Reflexões sobre a história do ensino de engenharia - PORVIR
Les Cunliffe / Fotolia.com

Inovações em Educação

Reflexões sobre a história do ensino de engenharia

Sala de aula deve ter menos cálculo e mais interpretação e análise de resultados, segundo diretor da Escola Politécnica da USP

por José Roberto Castilho Piqueira ilustração relógio 27 de junho de 2014

S
Este conteúdo faz parte da
Série Engenharia

A engenharia acompanha o homem desde suas origens. A obtenção do fogo, de vestimentas, habitações e o tratamento de metais para a construção de armas e ferramentas permitiram a sobrevivência da espécie.

Os romanos construíram aquedutos, estradas, barragens, pontes, sistemas de distribuição de águas e de coleta de esgotos e palácios, antes da física se estabelecer como ciência.

A atividade da engenharia era vista como intelectualmente menor, própria dos artífices e artesões, que passavam seu conhecimento sem preocupação com sistematização ou metodologia. Pertencia ao mundo dos trabalhadores braçais, e os intelectuais preocupavam-se com questões filosóficas e metafísicas.

Os exércitos, entretanto, perceberam a importância da engenharia para as batalhas e a arte de construir passou a ser sistematizada, com seu ensino incorporado ao treinamento de oficiais de maior patente.

As escolas de navegação foram decisivas para os descobrimentos, nos século 15 e 16. O domínio das técnicas de construção naval e da prática de conduzir navios tornou-se essencial para as nações que procuravam expandir suas fronteiras e buscar riquezas.

Essa era a engenharia até o final do século 17: técnicas de construção de pontes, dutos, armas e navios, reproduzindo os traços empíricos herdados das gerações anteriores, restritas ao âmbito militar.

As novas tecnologias afetam substancialmente os métodos de ensino, transformando o trabalho em sala de aula em discussões que enfatizam as interpretações conceituais e a análise de resultados

Nessa época, as Leis de Newton, que haviam sido propostas no início do século 18, deixaram de ser vistas como filosofia da natureza, sendo incorporadas aos trabalhos de engenharia, que ganharam contornos de sistematização, com as construções sendo pensadas como projetos.Nesse contexto nasceu a primeira escola superior brasileira: a Escola Naval. No início do século 19, Dom João VI, ao transferir a corte portuguesa para o Brasil, trouxe a Escola Naval de Portugal, que aqui se estabeleceu.

Em 1747, em Paris, nasceu o ensino de engenharia com a primeira escola não militar, a “École Nationale des Ponts et Chaussée”, seguida de outras escolas civis, em toda Europa. O ensino passou a combinar os conhecimentos empíricos com as bases científicas da mecânica.

A entrada do século 19 ficou marcada pela combinação das novas descobertas da física com as inovações propiciadas pelo desenvolvimento das máquinas. A engenharia, que sempre esteve ao lado da matemática, juntou-se à física e à química, exigindo formação ampla, além do empirismo.

O progresso tecnológico, aliado ao positivismo, foi responsável pelo surgimento de novas escolas em todo o mundo, agregando o “tec” como prefixo ou sufixo. No Brasil, entre 1890 e 1910, várias escolas politécnicas foram criadas, combinando base científica com aplicações de natureza industrial.

O século 20 ficou marcado pelos grandes progressos originários da combinação ciência-tecnologia: automóveis, aviões, computadores, trens de alta velocidade, instrumentação cirúrgica, ida do homem à Lua, são frutos da imaginação e da inovação.

Aprender engenharia no século 20 implicava conhecimento vasto, diversificado, requerendo fortes pendores para cálculos e projetos, desenhados sobre pranchetas, em papel vegetal, com tinta nanquim.

Projetos e aulas devem ser combinados com atividades em comunidades, centros industriais e urbanos, desenvolvendo soluções para questões como uso da água, aproveitamento energético, mobilidade urbana e segurança

Aulas expositivas intermináveis, laboratórios estafantes e noites de execução de projetos em casa eram o dia a dia do aprendiz.

Os engenheiros assim formados começaram a construir o século 21, com novos desafios sociais, além dos tecnológicos. O conteúdo a ser conhecido aumentou.

Não dá para entender o funcionamento do GPS sem conhecimento, ao menos rudimentar, de Teoria da Relatividade. Dizem que os computadores serão quânticos e a física do século 20 será essencial para a engenharia do século 21.

As novas tecnologias afetam substancialmente os métodos de ensino, transformando o trabalho em sala de aula em discussões que enfatizam as interpretações conceituais e a análise de resultados, uma vez que os procedimentos de cálculo ficam cada vez mais automatizados.

A atividade presencial deve explorar abordagens mais dinâmicas, voltadas a projetos, incentivando os trabalhos em equipe.

A inserção efetiva da engenharia na sociedade brasileira, entretanto, só ocorre se os estudantes são submetidos, durante sua formação, a problemas baseados em desafios reais.

Projetos e aulas devem ser combinados com atividades em comunidades, centros industriais e urbanos, desenvolvendo soluções para questões como uso da água, aproveitamento energético, mobilidade urbana e segurança. O resultado é a formação de profissionais atuantes, em benefício da sociedade.


TAGS

engenharia, ensino superior, série engenharia

Cadastre-se para receber notificações
Tipo de notificação
guest

5 Comentários
Mais antigos
Mais recentes Mais votados
Comentários dentro do conteúdo
Ver todos comentários
5
0
É a sua vez de comentar!x