TIC Educação: muitos estudantes usam IA e falta mediação
Freepik

Inovações em Educação

Muita IA, pouca mediação: o novo cenário das escolas revelado pela TIC Educação 2024

Pesquisa revelou que 7 em cada 10 estudantes do ensino médio usam ferramentas de IA para pesquisas escolares, mas apenas 32% afirmam ter recebido orientações sobre como usar essa tecnologia

por Redação ilustração relógio 16 de setembro de 2025

A pesquisa TIC Educação 2024 revela um cenário de transformação nos hábitos e na presença digital das escolas brasileiras, com a inteligência artificial (IA) e as plataformas de vídeo impactando a forma como os alunos buscam conhecimento. 

Atualmente, sete em cada dez estudantes do ensino médio utilizam ferramentas de IA generativa, como o ChatGPT, para realizar pesquisas escolares. Considerando todos os alunos do ensino fundamental e médio, a proporção chega a 37%.

⬇️ Baixe o e-book: “Guia rápido de IA para a sua aula”

A TIC Educação é realizada pelo Cetic.br (Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação), do Nic.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR) e apresentada pelo CGI.br (Comitê Gestor da Internet no Brasil). O estudo foi lançado nesta terça-feira, 16 de setembro.

A pesquisa mostrou que 39% dos alunos dos anos iniciais do ensino fundamental utilizam esses recursos para fazer pesquisas escolares. No ensino médio, esse percentual sobe para 70%.

“Em uma reflexão inicial, essas práticas de acesso à informação podem ter um impacto no desenvolvimento cognitivo dos estudantes, na forma como compreendem a produção de conhecimento”, afirma Daniela Costa, coordenadora da TIC Educação. 

A especialista alerta que o uso excessivo pode levar os alunos a depender de respostas prontas. Com isso, acabam refletindo menos sobre as informações e correm o risco de perder a capacidade de pesquisar, comparar e sintetizar dados, além de verificar a veracidade do que encontram na rede.

Impactos da não mediação

Como já ocorreu em outras ondas tecnológicas, os números vêm acompanhados de um problema recorrente: a ausência de mediação, tanto na escola quanto em casa. Apenas 32% dos estudantes do ensino médio e 19% do ensino fundamental afirmam ter recebido orientações sobre o uso dessas tecnologias.

O modo como professores e estudantes utilizam a internet evidencia práticas distintas. Enquanto muitos adultos ainda associam a ideia de pesquisa a buscadores como Google ou Bing, os jovens têm recorrido, cada vez mais, às plataformas de vídeo como ferramentas de busca. 

Atualmente, 74% dos estudantes utilizam sites de pesquisa, mas quase o mesmo percentual, 72%, já aponta canais e aplicativos de vídeo como fontes de informação para trabalhos escolares.

📳 Inscreva-se no canal do Porvir no WhatsApp para receber nossas novidades

Apesar da praticidade e da linguagem acessível, o uso intensivo de plataformas de vídeo como fonte de pesquisa escolar pode trazer riscos. Seja no YouTube ou em redes de vídeos curtos, como TikTok, Instagram ou Snapchat, um dos principais problemas está na formação de bolhas de informação. 

“É essencial que os alunos tenham a oportunidade de compreender como se dá o fluxo de informações na sociedade mediada por tecnologias digitais, como as informações são produzidas e veiculadas, quem as dissemina, com quais objetivos e por meio de quais sistemas algorítmicos. Tais aprendizados são importantes inclusive para o uso de buscadores tradicionais, que há algum tempo têm adotado sistemas de impulsionamento de conteúdos, e agora também têm oferecido sintetização de informações por meio de ferramentas de IA generativa”, ressalta Daniela.

Atrasos no pensamento crítico

Quando o estudante depende dos algoritmos para encontrar conteúdos, tende a ser exposto a materiais que reforçam suas preferências e visões prévias, em vez de ser estimulado a explorar múltiplas perspectivas. Esse processo limita o desenvolvimento do pensamento crítico, reduz a diversidade de fontes e pode comprometer a qualidade da aprendizagem.

Leia também

E-book gratuito: IA para professores explicada de forma simples

ACESSAR

Linha do tempo: História da inteligência artificial na educação

ACESSAR

IA na educação: oportunidades e riscos além das telas

ACESSAR

“Não se trata de substituir o uso de um serviço digital por outro, já que o ecossistema digital está baseado em dinâmicas semelhantes de automação, digitalização e plataformização. E sim promover a educação crítica entre os estudantes, os educadores e toda a comunidade escolar para lidar de forma mais ética, saudável e segura com estes sistemas”, comenta a coordenadora do levantamento.

Metodologia da TIC Educação 

A pesquisa TIC Educação é a principal referência para compreender como as escolas brasileiras estão lidando com tecnologias digitais. Em sua 15ª edição, o estudo investiga a presença, o acesso e o uso desses recursos por alunos, professores, gestores e coordenadores pedagógicos, abrangendo tanto instituições públicas quanto privadas, em áreas urbanas e rurais. O levantamento se apoia no Censo Escolar da Educação Básica para definir sua população-alvo, garantindo representatividade em todo o território nacional.

A coleta de dados ocorreu entre agosto de 2024 e março de 2025, por meio de entrevistas presenciais realizadas nas escolas. Esse período foi marcado pela transição trazida pela Lei nº 15.100, que restringe o uso de dispositivos móveis em sala de aula, permitindo que a pesquisa captasse percepções e práticas antes e depois da regulamentação. O recorte metodológico possibilita observar como o contexto legal e social impacta diretamente o cotidiano escolar e a integração das tecnologias ao ensino e à gestão.

Ao todo, foram entrevistadas 10.756 pessoas em 1.023 escolas, incluindo gestores, coordenadores, professores e mais de 7 mil estudantes. Desde 2020, a pesquisa conta com amostra ampliada para contemplar realidades urbanas e rurais de forma integrada. 

Os resultados detalhados, com tabelas, totais e margens de erro, estão disponíveis publicamente no site do Cetic.br.

Uso de celulares nas escolas

Embora a coleta de dados da pesquisa TIC Educação 2024 tenha ocorrido majoritariamente antes da entrada em vigor da nova legislação, os resultados já apontam uma tendência de mudança nas práticas escolares.

Entre 2022 e 2024, a proporção de alunos que acessaram a internet na escola por meio de seus próprios celulares caiu de 55% para 45%. Paralelamente, o número de escolas que proíbem totalmente o uso desses dispositivos aumentou de 28% para 39%, enquanto aquelas que permitem o uso em horários ou espaços específicos caiu de 64% para 56%.

Esses dados ajudam a contextualizar a criação da nova lei, que surge como resposta a um cenário de crescente preocupação com a distração em sala de aula, a exposição a conteúdos inadequados e o uso não pedagógico dos celulares.

Formação docente para uso de tecnologias

Entre os professores, a pesquisa revelou que 54% participaram de atividades de formação continuada com foco no uso de tecnologias digitais nos processos de ensino e aprendizagem, nos 12 meses anteriores ao levantamento. No entanto, observou-se uma redução significativa nesse percentual na rede municipal, que caiu de 62% em 2021 para 43% em 2024. 

Os cursos mais procurados pelos docentes foram aqueles relacionados a plataformas, programas de computador ou aplicativos para a criação de materiais didáticos, com 82% de participação, e o uso de tecnologias digitais para adaptar as atividades aos diferentes ritmos de aprendizagem dos estudantes, com 79% de adesão. 

Freepik

Em menor proporção, os professores buscaram formações sobre como orientar os alunos quanto ao uso seguro de tecnologias digitais (69%), sobre educação midiática e o uso crítico das mídias em sala de aula (68%), e sobre o uso de inteligência artificial em atividades educacionais (59%).

“A carência de desenvolvimento profissional contínuo para os professores é um dos aspectos críticos, mas a análise dos dados da pesquisa revela outros pontos de atenção, como a carência de recursos educacionais nas escolas”, diz Daniela. “Para 47% dos professores, a ausência de recursos educacionais digitais na escola, como programas de computador, plataformas, aplicativos ou equipamentos de multimídia e de robótica dificulta muito o uso de tecnologias digitais em atividades educacionais”, complementa. 

Oferta de educação digital e midiática 

É fundamental que os estudantes saibam identificar fontes confiáveis e combater a desinformação, especialmente em um cenário digital em constante transformação. Embora 89% dos coordenadores pedagógicos afirmem que suas instituições promoveram atividades relacionadas a temas como cyberbullying (assédio online), exposição na internet, integridade da informação, privacidade e uso de recursos baseados em inteligência artificial e algoritmos, a pesquisa mostra que o principal obstáculo está na inserção contínua e sistemática desses assuntos no currículo escolar.

A imagem mostra um jovem segurando um smartphone, com a tela exibindo aplicativos, enquanto está sentado diante de um computador com um teclado iluminado. Ele usa fones de ouvido, sugerindo estar envolvido em uma atividade digital.
Bruno Peres/Agência Brasil

Em outras palavras, uma palestra de conscientização não basta. É necessário que esses temas sejam integrados de forma transversal às práticas pedagógicas e aos conteúdos curriculares, contribuindo de uma maneira que faça sentido para a formação crítica e cidadã dos estudantes, seja no ambiente online ou fora dele.

Por enquanto, essa não é a realidade das escolas brasileiras. Os dados revelam que 30% dos coordenadores pedagógicos indicam que essas temáticas são abordadas apenas quando surgem dúvidas ou necessidades pontuais dos estudantes, e 49% das instituições realizam atividades relacionadas apenas uma ou duas vezes ao ano.

Conectividade nas escolas 

Segundo a pesquisa, 96% das escolas do país já possuem acesso à internet, um crescimento expressivo especialmente nas instituições municipais (de 71% para 94%) e nas localizadas em áreas rurais (de 52% para 89%) entre 2020 e 2024.

Além disso, 88% das escolas conectadas já contam com internet nas salas de aula, um salto de 20 pontos percentuais em relação a 2020. Esses dados apontam para uma evolução significativa na infraestrutura tecnológica das redes de ensino.

No entanto, o uso pedagógico das tecnologias ainda é marcado por desigualdades. Enquanto 67% dos estudantes da rede estadual utilizam a internet para atividades propostas pelos professores, esse número cai para apenas 27% nas escolas municipais.

Além disso, não basta contar com sinal de internet. A disponibilidade de dispositivos também é um fator limitante: somente 51% das instituições municipais possuem computadores para uso educacional.

Essa realidade evidencia que o acesso à tecnologia, embora mais amplo, ainda não é plenamente equitativo nem garante, por si só, sua integração efetiva ao processo de ensino e aprendizagem.


TAGS

conectividade, formação continuada, inteligência artificial, pesquisas, tecnologia

Cadastre-se para receber notificações
Tipo de notificação
guest

0 Comentários
Comentários dentro do conteúdo
Ver todos comentários
Canal do Porvir no WhatsApp: Receba as notícias mais relevantes sobre educação e inovaçãoEntre agora!