‘Empolgação dos alunos autores me motivou a seguir’
No Diário de Inovações, professora que incentivou alunos a criarem jogos conta dilemas e satisfações de trabalhar de forma inovadora
por Gislaine Munhoz 14 de outubro de 2014
Enquanto aluna, tive muitas dificuldades com o modelo de ensino decorativo e tradicional e percebia que meu aprendizado era muito mais efetivo em momentos nos quais podia opinar, participar, ser protagonista juntamente com meus colegas. Sendo assim, ao me tornar professora, fui, paulatinamente, adotando uma postura mais aberta e na qual os alunos pudessem ser ativos no processo de aprendizagem. Quando assumi o laboratório de informática na escola em que trabalho, percebi ali um espaço privilegiado para dar voz a meus alunos e também aos meus colegas professores, procurando sempre me pautar por um trabalho colaborativo e coletivo com meus pares para sanar dificuldades e lacunas de aprendizagem dos alunos.
Ao utilizar jogos digitais e games, percebi que este recurso impactava na motivação e aprendizado de forma muito mais eficaz do que em outros contextos. Sendo assim, e levando em conta demandas e necessidades, decidi conversar com os alunos monitores do laboratório para que juntos pudéssemos criar jogos para as aulas de alfabetização, e a ideia foi muito bem aceita por eles.
Em princípio, foram criados jogos simples, muito semelhantes a atividades educativas. No entanto, logo percebi que eles poderiam avançar muito mais e apresentei duas ferramentas: o software de apresentação Power Point e a linguagem de programação Scratch. Me deparei neste momento com um outro universo, no qual fui convidada a emergir de maneira muito satisfatória e alegre. Para construir os jogos, os alunos começaram a me apresentar as séries e desenhos a que assistem, os games que gostam de jogar, me contando seus enredos e histórias. Percebi o quão rico era esse material que os alunos estavam apresentando e o potencial que existia nele, o que me fez pensar o quanto a escola ignora esse universo e quão rico seria se ele fosse inserido em nossas práticas.
Por me deparar com um contexto rico, porém novo, me vi muitas vezes insegura e perguntando “será que estou fazendo a coisa certa?”, “será este o caminho?”, “como meus colegas encarariam os alunos como autores de conteúdo?”. Eram questões que me instigavam, mas muitas vezes me afligiam. Mas enfim, a empolgação dos alunos autores de jogos, o impacto nos outros alunos que usavam os jogos e o retorno positivo de meus colegas me motivavam a seguir em frente, pesquisar e buscar soluções para dar cada vez mais suporte e aportes para os alunos envolvidos no projeto. Mais tarde, me dei conta de que trabalhar de forma inovadora traz em si essas angústias e dilemas.
Quando descobrimos a linguagem de programação Scratch e percebemos as possibilidades de interação e colaboração que a plataforma nos proporciona, tivemos a oportunidade de repensar com os alunos novas formas de criar jogos, estruturas e propostas. A partir daquele momento, o projeto ganhou outra proporção. Foi uma grata surpresa quando uma de minhas alunas, a Karina, então com apenas 11 anos, juntamente com seu grupo, me perguntou por que não poderíamos disponibilizar o conteúdo que estávamos produzindo num site. Achei a ideia muito interessante, mas mais uma vez dúvidas e questionamentos sobre se o caminho estava certo me fizeram hesitar. No entanto, como as crianças e adolescentes são muito mais ousados, pragmáticos e destemidos que nós, logo todo o nosso conteúdo estava no ar. Assim, florescia uma semente plantada há algum tempo, o projeto Jogos do Riva: elaboração de jogos digitais por alunos de uma escola pública de São Paulo.
Em outubro de 2013, fui um dos quatro professores escolhidos no Prêmio Educadores da Microsoft para representar o Brasil em Barcelona, na Espanha, em 2014. O prêmio foi um divisor de águas na minha carreira e me fez repensar o quanto podemos ousar, quantas oportunidades podemos criar para nossos alunos e o quanto podemos e temos a fazer pela educação no país. Temos um potencial pessoal e também em nossas mãos no qual é preciso acreditar. Pois sim, pode parecer frase comum, mas fazemos a diferença, principalmente quando lecionar é uma satisfação. Este é meu caso!
Gislaine Munhoz
Gislaine Munhoz é professora da Escola Municipal Professor Rivadavia Marques Junior, em São Paulo. Ela desenvolveu o Projeto Jogos do Riva, incentivando a autonomia e protagonismo infanto-juvenil com a inserção do universo dos games no cotidiano da escola. O projeto impacta cerca de 20 alunos, do 1o ao 9o ano do ensino fundamental, e atinge 450 usuários dos jogos. Em 2013 ela foi selecionada no Prêmio Educadores da Microsoft.