Políticas públicas de matemática precisam da voz dos professores, afirma secretária do MEC
Em entrevista ao Porvir, a secretária de Educação Básica do MEC, Kátia Schweickardt, comenta o projeto de escuta nacional, que busca entender as opiniões dos professores de matemática e vai até 28 de março
por Ruam Oliveira 19 de março de 2025
Para desenvolver novas estratégias de melhoria nos índices de aprendizagem em matemática e criar políticas públicas, o governo federal está realizando um projeto para ouvir educadores que ensinam esse disciplina até o próximo dia 28 de março.
📳 Inscreva-se no canal do Porvir no WhatsApp para receber nossas novidades
A Escuta Nacional de Professores que Ensinam Matemática quer alcançar os 600 mil profissionais que se enquadram nesse segmento e atuam em diferentes etapas: fundamental (anos iniciais e finais), médio e educação profissional e tecnológica de nível médio das escolas públicas brasileiras. O Porvir é parceiro técnico da iniciativa. Confira o guia de apoio para preencher o questionário e mais detalhes do programa na nossa reportagem.
“Os professores de matemática trazem uma série de questões e uma formação muitas vezes diferente da dos demais professores de educação, porque muitos não fizeram pedagogia, especialmente a partir do 6º ano”, explica a secretária de Educação Básica do MEC (Ministério da Educação), Kátia Schweickardt. O Porvir a entrevistou durante o evento “Educação Já”, promovido em São Paulo pelo Todos pela Educação.
Os índices de aprendizagem em matemática no país são preocupantes. O Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), de 2021, apontou que somente 37% dos estudantes de 5º ano atingem o nível esperado de aprendizagem de matemática e apenas 5% dos estudantes concluem o ensino médio com uma aprendizagem adequada.
Kátia destaca que a formulação de políticas públicas na educação precisa estar baseada nas experiências e reflexões dos educadores no contexto escolar, no dia a dia da escola. “Não é possível fazer política pública no ambiente democrático sem escutar os sujeitos que são aqueles que fazem a política”, afirma.
Confira abaixo a entrevista:
Porvir: O MEC está desenvolvendo uma escuta com professores que ensinam matemática. Qual a importância dessa iniciativa?

Kátia Schweickardt: Os principais mediadores de progresso de aprendizagem significativa no chão das escolas são os professores. Quando falta uma série de recursos, o seu principal ativo são as pessoas. E a educação é feita, principalmente, por professores e alunos. Então, escutar os estudantes, como nós fizemos na Escola das Adolescências, e agora ouvir os professores para o desenho de uma política, é fundamental. Os professores de matemática trazem uma série de questões e uma formação muitas vezes diferente da dos professores de educação, porque muitos não fizeram pedagogia, especialmente a partir do 6º ano.
Porvir: Poderia exemplificar?
Kátia Schweickardt: Os educadores têm também experiência fundamental que a gente precisa incorporar na definição dessa política, na priorização curricular para cada etapa. Desde que a nova gestão assumiu o Ministério da Educação (em 2023, com o início do mandato do presidente Lula), as políticas de educação básica estão sendo desenhadas a muitas mãos, ouvindo os entes subnacionais, prefeitos, secretários e também gestores escolares, professores e os estudantes. Não é possível fazer política pública no ambiente democrático sem escutar os sujeitos que fazem a política.
Porvir: Como o MEC pretende usar os dados extraídos dessa escuta?
Kátia Schweickardt: Estamos trabalhando com vários parceiros, o Porvir é um deles. São especialistas, professores de universidades, alunos, outros secretários… Vamos organizar esse material para, a partir dessa experiência, entender como articulamos a visão dos professores com os componentes curriculares, com a gestão das escolas e das secretarias, entre outros pontos,para estabelecer guias e orientações. Também organizaremos formações, principalmente para professores, voltadas para suas principais lacunas, aproveitando sua experiência e potência. Há muita coisa boa acontecendo no chão das escolas, por vezes invisibilizadas, que é preciso incluir na política pública.
Porvir: Em relação à formação inicial de professores que ensinam matemática, quais ainda são os principais gargalos?
Kátia Schweickardt: Existem muitas lacunas na formação inicial. Eu tenho muita dificuldade em falar de questões gerais, pois o Brasil é muito diverso e desigual. a Hierarquicamente, pensa-se como se o melhor conhecimento fosse produzido no Sul ou Sudeste do país e não é verdade. Desfazer essa mentalidade colonialista que temos internamente no Brasil, especialmente em relação às regiões, é um primeiro passo.
A formação tem que traduzir isso, precisa revelar a potência do que é produzido em comunidades indígenas, quilombolas, em escolas com salas multisseriadas. Há práticas muito boas. Às vezes, a gente pensa que só aquela sala com a melhor infraestrutura, com o professor que estudou nas melhores universidades do Brasil e do mundo, ensina melhor. Isso não é verdade.
Leia também
MEC escuta mais de 2 milhões de adolescentes para lançar nova política
MEC quer ouvir 600 mil professores que ensinam matemática no Brasil
12 dicas para aproximar a matemática do dia a dia
Porvir: O que deve ser produzido?
Kátia Schweickardt: Nossa expectativa é a partir disso fazer jornadas e trilhas formativas para que cada professor, a partir do seu próprio diagnóstico, possa organizar processos formativos individuais e coletivos. Também pretendemos orientaras redes para que façam esse trabalho em parceria com as universidades..
Para apoiar a mobilização para a escuta, um guia traz os principais pontos que vão nortear a iniciativa. “Essa escuta é um passo para a construção da garantia da aprendizagem adequada para todos os estudantes da educação básica. Por isso, é muito importante que todos os professores que ensinam matemática nas escolas públicas se engajem na mobilização”, destacou Tatiana Klix, diretora do Instituto Porvir, durante o webinário. O Porvir é parceiro técnico da iniciativa. |
Porvir: Qual o papel das lideranças escolares nesse processo de escuta e como elas também podem contribuir com o aperfeiçoamento do ensino de matemática?
Kátia Schweickardt: A liderança escolar é fundamental para tudo, não só para essa escuta. Eu fui secretária de Educação há muitos anos em Manaus (AM) e estou convencida de que de todas as variáveis impactam muito os resultados dos estudantes. Os gestores escolares podem contribuir muito, sobretudo em cenários socialmente vulnerabilizados. Diretores são fonte de inspiração, de apoio aos professores. É preciso que tenham uma escuta atenta, façam a mediação também com as comunidades, com o território. Isso fortalece o que é feito na sala de aula e na escola.
Porvir: Como essa mobilização pode se refletir na Escuta Nacional?
Kátia Schweickardt: É muito importante contar com os gestores escolares para mobilizar os professores e a comunidade escolar para participar ativamente dessa escuta, contribuir com a sua experiência e levantar os pontos críticos. Devemos motivar os gestores a cada vez mais trazerem seus professores para pensar as políticas, para agir sobre o seu território. É preciso apoiar os educadores não só na gestão administrativa, mas também na gestão pedagógica das escolas.