O que professores brasileiros pensam sobre reprovação
Estudo aponta que quanto mais os docentes conhecem os efeitos da repetência, menos eles tendem a concordar com a prática
por Marina Lopes 24 de abril de 2017
Nas últimas décadas, diversos estudos buscaram compreender os efeitos da reprovação no percurso escolar de um aluno. O assunto, no entanto, ainda divide opiniões de educadores brasileiros. Enquanto 13% dos professores são contrários a essa prática e 9,4% dizem ser a favor da retenção, outros 78% dos docentes adotam uma postura intermediária – eles concordam ou discordam parcialmente da medida.
Os dados fazem parte da pesquisa “Crenças de professores sobre reprovação escolar”, divulgada pelo Cenpec (Centro de Pesquisas e Estudos em Educação, Cultura e Ação Comunitária). Com a intenção de analisar as principais crenças sobre os efeitos dessa prática na educação básica, o levantamento considerou as respostas de mais de 5 mil docentes, espalhados por todas as regiões do país.
Entre outros resultados, o estudo demonstra que quanto mais os professores conhecem os efeitos da repetência, menos eles tendem a concordar com a prática. “Quem tem mais conhecimento sobre os efeitos da reprovação no aluno vai tender a ser contrário. O professor pode até achar que o aluno ganhou alguma coisa, mas as pesquisas mostram que ao longo do tempo esse ganho se perde e o problema da autoestima permanece”, avalia Vanda Ribeiro, pesquisadora do Cenpec e professora da pós-graduação em educação da UNICID (Universidade Cidade de São Paulo).
Ao analisar as crenças dos professores em relação ao tema, a pesquisa também identificou como o perfil docente pode influenciar em sua adesão à reprovação. Entre outros dados, os educadores favoráveis consideram a meritocracia como um bom critério de distribuição de conhecimento, são partidários da avaliação normativa e possuem menos tempo de experiência docente.
Segundo a pesquisadora, a percepção dos educadores sobre o tema também pode estar relacionada às experiências individuais de cada um. “Os professores adquirem suas crenças em muitos lugares, ao longo da sua trajetória como alunos, nas suas formações iniciais e continuadas ou até mesmo no contexto de escola em que atuam”, diz.
A pesquisa realizada pelo Cenpec integra uma investigação internacional, feita em parceria com a Universidade de Genebra, sob a coordenação do pesquisador belga Marcel Crahay. Aqui no Brasil, o estudo também contou com apoio financeiro da Fundação Tide Setubal.
Apesar dos estudos da Bélgica, Romênia e Suíça ainda estarem em andamento, quando prontos eles podem integrar um panorama maior que retrata percepção de educadores sobre a reprovação escolar. “As pesquisas que são feitas em outros países podem ajudar a reforçar os pesos dos nossos próprios achados”, menciona Vanda. De acordo com a pesquisadora, a análise desses resultados pode ajudar a entender as crenças que permanecem ou se modificam conforme o contexto educacional de cada local.
No Brasil, conforme os dados do Censo Escolar 2015, as taxas de reprovação ainda apresentam números preocupantes: o índice de retenção nos anos iniciais do ensino fundamental chega a 5,8%, sobe para 11,1% nos anos finais e alcança 11,5% no ensino médio. Esse número é ainda maior no primeiro ano do ensino fundamental, com 16,6% dos alunos reprovados.
Tendo como base esse cenário, o estudo também faz uma revisão da literatura e resgata o histórico de políticas públicas criadas nos últimos anos para reverter os altos índices de reprovação e evasão escolar. Entre as experiências apresentadas, está a da rede municipal de São Paulo que organizou o ensino fundamental em ciclos com progressão continuada, possibilitando que o aluno não seja retido antes de completar cada ciclo.
A pesquisa também cita as redes estaduais de ensino de São Paulo, Minas Gerais, Pará, Paraná, Goiás e Rio de Janeiro, que nos anos de 1980 começaram a implementar o Ciclo Básico de Alfabetização, que previa a progressão continuada do 1º para o 2º ano.
Apesar de não ser contrária à progressão continuada, a professora de português Silmara Regina Colombo, de Sertãozinho (SP), destaca que as políticas públicas deveriam prever um melhor acompanhamento para os alunos do ciclo que estão com dificuldades de aprendizagem. “A minha sugestão é que a progressão continuada viesse acompanhada de inovações na educação e que houvesse realmente um acompanhamento de recuperação paralela”, defende a educadora, que atua na rede pública estadual de São Paulo.
Ao opinar sobre o assunto, a educadora Maribeth Paes dos Santos, de Uberlândia (MG), diz acreditar que os modelos atuais de avaliação não são suficientes para medir o desempenho dos estudantes e verificar se eles estão aptos a seguir para as próximas etapas. “Eu sou contrária a reprovação do jeito que ela acontece hoje nas escolas. As avaliações são muito quantitativas, elas não conseguem medir o qualitativo”, menciona.