A escola diante do dilema de avaliar para resultado ou desenvolvimento - PORVIR
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Inovações em Educação

A escola diante do dilema de avaliar para resultado ou desenvolvimento

Especialistas que participaram da Bett UK, uma dos principais eventos de educação e tecnologia do mundo, questionam o real papel das avaliações escolares no cenário pós-pandêmico*

por Luciana Alvarez ilustração relógio 6 de abril de 2022

Uma das reflexões mais importantes durante a Bett UK 2022, evento de referência mundial quando o assunto é educação e tecnologia, realizado em Londres entre os dias 29 e 31 de março, foram as formas e a necessidade das avaliações. Com tanta coisa mudando nas escolas desde o início da pandemia, faz sentido continuar avaliando como antes? Há quem acredite que as avaliações tradicionais mais prejudicam do que auxiliam a promover de fato aprendizagens.

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Integrante da rede de liderança Global do Aspen Institute, Eduardo Briceño falou em uma palestra sobre as diferenças entre um ambiente de performance e um de desenvolvimento. No primeiro, o importante é mostrar o que se sabe fazer bem, evidenciar os pontos fortes, evitando mostrar qualquer erro. Para chegar nesse ponto, é preciso treino e muita repetição. “Quem, como estudante, nunca tentou esconder o que não sabia?”, provocou ele.

No segundo tipo de ambiente, cada um tenta sempre se desafiar a aprender coisas novas e, portanto, se dispõe a errar. “Aqui o objetivo é melhorar. Na prática, significa tentar realizar coisas que não se sabe bem; o foco é o que não se sabe”, explicou.

Tendo como público principal professores e gestores escolares, Eduardo questionou se, para os alunos, estaria claro o que a escola é um ambiente de desenvolvimento. Os educadores da plateia disseram que não e contaram os porquês disso. Claro que a quantidade de avaliações que cobram uma resposta certa apareceram como as “vilãs”, sendo uma das principais razões para que os alunos vejam a escola como uma zona para demonstrar boa performance, em vez de um espaço para explorar e aprender.

Na prática, usando um sistema online que faz quizzes que mostra resultados na hora, o palestrante deu um exemplo de como os professores podem avaliar o que os estudantes pensam e compreendem de um tema, sem precisar fazer exames formais. A ideia é usar as respostas dos alunos para poder seguir a aula por um determinado caminho, e não dar notas.

As respostas aos formulários online são projetadas em formatos variados: como estatísticas, nuvem de palavras ou listas, mas normalmente sem identificar quem deu cada resposta. A experiência na sala se torna interativa e sem a pressão por demonstrar que se sabe a resposta certa.

Eduardo, contudo, alerta que não basta abrir mão de avaliações formais para se mudar a mentalidade dos alunos. Os educadores precisam criar um ambiente que seja acolhedor com os erros, mostrar a relevância prática do que está sendo visto em sala de aula e, também, ser um exemplo de aprendizagem constante. “Nós temos de nos colocar numa zona de desenvolvimento – e tornar visível para os alunos como estamos tentando nos aperfeiçoar”, afirmou. Confira, no vídeo abaixo, alguns destaques do evento.

Aprendizagem constante
Levar a cabo mini avaliações constantes em sala de aula, como na proposta por Eduardo Briceño durante a Bett UK, é possível mesmo quando não se dispõe de dispositivos e internet. Arthur Galamba, brasileiro que trabalha com a formação docente na King’s College, recebeu uma delegação de educadores brasileiros e contou que é muito comum os professores ingleses distribuírem pequenos quadros brancos aos alunos. Assim, podem ir fazendo perguntas e lendo as respostas várias vezes durante a aula, para perceber o quanto a turma está acompanhando de um assunto, onde estão as dúvidas.

“Eu achei pedagogicamente transformadora a utilização de quadros brancos para a avaliação de aprendizagem dos pequenos. É fácil, barato, serve para qualquer tipo de layout da sala e realmente transforma a maneira de interagir”, disse Arthur, que teve experiência de cerca de uma década como professor no Brasil antes de se mudar para o Reino Unido.


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Por mais que escolas e professores desejem repensar formas de avaliação, de forma a promover mais o aperfeiçoamento do que a demonstração de boa performance, será que a sociedade está preparada para que as escolas deixem de dar notas ou conceitos para os alunos? A escola não está sozinha no mundo e precisa sim conversar com as expectativas de todos, desde os próprios estudantes até os governantes.

Nesse contexto, as famílias têm um papel fundamental. “Uma das coisas que nos detém de realmente mudar a forma que avaliamos os estudantes nas escolas são os pais. As famílias querem saber onde os filhos estão, que nota têm. Eles sentem que sem essas notas não conseguem acompanhar a educação dos filhos”, disse Amie Barr, diretora de avaliação da Ark School, no Reino Unido. ”Mas há tantas outras informações ricas que podemos dar aos pais, muito melhores que uma nota ou conceito. Temos que falar com os pais para conseguir mudar a forma que avaliamos.”

A mudança de conceito, porém, deve abranger também outras esferas, como os empregadores, para que numa seleção não repitam avaliações padronizadas ou cobrem currículo com “boas notas”. “É importante trazer os empregadores para essa discussão. Sou educador e também empregador. Nas minhas equipes, as pessoas aprendem juntas todos os dias, mas não fazem provas ou tem que se lembrar de coisas que foram ditas meses atrás. Elas trabalham colaborativamente, têm que escolher informações que sejam úteis e aplicá-las. São essas as habilidades que eu preciso como empregador”, concluiu Matt Wingfield, chefe-executivo da eAssessment Association, do Reino Unido.


*A jornalista viajou para Londres a convite da Bett Brasil.


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aprendizagem criativa, avaliação

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