Para evitar desperdícios, professor estimula pesquisa com verduras e legumes descartados - PORVIR
Crédito: FG Trade/iStock

Diário de Inovações

Para evitar desperdícios, professor estimula pesquisa com verduras e legumes descartados

Iniciativa com estudantes de ensino médio da cidade de Camutanga, em Pernambuco, é reconhecida pelo Prêmio Professor Transformador

Parceria com Instituto Significare

por Adilson Pontes da Silva ilustração relógio 10 de agosto de 2022

O projeto “As verduras e legumes aproveitáveis e o extrato que dá gosto” nasceu da ânsia de empreender em algo para apresentar na “Mostra de Iniciação Científica” da EREM (Escola de Referência em Ensino Médio) Pedro Tavares, localizada em Camutanga (PE), no ano de 2019. Eu, como professor-mestre, responsável pela turma do 2º ano semi-integral “B”, percebi a angústia dos alunos em apresentar uma atividade que realmente pudesse elevar a autoestima da turma. 

Acreditando no potencial da turma e vislumbrando expectativas no aprendizado, tive que sair da minha zona de conforto de língua portuguesa para investir em um projeto que ultrapassava as barreiras da disciplina, da área de conhecimento, da sala de aula e até mesmo os muros da escola. Investi em um projeto interdisciplinar capaz de aguçar as habilidades e competência dos estudantes.

Assim nasceu a proposta. A ideia principal era o aproveitamento de verduras e legumes descartados em feiras livres e supermercados da região. Provoquei nos alunos a sua essência de pesquisadores, na busca para as respostas das seguintes questões: “O que fazer com as verduras danificadas que não servem para o comercialização e são descartadas nas feiras livres?”,”Como tirar o máximo de aproveitamento delas?”, “Como melhorar o gosto dos alimentos utilizando produtos feitos com essas verduras?” 

Os alunos, então, conheceram e reconheceram outros lugares, como a cantina da própria escola e de outras escolas, creches, abrigos de idosos e feiras livres, inclusive em outras cidades próximas. Territórios que ofereceram oportunidades de aprendizagens e ampliação do seu repertório cultural e contribuíram para que pudessem aplicar os saberes aprendidos na escola. Tiveram, também, a oportunidade de vivenciar a cidadania, por meio do encontro com modos diferentes de existir.

Diretores, merendeiras (de escolas, creches e abrigos), donos de quitandas de verduras e supermercados… Convencemos a todos que nosso projeto era bom, por aproveitar o que seria jogado fora, além de diminuir o impacto ao meio ambiente. 

No passo a passo, trabalhamos o gênero textual projeto, para que os alunos entendessem a dinâmica de como funcionava sua organização. Na sequência, parte das aulas foi planejada para explicar o método científico e a elaboração de pesquisa científica. Na etapa seguinte, voltada à organização da escrita do projeto, começamos a construir os objetivos e a metodologia. 

Realizamos várias reuniões, inclusive com o professor Jayse Ferreira, finalista do Global Teacher Prize em 2019, durante o planejamento. Assim foram definidas as equipes que iriam cuidar da pesquisa, dividida em duas partes. 

Na primeira, ocorreu o processamento dos produtos, iniciado com a coleta de verduras e legumes impróprios para comercialização, principalmente nas feiras livres. Na sequência, os seguintes passos: higienização do material adquirido; fatiamento; pré-cozimento dos legumes. Foram realizados dez experimentos, sendo aproveitados tomate, cebola, pimentão e similares para a produção de um extrato. Os legumes foram cortados em cubos e pré-cozidos, em água quente, com sal e vinagre.

Depois, fizemos a pesquisa de satisfação utilizando a abordagem qualitativa (para avaliar o resultado da qualidade dos produtos) e quantitativa (para avaliar o resultado da quantidade das pessoas satisfeitas com os produtos). As sobras das verduras e legumes que ficaram depois da higienização foram utilizadas para compostagem e adubação orgânica de pequenas hortas e jardins. 

Ao todo, produzimos 64 quilos do extrato de verduras e 37 quilos de legumes, distribuídos e consumidos em nove entidades, entre elas escolas, creches e um abrigo de idosos, todos situados na área da pesquisa. 

Professores de outras matérias também contribuíram com os conteúdos associados ao projeto. Alunos de outras turmas participaram da pesquisa como degustadores dos produtos. As merendeiras e cozinheiras ajudaram no cozimento e conservação dos produtos e nas entrevistas. Os familiares dos alunos também os incentivaram durante a pesquisa. Um pizzaiolo deu dicas de como usar alguns temperos e até mesmo um pouco de vinho, para conservar e dar um melhor gosto aos produtos. Os gestores de outras escolas, creches e abrigo de idosos contribuíram nos recepcionando de maneira calorosa e disponibilizando suas cantinas para que pudéssemos realizar o cozimento dos produtos.

Por meio da análise de dados dos experimentos do projeto, os estudantes foram capazes de desenvolver o raciocínio, aprenderam a interpretar e criticar os resultados, aplicando procedimentos e métodos oriundos das ciências. Vivenciaram também os quatro pilares da educação da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura): aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. Com isso, foram mais eficazes em suas avaliações e melhoraram as suas notas.

O projeto apoiou o trabalho com conteúdos de outras disciplinas, como: informática (internet, editor de texto, planilha eletrônica, programa de apresentações); química (ligações químicas; reações químicas; aspectos quantitativos das transformações químicas); matemática (probabilidade e estatística); biologia (citologia, componentes celulares e suas funções) e sociologia (pensamento científico e as ciências sociais).

A culminância da inico aconteceu na “Mostra de Iniciação Científica” da escola, obtendo o primeiro lugar. E também na “Mostra de Iniciação Científica” organizada pelo Talento Científico Jovem da UFPB (Universidade Federal da Paraíba), também ganhando o primeiro lugar. 

Em 2021, em plena pandemia, fiz a inscrição do projeto no Prêmio Professor Transformador, promovido pelo Instituto Significare e Bett Brasil, na categoria ensino médio. A premiação foi em São Paulo, em maio deste ano, e o projeto ficou em segundo lugar. O Porvir acompanhou a entrega (clique aqui para reler a matéria). 

Além do reconhecimento nacional da proposta, eu estava em uma fase na carreira de professor na qual vinha sendo afetado psicologicamente pelos efeitos da pandemia. Cheguei a pensar em desistir da profissão. Mas esses reconhecimentos, principalmente o Prêmio Professor Transformador, elevaram minha moral, ajudando a superar as dificuldades e conseguiram salvar a minha carreira. 

Para os alunos, o projeto lhes proporcionou uma autoestima tão elevada que era percebida de longe, pelo sorriso estampado em seus rostos.

Acredito que o projeto “As verduras e legumes aproveitáveis e o extrato que dá gosto” mudou a minha vida e a dos estudantes, também. Para sempre.

O que é preciso para replicar esse projeto?

Foram utilizados equipamentos como caderno e caneta, medidor de porções, balança, celulares, computadores, Datashow, panelas e utensílios, insumos de higienização e limpeza, etiquetas, geladeira, freezer, cozimento, armazenamento e conservação. Os destaques foram as parcerias com feirantes e supermercados para aproveitar verduras e legumes que seriam descartados: tomate, cebola, pimentão, coentro, batatinha, chuchu, cenoura, beterraba, abóbora, entre outros.

Quer saber mais sobre o Prêmio Professor Transformador?
Clique e acesse

Instituto Significare

Adilson Pontes da Silva

Graduado em letras pela Universidade de Pernambuco, é especialista em língua portuguesa e em ciências da educação pela FATIN (2011). É mestre em ciências da educação pela Universidad de Desarrollo Sustentable e doutorando na mesma área, na mesma universidade. Atualmente, é professor da secretaria de educação de Pernambuco (PE).

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educação mão na massa, ensino médio

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