eu criei, baseado na teoria da caixa de espelhos, explicada na série de TV. Na teoria, você esconde o corpo do paciente atrás de um espelho e projeta nesse espelho o membro que o amputado ainda tem. Todo e qualquer movimento que ele fizer com o braço, olhando o reflexo, vai gerar a sensação de que o braço perdido retornou”.
Em entrevista ao Porvir, ele explicou que o projeto só foi possível devido a síndrome do membro fantasma, quando a pessoa que teve um membro amputado ainda sente o membro.
Apesar de complexo, dá para explicar o trabalho de uma forma mais simples: inspirado na teoria mostrada no seriado Dr. House, Luiz construiu um ambiente de realidade virtual, “como se fosse um jogo de videogame”, e escondeu o coto da pessoa que teve o braço amputado embaixo de um monitor de LCD.
Nesse monitor, foi projetado um braço virtual e a pessoa conseguiu controlar esse braço virtual, porque o programa de computador, baseado em inteligência artificial, foi ensinado a reconhecer os estímulos. “Você ensina o programa que, quando ele ler tal sinal elétrico captado pelos eletrodos no músculo da pessoa, é para reproduzir tal movimento com o braço virtual. Ou seja, a pessoa pensa no movimento que vai fazer com esse membro amputado e, usando o braço virtual, ela consegue realmente fazê-lo”.
A outra parte do projeto foi desenvolver uma ferramenta que ajudasse a recuperar a sensibilidade tátil da pessoa que teve o membro amputado. Usando a mesma técnica do monitor de LCD, a pessoa vê uma bolinha virtual passando pelo braço. Enquanto isso, a região do bíceps é estimulada com movimentos vibratórios. “Ao mesmo tempo que ela vê essa bolinha passando, ela sente o mesmo padrão, como se a bolinha estivesse caminhando e vibrando no seu bíceps”. A ligação cérebro-máquina aparece aqui: Luiz explica que essa ação no cérebro de pessoas que tiveram um membro amputado,causa um efeito chamado de rearranjo neuronal. “A pessoa recebe o estímulo no bíceps, mas sente o estímulo na ponta do braço que não existe”.
A participação na Intel ISEF
Aos 17 anos, essa já é a segunda participação do estudante na The Intel International Science and Engineering Fair (Intel ISEF), maior feira internacional de ciências e engenharia. Com o projeto da construção do braço robótico, Luiz conquistou o primeiro lugar na categoria Engenharia Biomédica. O prêmio rendeu um convite para participar de um Fórum em Londres, além de ter um asteroide batizado com o seu nome pelo Laboratório do MIT (Massachussets Institute of Technology).
Segundo ele, uma das razões de maior alegria em participar da feira é ver as novas ideias sendo desenvolvidas. “Apesar de todos os estudantes falarem línguas diferentes, eles expressam a mesma paixão, que é o interesse e a vontade de mudar o mundo com suas ideias”.
O estímulo à ciência
Segundo Luiz, a primeira coisa a ser feita para estimular, desde cedo, o interesse pela área das ciências é desmistificar o que é ser cientista. “Se você perguntar para uma criança de 7, 8 anos o que é ser cientista e se ela souber responder, vai falar que é o carinha louco que fica no laboratório e explode coisas, ou é aquele gênio do mal que quer dominar o mundo”.
Ele defende que é preciso seguir o modelo dos Estados Unidos e investir massivamente na divulgação científica, incluindo nessa estratégia a elaboração de desenhos infantis. “É preciso mostrar que ser cientista também é legal. Precisamos ter nossos cientistas como astros, como são os jogadores de futebol, para que, quando perguntarmos o que a criança quer ser quando crescer, ela responda: eu quero ser cientista, igual ao fulano”.
Também é importante, segundo ele, é que professores universitários tenham tempo e que sejam incentivados a fazer uma divulgação científica nas escolas. “É importante que eles contem como é a pesquisa, o que eles fazem, para prestar contas para a comunidade mostrando qual é a relevância da pesquisa. É preciso tornar as paredes das universidades mais permeáveis à comunidade em volta”.