Famílias e professores têm grande influência sobre jovens da Geração Z, mostra pesquisa
Nascidos entre meados da década de 1990 até 2010, em pleno ambiente digital, jovens da Geração Z são orientados pela opinião dos pais, cuidadores e professores
por Maria Victória Oliveira 12 de agosto de 2022
Entender as características, costumes, cultura e comportamento das novas gerações pode ser um processo desafiador, mas que rende bons frutos. Afinal, é a partir da compreensão do outro que se pode pensar em estratégias mais acertadas – na educação, por exemplo – de acordo com a realidade em questão. Essa é a principal proposta da Pesquisa Geração Z, que acaba de ser lançada pelo Institute for Generational Research and Education, localizado no Arizona (EUA).
A preferência por conversas pessoalmente, a influência e o papel das famílias e docentes, as oportunidades de avanço e desenvolvimento como o que mais os motiva os jovens foram algumas das descobertas do levantamento. O Brasil foi convidado a participar da iniciativa por ter realizado um outro estudo, idealizado a partir da experiência das pesquisadoras Corey Seemiller e Megan Grace, que já realizaram três ciclos de pesquisas sobre a Geração Z: em 2014, 2017 e 2019, que originaram quatro livros e diversos artigos.
“Em 2021, fomos convidados para participar de uma pesquisa maior, que foi replicada em cerca de 40 países. Isso abre a possibilidade de falarmos não apenas sobre os jovens do Brasil, mas também fazer comparações com jovens de outros países”, explica Gustavo Severo de Borba, diretor do Instituto para Inovação em Educação da Unisinos, que integra o comitê da pesquisa no Brasil.
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Aplicação na educação
Mas qual é, afinal, a importância de um estudo que visa compreender as preferências dos jovens da Geração Z? Como isso pode ajudar adultos a pensar, de maneira otimizada, nesta faixa etária?
Para Gustavo, o ponto alto da pesquisa é a possibilidade de entender como os jovens se percebem. “Os jovens se colocam como pessoas leais como primeira característica [que os descreve]. Ter essa informação é relevante para que possamos enxergar aquilo que eles percebem ou não percebem em si mesmos e adaptar nossa relação e construção dentro e fora de sala de aula a partir desses elementos”, reforça.
Para Isa Mara da Rosa Alves, coordenadora de Inovação Pedagógica da Unisinos Education, e também integrante do comitê da pesquisa no Brasil, compreender a Geração Z é fundamental para o olhar dos educadores, o que contribui para visualizar tendências de futuro na educação.
“Acreditamos que os processos de ensino e aprendizagem devem estar pautados na relação entre professor e aluno. Nessa relação de protagonismo compartilhado, a empatia é fundamental. É nesse contexto que vemos a importância desses dados: trata-se de uma pesquisa de escuta sensível e olhar atento para aqueles que são a razão de todos nós professores existirmos”, afirma.
Voz dos estudantes
Renata Kreuz, estudante de 19 anos de design e ciências sociais em Novo Hamburgo (RS), que respondeu a pesquisa, comenta que vê esse tipo de iniciativa com bons olhos, por permitir identificar as principais características de cada geração, as diferenças entre si, e as influências de fatores externos, as formas preferidas de comunicação, de aprendizado, ensino, vivências, compartilhamento, entre outras. Empatia, motivação, determinação, autonomia, vontade de mudar e iniciativa de colocar a mão na massa seriam alguns adjetivos e características que Renata usaria para descrever a Geração Z.
Além de informações referentes ao perfil dos respondentes, sendo a maioria branca (84,7%); mulheres (67,2%); heterossexuais (71,2%) e de áreas urbanas, outros achados da pesquisa chamam a atenção.
Um deles diz respeito à religiosidade da nova geração. Cerca de 53% dos respondentes afirmaram que reconhecem sua religiosidade, mas não participam de nenhuma religião específica. Além disso, 20% disseram não ser uma pessoa espiritual. Quando o assunto é inabilidade, a mais falada pelos jovens respondentes foi a psicológica, indicada por 66,3%, que engloba casos de ansiedade, depressão, transtorno bipolar, entre outros.
Gustavo destaca o fato de 31,5% apontarem que não têm uma ideologia política definida. Apesar de esses achados serem significativos e indicarem características importantes da Geração Z, o diretor reforça que considera mais as informações referentes à autopercepção dos jovens e como isso impacta seu processo de aprendizagem.
‘Receber uma oportunidade para avançar’, como uma promoção (88,5%), ‘ver os frutos de seu trabalho’ (87,3%), ‘fazer a diferença para alguém’ (78,3%), ‘aprender algo novo’ (77,2%) e ‘advogar por algo em que acredita’ (75,3%) são os cinco grandes motivadores apontados. “Todos esses fatores estão conectados na percepção dos jovens para com o outro, ou à melhoria do que eles são hoje. O sexto fator que os motiva, por exemplo, está ligado a recompensas tangíveis. Tudo isso mostra que esses jovens buscam um processo de construção e aprimoramento ao longo do tempo e essa relação com o outro”, analisa Gustavo.
Influência das famílias e educadores
Quando questionados sobre influenciadores em seus processos de tomada de decisão, 34,9% dos jovens afirmaram que a opinião de seus pais/guardiões influenciam muito e, em seguida, 16,6% afirmaram que consideram muito a opinião de seus professores. Para Gustavo, a descoberta tem muito a dizer sobre o papel importante desempenhado pela educação nessa geração.
“Fiquei até certo ponto surpreendido por esse achado. Embora saibamos que os professores têm alta influência [sobre os alunos], quando vemos a tecnologia cada vez mais forte e, digamos, outros ‘perfis’ interagindo e trazendo informações para os alunos, essa questão dos educadores me pareceu muito importante”, expõe Gustavo.
O grande ponto dessa descoberta é mostrar que os professores são, sim, propulsores no processo de engajamento dos alunos e exercem uma influência positiva em seu processo de aprendizagem
Segundo o diretor, mesmo diante de uma transformação do papel do professor, que passa de detentor do conhecimento para inúmeras outras funções, há um ganho de relevância no contato com o aluno a partir da ampliação das competências desse profissional. “O grande ponto dessa descoberta é mostrar que os professores são, sim, propulsores no processo de engajamento dos alunos e exercem uma influência positiva em seu processo de aprendizagem.”
“[O achado] revela que há uma parcela significativa dos jovens pesquisados que apostam em uma sociedade crítica, informada e que acreditam em seus professores. Em um contexto de desvalorização política da educação e de tantas dificuldades enfrentadas nas escolas, vemos que nossa responsabilidade como professores segue imensa para o futuro dos jovens da Geração Z”, completa Isa Mara.
Renata também vê com preocupação o cenário atual da educação brasileira. “Questiono muito o futuro da educação brasileira, pois infelizmente vivemos em um país em que a educação e os professores são desvalorizados”, diz a estudante. Apesar disso, cita que o achado conversa diretamente com a mudança da postura dos professores.
“Acredito que todo mundo tem aquele professor, seja da universidade ou do jardim de infância, que ficou na memória com um carinho imenso. Principalmente na escola, vejo como os educadores acolhem seus alunos. Se comparada com gerações anteriores, a relação é diferente: se antes passava uma sensação de autoridade e medo, agora é uma relação mais fraternal”, defende.
Impacto da pandemia na Geração Z
A pandemia produziu inúmeros impactos nas novas gerações e alguns deles foram mapeados pela pesquisa. Houve, por exemplo, mudanças nos hábitos de consumo para 34% dos respondentes.
Outro dado que merece destaque é o fato de que 82% dos entrevistados têm a conversa presencial como método preferido de comunicação. Para Isa Mara, o achado diz que é preciso observar mais e rotular menos. “Precisamos escutar nossos alunos com mais atenção. Não podemos simplificar e reduzir toda uma geração a estereótipos.”
Ou seja, por mais que os jovens da Geração Z tenham maior facilidade com a tecnologia e as múltiplas formas de comunicação que os aparelhos e a internet permitem, todas essas funcionalidades ainda não conseguem substituir uma boa conversa olho no olho. “Eu prefiro conversar presencialmente. Nem tudo é perfeito como na teoria. O online não é capaz de substituir o presencial, o contato e as experiências”, afirma Renata.
“Esse achado é muito relevante porque, em termos de educação, dá respaldo para uma perspectiva da lógica social da educação, da interação e conexão. Quando interagimos um com o outro, estamos em um processo coletivo de construção da aprendizagem. E embora esse processo possa ser feito de várias formas, como mediado por tecnologia, ele é muito rico no presencial”, conclui Gustavo.