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Alunas do Amapá aliam química e ciência forense em pesquisa sobre feminicídio

Alunas do ensino médio técnico do IFAP (Instituto Federal do Amapá) simulam um crime em um ponto turístico da cidade para coletar amostras de solo e estudar evidências

por Lidia Dely Alves de Sousa ilustração relógio 29 de novembro de 2024

Em 2024, o curso técnico em Mineração, oferecido para a turma do primeiro ano do ensino médio no IFAP (Instituto Federal do Amapá), começou de uma maneira diferente. Um perito criminal foi convidado para uma palestra sobre geologia forense, área que contribui para investigações criminais. Ele explicou como a mineração e as técnicas de caracterização de solos se conectam à análise de evidências.

O tema despertou o interesse das alunas, que decidiram conectar a ciência forense à questão do feminicídio (assassinato de mulheres motivado por violência de gênero). Dados do UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime) revelam que apenas 8% dos homicídios no Brasil são solucionados, enquanto nos Estados Unidos esse índice é de 65%. A edição mais recente do relatório mundial também aponta que, a cada 10 minutos, uma mulher é vítima de feminicídio, seja por parceiros íntimos ou membros da própria família.

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Diante da baixa resolução de casos, muitas vezes pela falta de evidências materiais, decidimos criar o projeto “Análise de solo em locais de crime: feminicídio”. Contamos com o apoio das professoras Rosinete Cardoso (Geografia) e Indyhaia Favacho (Geologia) ao longo da atividade.

Como funciona a investigação?

Segundo reportagem da Revista Fapesp, a análise de solos em investigações criminais não é uma prática recente, mas evoluiu muito nas últimas décadas. Há relatos de que os romanos já utilizavam métodos rudimentares dessa ciência, como a inspeção dos cascos de cavalos para determinar sua origem. O primeiro caso documentado dessa técnica ocorreu em abril de 1856, na Prússia.

Traços de solo encontrados em pneus, sapatos e utensílios são fundamentais para ligar suspeitos a cenas de crime. No caso do feminicídio, essas evidências podem ser essenciais quando outros vestígios estão ausentes ou comprometidos. Assim, o projeto buscou desenvolver métodos mais precisos voltados à coleta e análise de solos.

Confira a explicação das alunas

Passo a passo do projeto

Com base na metodologia de aprendizagem baseada em projetos, conectamos ciências à temática do feminicídio. O protagonismo das alunas, que se interessaram em compreender melhor o tema, marcou toda a atividade.

O primeiro passo foi realizar uma pesquisa bibliográfica sobre feminicídio e caracterização de solos em locais de crimes, fornecendo às alunas a base teórica necessária para as atividades práticas.

A seguir, simulamos uma ocorrência de feminicídio. Criamos uma boneca de pano com o peso e as proporções de uma mulher adulta, de 1,70 m, representando a vítima. Nós a vestimos, colocamos tênis e peruca loira, e desenhamos expressões faciais. As mãos foram confeccionadas com luvas e tecido, além de unhas postiças. A cabeça, moldada em tecido e preenchida com espuma de travesseiro.

O local do crime seria o Distrito da Fazendinha, a 17 km de Macapá, mas o “corpo” foi encontrado no Trapiche Eliezer Levy, ponto turístico de Macapá. No trapiche, as alunas coletaram sedimentos e amostras de solo, além de demarcar a área com placas e números.

A simulação contou com a participação dos peritos criminais da Politec (Polícia Científica do Estado do Amapá), garantindo a integridade do processo.

Coleta do solo

Amostras de solo foram colocadas na boneca para simular as evidências encontradas no corpo da vítima. O solo foi inserido nos bolsos, na bolsa, nos sapatos e nas unhas, representando vestígios transferidos durante o ataque.

Embora esse tipo de análise não seja realizado no estado do Amapá, a colaboração da Politec foi essencial, despertando a curiosidade das alunas e destacando o protagonismo juvenil do projeto.

Análise científica

De volta à escola, analisamos as amostras de solo por meio de diversas técnicas químicas para identificar suas características específicas:

  • Análise mineralógica por difração de raios-X: para identificar os minerais presentes no solo.
  • Análise química por fluorescência de raios-X: para identificar a composição química dos solos e os elementos encontrados nos locais do crime.
  • Análise do tamanho de partículas por granulometria a laser: para examinar o tamanho das partículas e ajudar a distinguir solos de diferentes regiões.

Resultados alcançados

A pesquisa revelou que os solos da Fazendinha, com características arenosas, e os da orla de Macapá, com solo argiloso, apresentaram variações significativas. As análises também mostraram diferenças no tamanho das partículas e nos elementos químicos encontrados nas amostras, evidenciando a eficácia do método para investigações reais.

Além dos aspectos científicos, o projeto incentivou reflexões sobre a prevenção e o combate à violência contra a mulher. Essas alunos, com apenas 15 anos de idade, participaram de eventos regionais e nacionais, receberam destaque na televisão local e conquistaram prêmios. O processo foi registrado detalhadamente em um relatório.

Graças à repercussão, as alunas se inscreveram no edital de bolsas de pesquisa do IFAP e foram selecionadas para ampliar o projeto em 2025.


Lidia Dely Alves de Sousa

Formada em Tecnologia em Materiais pelo IFRN (2007) e com mestrado em Engenharia Mineral pela Universidade Federal de Pernambuco (2012), é atualmente professora efetiva no Instituto Federal do Amapá. Atua principalmente nas áreas de caracterização de resíduos, recuperação ambiental, tratamento de água, rejeitos de caulim e granito, massa cerâmica, hidroxiapatita e floculantes naturais.

TAGS

aprendizagem baseada em projetos, educação mão na massa, Prêmio Professor Porvir 2024

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