Entenda o(s) conceito(s) de negócios sociais - PORVIR

Inovações em Educação

Entenda o(s) conceito(s) de negócios sociais

Usando a lógica de mercado para causar impacto social, empresas se dedicam a problemas como educação e saúde

por Patrícia Gomes ilustração relógio 14 de maio de 2013

Quando Thiago Feijão, 23, decidiu criar o QMágico, o que ele queria era fundar sua terceira ONG. A ideia era usar a tecnologia para permitir que estudantes em situação de vulnerabilidade social tivessem acesso a uma educação de qualidade. Não demorou para que esse estudante do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) percebesse que teria que abrir uma startup, e não uma organização sem fins lucrativos, se quisesse que o QMágico ganhasse escala e fosse sustentável financeiramente. E assim foi. Construiu um modelo de negócios promissor, chamou a atenção de investidores e hoje já está comercializando o seu produto, um ambiente virtual de aprendizado que é capaz de oferecer informações personalizadas sobre a aprendizagem de cada aluno.

“Não temos como meta só o lucro. Queremos juntar métricas de impacto social com retorno financeiro”, diz o jovem, que é um dos representantes de uma geração de empreendedores que tem aberto mão de se lançar em mercados de salários altos para se dedicar a negócios que assumem também uma função social, os chamados negócios sociais – que endereçam principalmente problemas de educação, saúde, transporte e moradia. “A decisão hoje não precisa ser escolher entre ganhar dinheiro ou fazer o bem. Nem entre ser engenheiro ou músico. O mundo, mais líquido, como nos diz Zigmunt Bauman, permite que as coisas sejam mais fluidas e menos definidas”, afirma Carla Mayumi, uma das coordenadoras da pesquisa O Sonho Brasileiro, realizada pela agência Box1824 com mais de 25.000 jovens com idades entre 18 e 24 anos.

crédito adimas/ Fotolia.com

 

Apesar de os negócios sociais estarem cada vez mais comuns no cenário brasileiro, não há consenso nem entre os principais envolvidos no setor sobre uma definição exata do termo negócios sociais. Existe um grupo que se inspira no Nobel da Paz Muhammad Yunus, que chega neste mês ao Brasil para inaugurar um centro de pesquisa com a ESPM-SP dedicado ao tema. Eles acreditam que negócios sociais são empresas que tentam resolver um problema social desenvolvendo produtos e serviços para a base da pirâmide, fazem dinheiro com isso, mas reinvestem todo o lucro obtido no próprio negócio. Assim, esperam eles, os dirigentes da empresa terão motivação apenas social e usarão os dividendos gerados para promover a atividade a que se dedicam.

“Essa é uma ideia fácil de vender aos políticos, porque eles também sairão beneficiados”

Por outro lado, existe um segundo grupo que também tem seu principal produto voltado para as classes C, D e E e tem o objetivo de resolver uma demanda social importante, mas que acredita ser possível redistribuir o lucro entre os acionistas. A situação é bem caracterizada pelo lema “entre ganhar dinheiro e fazer a diferença no mundo, fique com os dois”, adotado pela Artemísia, primeira aceleradora do país dedicada ao tema. Como a Artemísia, outros fundos de investimento, acelaradoras, startups e incubadoras também reforçam esse segundo grupo, mais numeroso no Brasil. Nos dois casos, fica a máxima destacada por Rogerio Oliveira, diretor do Yunus Social Business Brasil: “não é porque vem de um negócio social que um produto vai ser comprado. Ele tem que ser bom”, afirma.

Internacionalmente, esses grupos recebem nomes diferentes. Os de Yunus são chamados de social business, ao passo que as empresas que repartem o lucro entre os acionistas são as social enterprises. “Já tem gente no Brasil chamando o grupo que reparte o lucro de negócios de impacto”, afirma Oliveira. Mas enquanto o conceito se solidifica e amadurece, o mais comum é que os dois grupos sejam chamados genericamente de negócios sociais.

Com a falta de uma conceituação clara e de uma legislação específica, como ocorre em outros países, os negócios sociais acabam tendo mais dificuldade de se organizar em rede. Na Inglaterra, por exemplo, onde há pelo menos 68 mil empresas com esse perfil, o governo ajudou a regulamentar o setor e ainda facilitou trâmites para ele mesmo se tornar cliente dessas empresas. “Essa é uma ideia fácil de vender aos políticos, porque eles também sairão beneficiados”, afirma Peter Holbrook, CEO da Social Enterprise UK, rede que reúne 16 mil negócios sociais. O inglês ressalta o fato que, ao oferecer um serviço ou um produto para classes mais desfavorecidas, as empresas estão cumprindo um papel que, em última instância, seria do governo.

“As definições são importantes, mas não se preocupem muito com elas. Coloquem essas empresas em rede e desenvolvam um plano para ganhar o apoio político de que ainda precisam”

Apesar de o diálogo ainda estar começando por aqui entre setor e governo, Renata Truzzi, diretora executiva do Nesst Brasil, uma organização que trabalha na incubação e na aceleração de negócios sociais, comemora que o tema esteja começando a ser considerado na esfera federal. Um grupo de trabalho está discutindo um marco legal para o terceiro setor no Brasil e os negócios sociais estão na pauta. Para ela, no entanto, é mais difícil fazer com que uma empresa com esse perfil seja sustentável porque os riscos são maiores. “Ainda temos poucos modelos para servir de exemplo e o retorno financeiro costuma ser menor do que em empresas tradicionais. Por isso, capacitação para atuar no setor é fundamental”, diz Truzzi.

“As definições são importantes, mas não se preocupem muito com elas”, sugere Holbrook. Para o inglês, o Brasil vive um momento único para o desenvolvimento dos negócios sociais: tem uma economia em ascensão, vem ganhando importância no cenário internacional e pode aprender com países onde o setor já é mais estruturado, como o Chile ou também Canadá, EUA, Austrália e Coreia do Sul. “Coloquem essas empresas em rede e desenvolvam um plano para ganhar o apoio político de que ainda precisam”, aconselha.


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carreira, negócios de impacto social

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