RJ testa prova mundial de habilidades socioemocionais
Exame, feito pelo Instituto Ayrton Senna e OCDE, é o primeiro do mundo a avaliar, em escala, os conteúdos não tradicionais da escola
por Patrícia Gomes 8 de agosto de 2013
Muito mais do que ensinar álgebra, sistema digestório das plantas ou qualquer outra matéria que caia no vestibular, hoje parece ponto pacífico que as escolas precisam “preparar os alunos para a vida” e “para o século 21”. Exatamente o que significa isso, como desenvolver e avaliar as competências necessárias para tal é que são elas. Para dar um passo nesse sentido é que 55 mil alunos de escolas municipais e estaduais do Rio de Janeiro fazem, agora em setembro, a primeira prova em grande escala do mundo a medir esse tipo de competência – responsabilidade e disciplina, abertura a novas experências, sociabilidade, colaboração e estabilidade emocional. O exame, elaborado numa parceria entre o IAS (Instituto Ayrton Senna) e a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), tem a pretensão de ser o “Pisa das habilidades não cognitivas”.
A prova foi apresentada por Vivane Senna, presidente do IAS, ontem em Curitiba. “A grande pergunta que se tem hoje não é como se garante acesso, mas como se garante o sucesso. Para o sucesso escolar, as habilidades não cognitivas importam tanto quanto as cognitivas [conteúdo tradicional]. Para a vida, são as habilidades não cognitivas que influenciam mais”, disse ela, citando os estudos do Nobel de Economia James Heckman no campo da aprendizagem. “E já que elas são tão importantes, estamos desenvolvendo um instrumento para medi-las”, completou. As provas serão aplicadas para alunos de 5º, 6º e 9º ano do ensino fundamental e ainda para os de 1º e 3º do ensino médio.
Durante o piloto, o IAS vai testar oito “instrumentos psicológicos” diferentes. Tais instrumentos são metodologias que já vêm sendo aplicadas no mundo para medir habilidades não cognitivas, mas não em grande escala. Esses testes trazem questões de múltipla escolha com cinco respostas gradativas. A TRI (Teoria de Resposta ao Item), também usada no Enem, vai ajudar a aferir a consistência dos alunos na resposta. Um exemplo de pergunta que aparece nesses testes é: “Com que frequência você entrega seu dever de casa fora do prazo?”. As respostas variam de sempre até o nunca. A partir dos dados que levantar desse piloto, o IAS vai escolher qual dos oito testes – ou qual combinação entre eles – é capaz de fazer uma avaliação mais adequada das habilidades socioemocionais. Para chegar a esses oito, a equipe do IAS partiu de uma seleção que começou com 72 avaliações possíveis.
De acordo com Tatiana Filgueiras, responsável pelo desenvolvimento da prova no instituto, a escola, de alguma forma, já desenvolve as habilidades que se quer medir. Mas isso só não basta. “Saber identificar e mensurar tais competências poderá nos dar o caminho correto de promovê-las e desenvolvê-las no ambiente escolar. E assim poder impactar de forma positiva a aprendizagem”, afirmou. E o IAS e a OCDE estão bem atentos a essa possível correlação. “O principal objetivo das análises que serão feitas é identificar as competências não cognitivas que podem ser desenvolvidas e/ou promovidas em ambiente escolar e que têm maior impacto no próprio sucesso acadêmico e no processo de aprendizagem”, disse Filgueiras.
Assim, depois que os alunos responderem às provas, o IAS vai cruzar as informações não cognitivas que levantar com outros dois bancos de dados, o com notas de provas tradicionais oficiais (que traz resultados cognitivos) e outro com perfil socioeconômico. Esse cruzamento estatístico vai possibilitar um relatório, a ser entregue às redes com o retrato das séries avaliadas. “Vamos mostrar as evidências de como tais competências não cognitivas podem impactar o desempenho escolar dos estudantes”, afirmou Filgueiras.
Um segundo relatório vai trazer recomendações sobre o uso das ferramentas em políticas públicas em grande escala e vai ajudar no aprimoramento do exame, que pode servir de referência para avaliações dentro e fora do Brasil. A prova será o centro de uma discussão internacional dos Ministros de Educação dos países da OCDE, entidade responsável pela elaboração do Pisa, e março do ano que vem em São Paulo. “Na configuração mundial atual, você dominar conhecimento é apenas linha de largada. Cada vez mais o mundo está pedindo habilidades dessa natureza”, conclui Senna.