Família é protagonista na rede de apoio para aulas remotas criada por secretarias - PORVIR
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Coronavírus

Família é protagonista na rede de apoio para aulas remotas criada por secretarias

Redes municipais estão organizando iniciativas para evitar evasão e manter crianças e jovens motivados a continuar estudando

Parceria com CIEB

por Maria Victória Oliveira ilustração relógio 7 de agosto de 2020

Diante do desafio de manter estudantes motivados e engajados com as aulas remotas, muitas redes de ensino têm criado novas iniciativas ou redirecionado ações já existentes no sentido de trabalhar e estabelecer uma verdadeira conexão com famílias e responsáveis, formando uma parceria para evitar a evasão escolar, tendência observada por diversos especialistas da área no pós-pandemia.

Propostas para fomentar essa aproximação entre família e escolas fazem parte do Guia de Implementação de Aprendizagem Remota desenvolvido pelo CIEB (Centro de Inovação para Educação Brasileira). A seção “Como envolver as famílias?” reúne ferramentas e materiais de apoio para a criação de um plano de comunicação com os familiares e responsáveis sobre a estratégia de aprendizagem remota. Com isso, espera-se que toda a comunidade se sinta mais envolvida e comprometida com o desenvolvimento das atividades durante a suspensão das aulas presenciais.

Em algumas redes, programas com essa finalidade tem surtido resultado. É o caso da Secretaria Municipal de Educação de Santa Maria (RS), que há 20 anos conta com o Programa de Controle de Evasão e Disciplina. Cláudio Pereira, professor de Educação Física e coordenador do Programa explica que, diante da pandemia, a rede se organizou para intensificar o trabalho de acompanhamento da frequência dos estudantes, bem como da demanda por apoio psicológico, a partir de um setor de busca ativa. Foi designado um profissional de cada escola, que é responsável por concentrar e encaminhar todas as demandas de professores da unidade, citando crianças e jovens que não respondem às tentativas de contato para engajamento com as atividades pedagógicas durante a quarentena.

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“Nós já tínhamos noção de que alguns alunos geralmente ficam mais tempo fora da escola, têm dificuldade de conexão e questões de vulnerabilidade. Por isso, seria necessário implementar logo todo esse trabalho”, afirma Cláudio.

Lucieli Leal, diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental São João Batista, é a responsável por encaminhar as solicitações dos docentes de sua unidade à secretaria. Segundo ela, desde o primeiro contato da escola com as famílias em março, no início da quarentena para distribuição de alimentos da merenda escolar, a instituição já encontrou dificuldades de contato. Em seguida, em maio, tiveram início as atividades pedagógicas que, nesse caso, foram realizadas com entrega de material impresso na escola.

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A força-tarefa da busca ativa
Cláudio explica que, no caso dos estudantes não contactados, as escolas preenchem um modelo de formulário inspirado na ficha FICAI (Ficha de Aluno Infrequente) com todos os dados dos alunos: nome, endereço, nome dos pais, telefone e os contatos que já foram feitos por parte da escola. “A secretaria fez um formulário dentro do Google Formulários para que, depois que as escolas esgotassem todas as possibilidades de tentar encontrar as famílias, preenchessem essa ficha. Entretanto, aqui em Santa Maria, existem as Redes de Apoio às Escolas [RAEs], com grupos por região. Cada grupo é composto pelas escolas daquele local, o Cláudio Pereira, representantes do Programa Saúde na Escola e da Estratégia Saúde da Família e outros agentes”, explica Lucieli.

No caso da EMEF São João Batista, a diretora teve dificuldade de contato com seis famílias, doze alunos de um total de 140. “Eu encaminhei a ficha de seis famílias. Dessas, duas retornaram os contatos. Uma delas justificou que as crianças estavam com o pai, enquanto é a mãe a responsável pelo contato com a escola. Além disso, no outro caso, temos notícia de famílias que foram retiradas de áreas de risco e estão morando em habitações populares. Mas, com a questão da violência, muitas delas estão divididas entre duas casas, o que dificulta o contato. Os índices de violência e criminalidade interferem muito na escola”, explica Lucieli.

Uma vez que o nome de determinado aluno chega à SME, tem início um trabalho intersetorial no município. “Nós trabalhamos junto com os CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), com conselhos tutelares, com o Programa Saúde na Escola, com as UBS (Unidades Básicas de Saúde), e então fazemos uma busca direcionada por regiões. A guarda municipal também está nos apoiando. Então vemos os nomes dos alunos enviados pelas escolas e procuramos entender qual setor pode nos ajudar”, explica Cláudio.

Lucieli reforça que o apoio e contato com outros serviços da rede são fundamentais. “Eu sou uma das professoras que mais acredita na questão do trabalho em rede. Quando as famílias não respondem, nós também podemos abordar o tema nas reuniões mensais dos grupos regionais, porque, muitas vezes, por mais que uma criança mude muito de escola, o desafio da frequência vai continuar.”

Além disso, a diretora explica a importância das chamadas “práticas restaurativas”, já consolidadas no município. “Quando conseguimos contato com as famílias e o estudante retorna à escola, nós fazemos os círculos de paz. Eu costumo chamar o professor Cláudio, os responsáveis pela criança e alguém da estratégia Saúde da Família. A ideia é falar sobre as dificuldades que impedem que aquele estudante vá para a escola e como cada setor pode ajudar nessa missão. É um trabalho em rede onde colocaremos as dificuldades, demandas e responsabilidades de todos os envolvidos.”

O trabalho acontece com todos os estudantes da rede municipal, desde a educação infantil até o ensino fundamental, que compreende 81 escolas e mais de 20 mil alunos.

Mobilização vai além da família
No caso de Lagarto, município de Sergipe, a SME organizou, além da distribuição da merenda escolar, a entrega de coletâneas de brincadeiras e interações no ambiente familiar para a educação infantil e de atividades educativas para o ensino fundamental, além de disponibilizar o conteúdo no site da prefeitura. “Esses materiais foram preparados a partir de assuntos que seriam abordados em sala de aula. Entretanto, decidimos fazer de maneira mais lúdica, porque nosso objetivo não é contar dias letivos ou usar essas atividades para compor nota no processo de avaliação da aprendizagem. Queremos estimular a aprendizagem em casa e incentivar que os alunos não percam o ritmo e o contato com o conteúdo educacional”, afirma Magson Almeida, secretário municipal de educação.

Ele explica que houve a realização de um trabalho de conscientização tanto da secretaria com os diretores das escolas, como dos diretores com as famílias dos estudantes, no sentido de engajar pais, mães e responsáveis e conscientizá-los sobre a importância de incentivar que os filhos continuem realizando as atividades pedagógicas durante o período de distanciamento social.

“Fizemos várias videoconferências com gestores das unidades de ensino, informando para que solicitassem que os pais auxiliem seus filhos com todas as atividades. Nós sabemos que, em sala de aula, cada professor tem uma didática diferente e jeitos próprios de passar o conteúdo. Mas o departamento de educação da secretaria fez todas essas conversas para incentivar que os diretores reforçassem que alguém pudesse orientar os alunos nesse momento para que não fiquem ociosos”, explica Magson.

Todo o contato com as famílias é realizado via grupos de WhatsApp ou mensagens de texto em SMS para aqueles que não têm smartphones. A secretaria também veicula informações sobre a entrega presencial de novas edições das coletâneas nas rádios do município, de forma a alcançar o maior número de famílias.

Entretanto, alguns desafios se colocam nesse caminho: ao mesmo tempo que muitos responsáveis não têm tempo para ajudar os filhos, outros não sabem como fazê-lo. Por isso, o secretário explica que essa é uma oportunidade de acionar a rede de apoio, pedindo auxílio a tios e tias, padrinhos, e aos avós das crianças.

Para Magson, o trabalho de orientar as famílias foi relevante para a compreensão da crise que o país atravessa, além da importância sobre a parceria entre família e escola. “Desde o início da pandemia, as coisas aconteceram no susto. Claro que a aceitação do ensino remoto não foi 100% de imediato. Mas depois que começamos a divulgar as ações e a pedir a participação dos responsáveis, o número aumentou bastante, tanto que temos feedbacks dos pais relatando que realmente não é fácil orientar os filhos, mas que pediram apoio para parentes e amigos. Hoje, temos entre 60 e 70% de participação dos estudantes, já que, de 14 mil alunos na rede municipal, já tivemos mais de 8 mil acessos no ambiente de aprendizado online”, pondera.

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coronavírus, educação online, ensino fundamental, equidade, tecnologia

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