Como os jovens estão transformando a educação?
A equipe do Imagina na Copa fala sobre a tarefa de mapear jovens brasileiros e seus projetos para inovar dentro e fora da sala de aula
por Fernanda Cabral 27 de junho de 2013
No final de março, o Imagina na Copa em parceria com o Porvir fez uma campanha em sua rede para descobrir quem são os alunos que estão transformando a educação no Brasil. Muito mais do que conhecer bons projetos em andamentos nas escolas, nosso foco estava em projetos idealizados e executados pelos próprios alunos. Durante a campanha, pessoas que conheciam estes alunos e os próprios alunos indicaram projetos que estão influenciando o ambiente escolar, inovando e provocando mudanças na forma de fazer e pensar educação no país.
É fato que os alunos estão preocupados com a educação e têm empreendido nesse campo. Como resultado, recebemos indicações de jovens de 12 a 29 anos de idade, de diversos cantos do país. Os projetos têm relativa diversidade e nos informaram um pouco sobre a natureza do que têm feito por estes alunos transformadores.
Também nos chama a atenção para um ponto importante: quando se trata de transformar a educação no seu próprio ambiente escolar influenciando seu próprio aprendizado, os alunos são pouco inovadores e têm ações pouco expressivas. O que nos leva à pergunta: por que isso acontece?
Sobre os projetos que recebemos
Qualificamos as indicações recebidas em 5 grupos:
Empreendimentos sociais ligados à educação;
Iniciativas que transformam a educação de outros alunos;
Iniciativas em que o aluno utiliza seu conhecimento para transformar outras coisas, diferentes de educação;
Iniciativas que transformam o ambiente escolar onde estão inseridos;
Atividades pontuais.
Como é característico dessa geração de jovens, algumas indicações eram de empreendimentos sociais ligados à educação. Por meio dessas iniciativas, os jovens não só inovam na forma de pensar os processos de aprendizagem, com aulas on-line, games, cursos intensivos e rápidos de temas “que não se aprendem na escola”, como também inovam em novos tipos de negócio e sua própria atuação profissional. Mesmo que algumas das ideias sejam incipientes, comprovam que empreendimentos sociais são uma tendência e a educação pode ser um campo frutífero. Destacam-se o Calcule Mais, o Ynovação e o Quiron.
Algumas das indicações tinham pouco poder de transformação da educação, seja por se tratarem de iniciativas em que os alunos usam seu conhecimento para provocar mudanças em outras áreas, seja por se tratarem de ações bastante pontuais. Nesse grupo, destacam-se as experimentações que os alunos fazem no contexto de uma matéria que compõe sua grade curricular, como o estudante de moda que criou uma coleção de roupas voltada para jovens com deficiência intelectual e os estudantes de jornalismo que desenvolveriam a comunicação de uma ONG ligada à saúde e uma plataforma para catalogar os trabalhos desenvolvidos pelos alunos durante a graduação. As ações pontuais estavam mais ligadas ao ambiente escolar, como a iniciativa de um aluno em substituir o diário de classe de papel por um diário eletrônico e a formação de grupos de estudo para suporte dos próprios alunos.
Foi interessante observar que a maior parte das indicações de projetos que buscavam transformar a educação são iniciativas em que os jovens usam o conhecimento que possuem para transformar a educação de outras pessoas. Nesse caso, usam o que aprenderam no ambiente escolar em que estão inseridos no desenvolvimento de outros alunos que de alguma forma não têm acesso a esse mesmo conhecimento. Como exemplo, estão os universitários estudantes de computação que levam conhecimentos básicos de programação a alunos de ensino médio, universitários de diversas formações que atuam como professores voluntários de cursos de inglês, de preparação para Enem e cursos para pessoas com necessidades especiais, e também alunos de ensino médio que levam aulas de direito e cidadania para outras escolas da região que não contam com essas disciplinas em sua grade tradicional.
Entre as iniciativas em que os alunos transformam o ambiente escolar em que estão inseridos e sua própria forma de aprendizagem, há pouca inovação. Aqui, as indicações giraram em torno de criação de grupos acadêmicos como atléticas e centros estudantis, aproximação da faculdade com o mercado de trabalho através de estruturas como empresas juniores, criação de novas matérias para compor a grade de aulas da faculdade e até inclusão de simulados de provas que os alunos prestarão no futuro. Sem dúvida são ações importantes e que podem trazer melhorias significativas para os alunos que dela se beneficiam, porém, tratam-se de coisas que já vimos parecidas em outros lugares – parecem mais uma iniciativa dos alunos de suprir o que consideram um possível déficit da escola e universidade onde estudam do que de fato a criação de algo novo e significativo com potencial de transformar a educação.
Daí, então, é que uma dúvida paira no ar:
Por que os alunos ainda pouco influenciam seu próprio aprendizado?
Para Eduardo Shimahara, o “Shima”, educador e um dos idealizadores do projeto Volta ao Mundo em 12 Escolas, que estuda novos modelos de educação ao redor do mundo, os motivos são muitos, mas destaca: “O principal deles é se de fato [os alunos] se perguntam se deveriam ser educados, numa escola, por exemplo. Na experiência que tive como professor em Universidades, tive mais de 300 alunos e menos de 2% deles sabia por que estava ali e por que tinha escolhido aquele curso.” Shima sabe que este número é impressionantemente baixo e completa “grande parte deles apenas estava lá porque “achavam que precisavam, porque achavam que iam fazer mais grana com aquilo”.
A perspectiva de Shima chama a atenção para um fato que por vezes ignoramos: a motivação dos alunos em empreender projetos está ligada ao valor que atribuem àquele conhecimento.
Quando se trata de os alunos criarem projetos em que utilizam seu conhecimento para transformar a educação de outras pessoas, a motivação é mais clara: está associada a compartilhar o que sabem e de alguma forma retribuir a oportunidade que tiveram. Por mais diversos que sejam os perfis destes alunos e suas formas de atuação, os projetos surgem do entendimento do valor que estes conhecimentos têm para suas próprias vidas. Reconhecendo como estes conhecimentos adquiridos podem ter contribuído para chegarem onde estão e para suas conquistas, surge neste alunos o desejo de multiplicá-lo.
Neste caso, olham pra trás, têm a evidência da importância desse conhecimento e criam projetos para levá-los a outras pessoas.
Quando estão, porém, inseridos no ambiente de aprendizado e não sabem o porquê de estarem ali e o que farão com aquilo, a motivação para influenciar a forma como esse aprendizado acontece deve cair drasticamente. Ao contrário de quando trabalham para influenciar a educação de outros, olham para frente e não sabem o que está por vir. Assim, ao navegar por campos ainda desconhecidos e estarem eles próprios não na condição de professores, mas de aprendizes, é mais fácil reproduzir modelos já existentes e que lhe parecem bem sucedidos.
Para Shima, o fato de que muitos alunos seguem apenas reproduzindo um modelo de educação, sem questioná-lo, “é uma triste constatação, mas pra mim é isso… É uma crise de sonhos”.
Assim, propomos:
Antes de esperar que estes alunos influenciem e inovem no seu próprio processo de aprendizagem talvez seja importante conectá-los com o próprio ato de aprender. O que estão fazendo ali? Por que isso é importante para eles? Qual sua conexão com esses temas? O que gostariam de fazer com esse conhecimento? E a partir dessas e outras questões, estimular o pensamento crítico e criativo: de que outras formas você poderia alcançar estes objetivos? Como pode trazer mais dos seus interesses para este ambiente de aprendizagem e aproximar mais este ambiente do seu universo? Como trazer o novo? Como influenciar processos?
Pode ser um caminho para que mais projetos surjam em que o aluno seja transformador no seu papel de aluno. Hoje, observando o volume e a diversidade de indicações de projetos focados na educação de outras pessoas que recebemos, arriscamos dizer: para o aluno, é mais fácil inovar sendo professor.
Fernanda Cabral
Mineira de Ipatinga, é publicitária de formação, designer-pesquisadora de coração e tagarela de nascença. É também co-fundadora do Imagina na Copa, um projeto de mobilização de jovens para promover transformações sociais.