Estudantes da EJA aprendem e ensinam povoado à beira de rodovia sobre plantas medicinais - PORVIR
Crédito: Gisélia Alves dos Santos/Arquivo Pessoal

Diário de Inovações

Estudantes da EJA aprendem e ensinam povoado à beira de rodovia sobre plantas medicinais

Primeira prática pedagógica selecionada pelo Prêmio Professor Porvir vem de Imperatriz, no Maranhão, e estimula a pesquisa sobre remédios naturais

por Giselia Alves dos Santos ilustração relógio 20 de abril de 2023

As turmas da EJA (Educação de Jovens e Adultos) trazem muitos saberes à sala de aula. Este é meu primeiro ano como professora da modalidade, na Escola Municipal Afonso Pena, localizada na área rural de Imperatriz, no Maranhão, e temos aprendido e construído juntos. A fim de estimular o conhecimento sobre a nossa comunidade com os alunos do 6º ao 9º ano de EJA, desenvolvi o projeto “Saberes do km 1700: plantando chá e colhendo conhecimento dentro do ambiente escolar”, com o apoio do coordenador pedagógico Elson Lopes Alves. 

A atividade, aliada a práticas de desenvolvimento sustentável, leva esse nome em referência ao Povoado 1700, situado à margem da BR-010, e tem como principal objetivo estimular a consciência ambiental dos estudantes. 

Para criá-la, eu me inspirei no Programa “Meu Ambiente”, da Secretaria Municipal de Educação. Ele aborda os biomas brasileiros, com destaque para as riquezas do Cerrado – presente na maior parte do estado maranhense. É o segundo maior bioma do Brasil (são, aproximadamente, 203 milhões de hectares) e da América do Sul, e possui algumas peculiaridades: vegetação baixa e rasteira, com mais de 200 espécies nativas para fins medicinais. Dados do Instituto Brasileiro de Florestas e da Política e Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos defendem o uso sustentável das plantas e das espécies com tais princípios ativos para a saúde. 

Optei, então, pela pesquisa sobre a fitoterapia, conhecida como a cura pelas ervas, baseada na importância dos saberes populares para a medicina alternativa. A proposta é incentivar a manutenção e preservação do Cerrado a partir do cultivo de plantas medicinais, valorizando a cultura popular sobre o meio ambiente. Investir na educação ambiental e na preservação das espécies se alinha às orientações curriculares e à geografia, disciplina que leciono, fortalecendo o pensamento social e o raciocínio crítico dos alunos.

Clique na imagem abaixo para conferir a galeria de fotos:

Pesquisa de campo

Minha turma, composta por estudantes entre 30 e 62 anos, conhece bem a potência dos chás e dos xaropes naturais para auxiliar nos tratamentos de saúde. Depois de uma oficina para ouvi-los e da explicação sobre o processo de pesquisa, montamos um questionário. Saímos juntos pelas seis ruas do povoado no horário do meu almoço. Batemos de porta em porta, perguntando aos moradores se faziam uso de remédios naturais e plantas medicinais em substituição aos remédios de farmácia. Se a resposta fosse afirmativa, perguntávamos detalhes das plantas utilizadas. 

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A partir dos dados coletados, identificamos 47 opções naturais para conter sintomas como febre, dor de cabeça, dor de barriga, gases e gripe. Com o material, montamos um gráfico que foi apresentado durante a aula, para um debate geral: concluímos que na comunidade 51% dos chás e xaropes são feitos de folhas, 17% de sementes; 15% do fruto; 11% da raiz; 4% da casca e 2% do caule. O maior uso das folhas, inclusive, preserva o elenco de espécies do Cerrado, pois a maioria das plantas medicinais trocam as folhas em determinada época do ano.

Resultados atingidos

Além da pesquisa quantitativa e qualitativa, os alunos realizaram uma exposição para toda a escola com cartazes explicativos, receitas de chás e frascos de xaropes das 10 plantas mais citadas no levantamento. E mais: o projeto inspirou a criação de um “jardim didático terapêutico” e de uma composteira de adubo orgânico, com os resíduos do refeitório. A horta da escola é aberta ao público para a colheita, e também há distribuição de mudas – os interessados no plantio contam com a orientação dos alunos sobre os cuidados gerais. 

Quando o professor pensa em impactos gerados, ele pensa em uma aprendizagem significativa, na qual os estudantes são protagonistas: trazem o saber popular para o espaço escolar, aumentam o senso crítico de responsabilidade com o ambiente, ficam mais engajados na mistura entre teoria e prática. E isso aconteceu com este trabalho. Neste meu primeiro ano de educação pública, na EJA, consegui levar à turma (que contava com uma aluna muito especial, a Maria Francisca, minha mãe), o gosto pela pesquisa e pelo trabalho de campo.

Confira, abaixo, algumas propriedades dos chás e xaropes naturais:


Remédio natural
Parte da planta medicinal utilizadaAuxilia a melhora de
CHÁ DE HORTELÃFOLHAResfriado, gripe 
CHÁ DE BOLDO FOLHAGastrite, azia, problemas relacionados a alimentos
CHÁ DE CIDREIRA FOLHAAnsiedade, insônia, estresse
CHÁ DE GENGIBRERAIZDor de garganta, má digestão
CHÁ DE LIMÃOFRUTODores musculares, sinusite, gripe
CHÁ DE LARANJACASCAPressão alta, gripe
CHÁ DE CAPIM SANTOFOLHACólica, dor de cabeça, dor muscular
CHÁ DE ERVA DOCESEMENTEPrisão de ventre, tosse
XAROPE DE ANGICO CASCAAnemia. Também é recomendado para pessoas que estão se recuperando de cirurgias
CHÁ DE AÇAFRÃORAIZMá digestão, faringite, garganta inflamada
BANHO DE ALFAVACAFOLHACansaço, desânimo. Indicado para revigorar as energias
XAROPE DE AGRIÃOFOLHATosse noturna, expectorante
CHÁ DE MANJERICÃO FOLHAProblemas digestivos, respiratórios, dor de garganta
CHÁ DE ARRUDA FOLHADores, gripes, reumatismo
CHÁ DE ENDRO FOLHAMá digestão, tosse
CHÁ DE EUCALIPTOFOLHASinusite, tosse
CHÁ DE MARACUJÁFRUTOAcalma, melhora o sono
CHÁ DE MANGA FOLHACongestão nasal, febre
CHÁ DE MAMÃOFOLHASintomas da TPM, anemia
Fontes: Revista Vida Simples, UOL, G1, Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (EMATER), Instituto Capixaba de Pesquisa Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), Jornal O Dia, Revista Casa e Jardim, Embrapa, Site Tua Saúde, Jornal do Commercio, Espaço ecológico, TV Jornal


Giselia Alves dos Santos

Professora de Geografia da rede municipal de ensino da cidade de Imperatriz (MA). Formada em ciências humanas/sociologia pela Universidade Federal do Maranhão, é especialista em metodologia do ensino superior pela INESPO. Tem extensão em gênero e sexualidade na escola pela Universidade Federal do Maranhão. Mestra em ciências da educação pela Universidad de la Integración de las Américas, é escritora da literatura de gênero, interculturalidade e saber popular. Prêmio Edelvira Marques de literatura 2019 com produção de livro inédito na cidade de Imperatriz. A primeira etapa do projeto aqui relatado foi Prêmio Destaque Regional Nordeste I e Prêmio Destaque Nacional em projeto de pesquisa em educação ambiental com medicina alternativa de plantas do Cerrado brasileiro, pela Olímpica Brasileira de Saúde e Meio Ambiente da FIOCRUZ-RJ.

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aprendizagem baseada em projetos, eja, Finalista Prêmio Professor Porvir, Prêmio Professor Porvir

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