Um brasileiro e uma escola de bambu na África
O jornalista Vinícius Zanotti está levantando fundos para construir uma escola sustentável em uma comunidade vulnerável da Libéria
por Vagner de Alencar 20 de setembro de 2012
Assim que terminou a faculdade de jornalismo, em 2007, o paulista Vinícius Zanotti, 27, morou um tempo na Europa e depois decidiu fazer um “mochilão” pelo continente africano. Um dos pontos de parada foi a Libéria, país extremamente pobre localizado no oeste da África. A viagem pelo país, devastado por uma longa guerra civil que perdurou 15 anos (1989- 2003), mudou radicalmente a sua vida. A visita de 15 dias se tornou uma estadia de dois meses devido a graves problemas de saúde: Zanotti contraiu malária e febre tifoide. “A melhor coisa que aconteceu”, segundo ele, porque a necessidade de estender o tempo de viagem o levou a conhecer o liberiano Sabato Neufville e sua escola feita de bambu, na comunidade vulnerável de Fendell, em Monróvia, capital do país.
Aos 34 anos, Sabato é pai de 9 crianças adotivas órfãs da guerra. Em 2009, ao perceber que na comunidade de 2 mil habitantes não havia nenhuma unidade de ensino, ele decidiu construir uma escola de ensino fundamental e médio para 300 crianças – a única gratuita na região onde o acesso à saúde e a educação são totalmente privados. O liberiano recebe por mês US$ 800 como prestador de serviços da missão que a ONU (Organização das Nações Unidas) mantém na Libéria. Parte do seu salário é destinada aos 16 professores que dão aulas na escola de bambu e recebem mensalmente cerca de US$ 20. Além de manter a escola, Sabato também organiza o United Youth Movement Against Violence (Movimento da Juventude Contra a Violência, em tradução livre), em que coordenada atividades em outras duas comunidades, com teatro e dança para adolescentes liberianos como forma de combater a violência infantil.
Inspirado pela iniciativa do liberiano, o jornalista brasileiro decidiu produzir o documentário Escola de Bambu, contando a história de Sabato e da comunidade. Lançado no ano passado, o trabalho venceu diversos prêmios nacionais e internacionais. Mas o Zanotti não parou por ai, decidiu ir além e criar uma campanha homônima em que pretende arrecadar recursos para a construção de uma nova escola completamente estruturada.
Construção da escola
A arquitetura da nova escola foi toda planejada por arquitetos voluntários que buscaram referências locais, sustentáveis e técnicas facilmente replicáveis. Ela será refeita também em bambu, material renovável, de baixo custo e abundante na região. Acompanhado de tijolos adobe – feitos à base de barro. As salas serão iluminadas por luz solar vindas de frestas estratégicas nas paredes que também irão garantir uma ventilação natural. A escola terá um sistema de reuso de água da chuva e um sistema para geração de energia elétrica, baseado em energia cinética criado com partes de imãs quebrados e rodas de bicicletas.
Ela também passará a contar com banheiros e infraestruturas básicas com as quais não conta ainda. Todo o aprendizado será repassado para a comunidade local e para universitários liberianos para que mais projetos parecidos possam surgir. Segundo dados do Relatório do Desenvolvimento Humano, de 2011, o índice de desenvolvimento da Libéria é de 0,3%. No país, não há saneamento básico, rede pública de energia elétrica, qualquer tipo de semáforo, asfaltamento em ruas e transporte público. “O que mais me chamou atenção foi ver esse semblante de esperança no rostos dos jovens e das pessoas em geral. Mesmo depois de passar por 15 anos de guerra, me senti num país seguro e fui muito bem tratado”, afirma Zanotti.
Para levar adiante a iniciativa, o brasileiro reuniu amigos e outros voluntários para formar um grupo com cerca de 40 “bambuzeiros” – como são chamados os colaboradores. A equipe atua voluntariamente em diferentes áreas: os programadores e webdesigners cuidam do site, os publicitários ficam responsáveis pelo marketing, os músicos pelas trilhas sonoras do vídeos e os arquitetos pelo projeto da construção da escola.
A campanha pretende arrecadar R$ 400 mil para a construção da nova escola na Libéria. Para isso, eles recebem doações pelo site do projeto e vendem o documentário em DVD, camisetas e canetas com o logotipo do projeto. “Também estamos buscando parcerias com empresas e instituições”, diz Zanotti. Até agora, somente por meio de doações de pessoas físicas, a campanha já arrecadou cerca de R$ 20 mil.
Na Libéria, apenas cerca de 2.800 pessoas de uma população de 4 milhões, têm acesso à internet – o país tem o menor índice de acesso à internet do mundo, segundo o instituto de estatística da Unesco, ICT Statistics Database. “Prevemos também a construção de uma sala de informática com pelo menos 40 computadores. A ideia é que as que as crianças e jovens possam ser inseridas no mundo digital”, diz. Futuramente, a ideia é também criar um projeto no estilo “adote um professor” como forma de valorizar os educadores no país, que recebem salários baixíssimos.
Veja o trailer do projeto: