Como combater boatos sobre ataques às escolas
Especialistas ouvidos pelo Porvir orientam como lidar com notícias falsas que vem amedrontando a comunidade escolar
por Ana Luísa D'Maschio / Marina Lopes 12 de abril de 2023
Circulam pelas redes sociais, especialmente pelo WhatsApp, uma série de boatos com novas ameaças de ataques às escolas, disseminando medo e insegurança entre a comunidade escolar. Quem cria esse tipo de material quer ganhar notoriedade e causar mais pânico em um momento sensível, de recentes episódios de violência.
Não compartilhar boatos sobre ataques é um passo importante para evitar a generalização desse discurso. Sérgio Lüdtke, editor-chefe do Projeto Comprova, alerta: “Não dê visibilidade. Jamais compartilhe esse tipo de conteúdo, mesmo como alerta. A popularidade de uma ameaça ou a notoriedade do ameaçador é um prêmio para esses sujeitos.”
Em muitos casos, as pessoas compartilham esse conteúdo na intenção de alertar conhecidos e familiares, mas acabam contribuindo com a estratégia de disseminação de boatos e desinformações. “O medo faz a gente ser manipulado”, afirma o educador e jornalista Alexandre Le Voci Sayad, diretor da ZeitGeist e co-chairman da UNESCO MIL Alliance.
Ele explica que esses conteúdos se espalham com velocidade pelas redes sociais porque se conectam com medos e geram identificação entre o público. “A propaganda já usava de uma tática que hoje é muito empregada, voluntariamente ou involuntariamente, nas redes sociais para essa disseminação rápida. Ela é conhecida academicamente como viés de confirmação, que é você criar adesão, acreditar e se engajar em uma notícia pelo emocional”, analisa Alexandre.
“Em uma situação em que o medo está fora de controle porque as fontes de informação são muitas, há um excesso com fake news e boatos, então o medo ajuda na disseminação. É como se você olhasse para aquele post ou para aquela notícia e, como ela dialoga com um universo que é teu (escola) e uma situação que tua (alunos emocionalmente alterados), aquilo vai criar adesão e engajamento imediato pelo viés de confirmação.”
Alexandre também alerta: “O fato de a gente combater a desinformação não significa negligenciar a segurança. São duas coisas que caminham juntas. Precisamos estar atentos, mas não podemos transformar um drama em uma nova tragédia”, pontua.
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Caminhos a seguir
Retomar os princípios da educação midiática é o caminho que todos podem seguir. “É preciso verificar a fonte da informação. Aquele conteúdo vem de uma fonte diretamente para você ou foi compartilhado por outras pessoas? Se a notícia compartilhada tem uma fonte, é preciso checar se é verdadeira e se existe credibilidade”, sugere o educador.
E mesmo em situações que a notícia está publicada em um site de boa reputação, Alexandre afirma que convém olhar para o contexto. “Se a gente só multiplica, por mais que a notícia seja confiável, você está alimentando um princípio da falsa proporcionalidade. Você está tornando um fato isolado em um fato geral. Quem vê pode pensar que nesse momento 50% das escolas do Brasil estão sendo vítimas de violência. Não está acontecendo isso.”
Para o educador, esse conjunto de ações vai além de um bom comportamento online e tem também um papel restaurador. “Precisamos ficar atentos para garantir o exercício do papel social da escola, que é muito importante. E também o papel de acolhimento para que os alunos se sintam seguros em ir, e os pais se sintam confiantes em deixar os filhos nas escolas. “
De acordo com Mariana Ochs, coordenadora do programa EducaMídia, programa que capacita professores para a educação midiática, ações reativas e pontuais, como aumento de policiamento, são precárias e ineficazes a longo prazo, podendo inclusive escalar o pânico e a desinformação. “Não basta ampliar o policiamento e nem podemos olhar para as questões de violência de forma disciplinar. É preciso incorporar à cultura da escola a valorização de um ambiente acolhedor e saudável dentro e fora da internet.”
Mariana lista alguns pontos a serem observados. “É preciso falar sobre um contínuo que começa com o uso de retórica violenta nos grupos e redes sociais e acaba em violência real; de ambientes online que criam câmaras de eco e reforçam comportamentos doentios; de um consumo saudável de mídia, evitando a exposição a um ciclo de notícias 24 x 7 que gera ansiedade”.
A coordenadora do EducaMídia reforça a postura correta da imprensa que decidiu não expor os criminosos. Outro ponto importante destacado por ela é a necessidade de reconhecer e acolher quem tem dificuldades emocionais ou sociais, para que não precisem buscar aceitação em grupos marginais. “É preciso entender que essa não é uma questão disciplinar, o que coloca a responsabilidade em um comportamento individual, mas sim curricular – o que nos força a olhar para o ambiente social e tomar medidas sistêmicas para construir uma cultura de paz”, comenta.
Canais de denúncia |
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Devido aos recentes ataques às escolas brasileiras, o Ministério da Justiça e Segurança Pública deu início, em 6 de abril, à Operação Escola Segura. O objetivo do programa é realizar ações preventivas, envolvendo delegacias contra crimes cibernéticos. Um canal online, exclusivo para denúncias, está disponível: qualquer pessoa pode enviar informações, de maneira anônima, que serão mantidas sob sigilo. É preciso inserir o maior número de informações para que a ocorrência possa ser analisada corretamente. Além de informar a página da internet da postagem, recomenda-se o preenchimento do campo comentário, com informações relevantes, como o município, estado, escola envolvida com a denúncia e mídia social de origem. |
Anúncio do governo federal
Nesta quarta-feira, 12, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou em suas redes sociais que as escolas precisam de professores valorizados e alunos bem acolhidos e acompanhados. “É preciso dar um basta aos disseminadores da violência, que encontram terreno fértil para multiplicação através de redes sociais sem regras, e que precisam assumir suas responsabilidades. E identificar e punir, dentro da lei, os que propagam essa violência”, escreveu.
O ministro da Justiça, Flavio Dino, também apresentou nesta quarta-feira medidas para apurar a responsabilidade das plataformas virtuais na disseminação de ameaças às escolas. Segundo Dino, cerca de mil perfis que divulgam possibilidades de ataque já foram identificados. E se as redes não retirarem tais conteúdos do ar, podem ser punidas.
“A Secretaria Nacional do Consumidor vai instaurar imediatamente processos administrativos para apuração de responsabilidade de cada empresa. Nós temos dois caminhos que nós vamos adotar concomitantemente: de um lado, sanções administrativas que podem chegar à suspensão da atividade da empresa. E, no caso de descumprimento, poderíamos chegar ao limite do banimento”, explicou o ministro. “A liberdade de expressão, deixar claro que ela não é incondicionada, ela é subalterna a outros princípios constitucionais.”
O que fazer diante das ameaças?
Os especialistas ouvidos pelo Porvir dão as seguintes orientações:
- Jamais interaja com contas que disseminam esse tipo de conteúdo nas redes sociais. Mesmo um clique na imagem para vê-la com melhor definição é uma sinalização ao algoritmo do interesse que aquele conteúdo provoca. E, com esse entendimento, ele pode amplificar a postagem, distribuindo-a para mais usuários.
- Não dissemine conteúdos via WhatsApp. Ao receber uma mensagem de ameaça às escolas, não compartilhe.
- Denuncie o perfil ou o grupo que fez a publicação em outras redes sociais. O canal da Operação Escola Segura é o caminho oficial para investigações.
- Redes como Facebook, Instagram, Twitter, WhatsApp, TikTok, Kwai, YouTube contam com canais de denúncia. Clique aqui para conferir detalhadamente como fazê-las.
- Se a escola puder ser identificada, faça uma captura de tela e alerte a escola por um canal privado (um e-mail, por exemplo).
- Não envolva crianças na averiguação da denúncia.