Ginásio carioca incentiva jovens a ter projeto de vida
Programa Ginásio Experimental, lançado em 2011, foca na formação de cidadão autônomos, conscientes de seu papel na sociedade
por Redação na Rua 13 de agosto de 2013
Danilo Mekari, do Portal Aprendiz*
Da Lapa à Rocinha, de Ipanema à Tijuca, gingando por Madureira e desfilando pela Maré, o samba tem lugar cativo na vida cotidiana do Rio de Janeiro. De carnaval a carnaval, sua presença é tão marcante que, em 2013, o estilo musical tornou-se a principal disciplina em uma escola municipal da cidade. O Ginásio Experimental Carioca (GEC) Francisca Soares Fontoura de Oliveira, apelidado de GEC do Samba, foi inaugurado em fevereiro deste ano e faz parte de um projeto da Secretaria Municipal de Educação que pretende oferecer uma aprendizagem mais adequada aos adolescentes da rede municipal de ensino.
Por meio de inovações curriculares, de conteúdo, metodologias e gestão nas escolas do segundo segmento do Ensino Fundamental (do 7º ao 9º ano), o Programa Ginásio Experimental, lançado em 2011, tem como objetivo formar jovens autônomos, conscientes de seu papel na sociedade, e ajudá-los a traçar um projeto de vida.
“As escolas estavam totalmente desinteressantes para os adolescentes”, analisa a coordenadora dos GECs, Heloísa Mesquita. Para ela, o aluno precisa ver sentido na escola e, consequentemente, em estudar. “Quando se tem um norte tudo caminha melhor, inclusive os resultados acadêmicos.”
Mas para que isso vire realidade, são necessárias mudanças significativas na estrutura da aprendizagem. A começar pelo tempo de estudo – a proposta de educação integral dos GECs prevê que os alunos estejam nas escolas das 8h às 16h. O currículo tem mais ênfase em língua portuguesa, matemática, ciências e inglês, além de atividades que ajudam o aluno a construir um projeto de vida, a envolver-se em ações de protagonismo juvenil, estudo dirigido e oficinas optativas que complementam o aprendizado de forma lúdica.
Resultados positivos
No primeiro ano de execução do programa, dez escolas municipais – uma de cada Coordenadoria Regional de Educação – foram escolhidas para se converter em Ginásios Experimentais. A secretaria optou por escolas que já contassem com infraestrutura (salas de aula, quadra esportiva, biblioteca, laboratórios de informática e de ciências). Segundo dados do projeto, na primeira etapa de implementação, aproximadamente 4.500 jovens tiveram acesso à nova proposta educacional.
Os resultados foram imediatos. No Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2011, a avaliação dos alunos dos anos finais do Ensino Fundamental na capital fluminense saltou 22% (de 3,6 para 4,4), deixando o Rio de Janeiro entre as cinco melhores capitais do país – a média nacional do período é de 4,1. Entre as 10 melhores escolas avaliadas da cidade, quatro são Ginásios Experimentais.
Por outro lado, todos os dez primeiros GECs atingiram as metas de melhoria de aprendizagem. Quatro deles obtiveram melhora acima de 50% em relação com o Ideb de 2009; o Ginásio Experimental Carioca Orsina da Fonseca atingiu um crescimento de 94% na nota, de 3,2 para 6,2.
Hoje, o Rio já possui 25 GECs compondo a rede de ensino. Apesar de ter resultados consolidados e reconhecidos internacionalmente – os GECs já receberam visitas de representantes da Argentina, Uruguai e Espanha interessados em replicar o modelo –, os Ginásios não pretendem deixar de ser Experimentais. “Não queremos perder esse termo [Experimental] porque não queremos perder as novidades. Ainda temos inovações a serem feitas, para não deixar nunca de experimentar”, afirma Flávia Rezek, diretora do GEC Rio de Janeiro.
Uma dessas inovações começou a ser testada em 2013. Por meio do projeto Ressonância, um grupo de professores dos GECs compila todas as práticas de aprendizagem exitosas e, em reuniões mensais com professores de escolas municipais da região, têm a oportunidade de apresentá-las para que possam ser replicadas. Segundo Mesquita, “o professor do Ginásio não está sendo pago para ser tutor de outro professor, mas está aderindo ao projeto porque quer divulgar seu trabalho, sua prática”.
Tutores e polivalentes
A formação de docentes é outro aspecto diferenciado do Ginásio Experimental Carioca. “O professor do GEC passa por uma série de formações em que reaprende ou até mesmo aprende pela primeira vez. Formações em planejamento de aula, em didáticas específicas, como matemática, português, a própria gestão do tempo dentro da sala de aula”, explica Mesquita. O GEC propõe também a polivalência docente, na qual professores atuam em núcleos de matemática e ciências (exatas) e português, história e geografia(humanidades).
Na rede municipal, o professor tem dedicação exclusiva ao Ginásio onde leciona. Para Mesquita, isso gera uma diferença “evidente” no relacionamento entre aluno e professor. “Transforma a maneira de lidar com os jovens, sem gritos, sem berros. Afinal, um dos pilares do GEC é aprender a conviver”, declara.
Inspirado em orientadores de universidades, os professores-tutores pretendem captar as expectativas, interesses e necessidades do estudante e entender como lidar com as diferentes formas de aprendizado, além de eventuais falhas de aproveitamento. “Eles acompanham e analisam o desempenho do aluno e sugerem maneiras dele estudar”, afirma Rezek.
Os GECs propõem ainda uma mudança na lógica das avaliações. Segundo Mesquita, se um aluno vai mal e recebe nota insatisfatória, foi o professor que faltou ensinar, e não o contrário.“Se o jovem tem tutor, tem projeto de vida, educação e valores, por que o professor deu nota insatisfatória? Ele tem que justificar muito pra me dizer que o aluno é insuficiente”, pontua a coordenadora.
Ginásio e comunidade
A relação entre os Ginásios Experimentais e as comunidades que os cercam vai além da ideia de que os alunos do colégio provêm dos bairros próximos. Após quase três anos de existência, há GECs que, ao proporcionar autonomia aos seus estudantes, trazem para dentro dele as características marcantes da região em que se encontram.
Além do GEC do Samba, há um GEC ligado às Artes Visuais, localizado em uma região com muitas ofertas culturais, próxima ao Teatro Municipal, ao MAR (Museu de Arte do Rio) e ao Morro da Conceição – que, além de relevância histórica e arquitetônica, abriga uma série de ateliês de artistas plásticos. Na região do Aeroporto Internacional Tom Jobim existe o GEC Poliglota, que prioriza aulas de inglês, francês, espanhol e árabe (alemão e italiano são as próximas línguas a entrar no currículo).“São os entornos sinalizando quais são os interesses da comunidade”, avalia Heloísa Mesquita.
O GEC do Samba está localizado em Olaria, perto da escola de samba Imperatriz Leopoldinense e na mesma quadra do Cacique de Ramos, um dos berços do samba de raiz e partido alto carioca. Lá, os alunos tem o mesmo número de aulas de música quanto de outras disciplinas: teclado, violão, percussão, canto, flauta doce e musicalização.
De acordo com Eliete Vasconcelos, coordenadora musical do GEC do Samba, a herança musical dos jovens é muito clara. “A professora de percussão tem muita facilidade com os alunos, pois muitos são filhos de sambistas e de percussionistas da região. Assim, a familiarização com a música por parte desses jovens se torna evidente.”
“A escola se derrama para a comunidade e a comunidade se derrama para dentro da escola”, conclui Mesquita.
Esta reportagem faz parte de uma série especial sobre educação integral, acompanhando o lançamento do Centro de Referências em Educação Integral, uma iniciativa apoiada pelo Porvir e pelo Inspirare. A plataforma do centro estará disponível a partir de 29 de agosto, no www.educacaoint
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