Professor usa a arte para refletir sobre bullying, suicídio e violência - PORVIR
Crédito: Arquivo Pessoal / Emanuel Coringa

Diário de Inovações

Professor usa a arte para refletir sobre bullying, suicídio e violência

Vencedor do prêmio Arte na Escola, educador de Pau dos Ferros (RN) conta como desenvolveu percurso artístico dos estudantes a partir de problemas do entorno

por Emanuel Coringa (Emanuel Alves Leite) ilustração relógio 24 de fevereiro de 2021

Quando comecei a trabalhar como professor de teatro do IFRN- Campus Pau dos Ferros, passei a refletir sobre diferentes maneiras de construir um percurso artístico/pedagógico sistematizado para os estudos das artes cênicas, unindo as problemáticas vividas pelo campus e pelo seu entorno.

Dentro dessa perspectiva, desenvolvi o projeto “Artes Cênicas: Pulando o Muro da Escola” com turmas do ensino médio técnico integrado, sendo cinco salas entre apicultura, informática e alimentos, no município de Pau dos Ferros/RN, semiárido do Rio Grande do Norte. Ao longo de duas aulas semanais durante o segundo semestre de 2018, promovemos uma ação integrada, interdisciplinar e de extensão comunitária que contou com o auxílio artístico/pedagógico das TICs – Tecnologias da Informação e Comunicação para criar intervenções artísticas sobre questões que envolvem bullying, suicídio e pressão psicológica, além de violência contra mulher, feminicídio e questões raciais.

O projeto teve início a partir do chamamento para uma conversa conjunta com o setor de psicologia da escola, que é parte integrante da assistência estudantil do campus, além de membros da equipe técnica pedagógica (ETEP). Nesse encontro, as equipes relatavam a existência de casos preocupantes de bullying, depressão e suicídio nas turmas onde eu atuaria como docente de Artes/Teatro.

Após a conversa, surgiu o seguinte questionamento: de que forma a arte pode atuar junto a equipe pedagógica nessas situações, sem perder seu caráter curricular, com seus conteúdos e conhecimentos específicos a serem desenvolvidos no ambiente de sala de aula? Passei a pensar sobre a performance e suas várias possibilidades de intervenções, que podem ser apresentadas nos mais diversos espaços.

Partimos, então, para os estudos teóricos/práticos do conteúdo performance e suas variantes: intervenção urbana, vídeo-performance. Além disso, trabalhamos alguns elementos estéticos que marcam essa forma artística: estranhamento, acontecimento, choque reflexivo, questionamentos artísticos e problemáticas individuais/coletivas.

A partir da discussão de assuntos apontados inicialmente pela ETEP e o setor de psicologia do campus, além de pautas trazidas pelos próprios estudantes, lançamos outra questão: “o que você gostaria de falar em discurso que poderia ser transformado em arte?”. Esse foi o guia para transformar o percurso de ensino e aprendizado semestral em um verdadeiro processo artístico.

A jornada de construção de performance com os estudantes se baseou em uma tríade: apreciação, contextualização e prática. Nesse percurso artístico/pedagógico teórico e prático, construímos conhecimentos ligados a elementos que compõem uma ação cênica – figurino, maquiagem, espaços cênicos e suas diversas possibilidades, dramaturgia (roteiro), edição de vídeos, produção e atuação performática.

Quando os estudantes começaram a escolher sobre quais temáticas seriam problematizadas através dos vídeos, performances e vídeo-performances elaboradas pelos discentes, o projeto começou a tomar proporções interdisciplinares, construindo relações diretas com a disciplina de sociologia, através de intervenções de seu respectivo professor, buscando ampliar e esclarecer questões ligadas principalmente às temáticas trazidas pelos discentes, violência contra mulher, feminicídio, e questões raciais.

Foi na etapa de produção dos trabalhos que encontramos o espaço propício e adequado para discutir, questionar e agir sobre os temas, agora apontados pelos alunos, onde alguns convergiam com as questões diagnosticadas pela equipe de psicologia do campus. Passamos, assim, a intervir através da arte em questões individuais/coletivas daqueles estudantes. As ações artísticas desenvolvidas agiram diretamente sobre as seguintes questões: bullying, suicídio e pressão psicológica, além de violência contra mulher, feminicídio, e questões raciais.

Ao final desse percurso, as ações performáticas foram apresentadas dentro e fora do espaço escolar, além dos vídeos que foram exibidas em eventos da instituição, e da formulação de contas nas mais diversas redes sociais como Facebook, Instagram, WhatsApp, Youtube, entre outros canais que foram utilizadas para a divulgação do projeto e de todo material artístico produzido na escola. No total, chegamos a aproximadamente 10 mil visualizações, encontrando na tecnologia, internet e redes sociais, ferramentas de auxílio para produção, discussão e desenvolvimento estético dos trabalhos artísticos produzidos no campus.

Com esse percurso, foi possível perceber que os alunos se engajam mais ao construir reflexões ativas e críticas que incentivam o seu protagonismo a partir de obras de artes. Principalmente quando seus projetos não ficam restritos ao cotidiano escolar e podem ser vistos e acessados pela comunidade.


Emanuel Coringa (Emanuel Alves Leite)

Palhaço, arteiro, professor de Teatro do IFRN- Campus Pau dos Ferros. Formado em Licenciatura em Teatropela (UFRN), Mestre em artes atravésdo Prof-Artes (UFRN), especialista em Literatura e Ensino pelo (IFRN). Membro do Movimento Escambo Popular Livre de Rua, da Cia. Arte e Riso, além de coordenador e encenador do grupo Arrelia de xepa. Pesquisa o universo da palhaçada brasileira e suas possíveis relações com o universo do sistema escolar de ensino em nível fundamental e médio. Além de escrever sobre seus processos artísticos/pedagógicos. Nesse percurso foi vencedor do prêmio "Educador Nota 10" 2014 com o projeto "Lugar de Circo é na Escola" experiência transformada em dissertação e livro, vencedor estadual do "Professores do Brasil" 2017 e do prêmio "Arte na Escola Cidadã" 2020.

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