Educador faz residência antes de atuar na rede pública
Em mestrado inspirado na medicina, professores fazem imersão em colégios de Boston com direito a tutores experientes
por Tatiana Klix 25 de março de 2013
Um programa que surgiu para resolver problemas do sistema público de educação de Boston, nos Estados Unidos, em 2003, já se tornou um modelo para a formação de professores em todo o país. O Boston Teacher Residency é inspirado nos treinamentos de residência médica e tinha como metas principais reduzir a rotatividade dos profissionais nas escolas da cidade e diversificar o perfil deles – enquanto 86% dos estudantes de Boston eram negros, 3 a cada 5 docentes eram brancos. Em 2012, os mais de 400 professores preparados pela pós-graduação comprovam o sucesso: a taxa de retenção depois de três anos nas escolas é de quase 90%, enquanto a média nacional é de 50%. E 49% dos formados são negros.
Além disso, outras carências da rede estão sendo supridas: 37% dos que passaram pela residência dão aulas de educação especial ou inglês como segunda língua e 55% ensinam matemática e ciências, todas especialidades que estavam em falta nas escolas.
“Quando o BTR (Boston Teacher Residency) foi criado, o objetivo era formar pessoas que realmente estivessem preparadas para trabalhar em Boston, que conhecessem as cidade e estivessem comprometidas com ela. O que esperávamos é que essas pessoas continuem trabalhando aqui por muitos anos”, explica o cofundador e diretor executivo desde 2011 do curso de pós-graduação, Jesse Solomon. Conforme o também professor, as escolas da cidade enfrentavam problemas comuns aos colégios públicos de grandes centros dos EUA, onde a maioria dos docentes é desconectada da realidade local e não tem subsídios para enfrentar as dificuldades de comunidades carentes. O resultado disso é que muitos acabavam desistindo de trabalhar.
Mas qual é o segredo da formação de Boston? Os principais diferenciais do programa, segundo o diretor, estão na prática (sempre aliada à teoria) e nos benefícios oferecidos para pessoas talentosas participarem do curso de 13 meses e, depois, ficarem pelo menos mais três anos nas escolas locais.
Após dois meses de curso intensivo nas férias (julho e agosto), os alunos do programa de pós-graduação passam – durante um ano inteiro – por uma imersão em uma escola pública, monitorados diariamente por um experiente tutor. Nesse período, apenas uma noite por semana e os dias de sexta-feira são reservados para aulas e seminários sobre teorias e pesquisas educacionais. Nesses momentos, os residentes são expostos a muita informação sobre a cidade para a qual estão sendo preparados a trabalhar, como o currículo escolar, a história, os problemas, o perfil dos alunos e das famílias.
O curso é puxado, porque além de exigir que o aluno ensine o dia todo, ainda demanda preparação de aulas, redação de artigos e envolvimento em projetos de pesquisa. “Nós sobrecarregamos o residente de propósito, para ele não se sentir sobrecarregado quando estrear na carreira”, diz Solomon.
Ao final deste primeiro ano, os alunos recebem um diploma de mestrado da Universidade de Massachusetts e assumem o compromisso de trabalhar por três anos na rede pública de Boston, período em que seguem recebendo suporte do BTR por meio de consultorias com profissionais experientes, cursos extras e a possibilidade de troca de experiências entre membros da comunidade de residentes.
Benefícios
Para atrair pessoas talentosas para o programa, outros diferenciais são a bolsa que os estudantes recebem de US$ 11.100 no primeiro ano e um empréstimo de US$ 10.000 para cobrir despesas gerais. Depois, para cada ano trabalhado, um terço do empréstimo é perdoado.
Tais atrativos permitem que o BTR seja bastante rigoroso na seleção dos 75 residentes que entram para a pós-graduação por ano. Em seu site, uma das primeiras informações disponíveis para quem quer se candidatar alerta que o mestrado recruta “indivíduos talentosos e comprometidos”, sejam eles recém-formados em faculdades ou profissionais que queiram trocar de profissão.
Os aspirantes a residentes, além de encaminhar cartas de apresentação, currículo, recomendações, são submetidos a um “dia de seleção”, quando fazem entrevistas, dão uma aula de cinco minutos, prestam uma avaliação escrita e participam de um exercício em grupo para solucionar um problema. “O recrutamento é um o primeiro pilar do programa”, segundo Solomon, que comemora os bons resultados que impactam na educação de mais de 20 mil crianças em Boston todos os dias e influenciaram outras redes de ensino dos EUA.
Em 2007, o BTR deu origem à rede UTRU (Urban Teacher Residency United), em conjunto com outros programas semelhantes de recrutamento e preparação de professores presentes em Boston, Chicago e Denver. O grupo divulga e dá suporte para cidades que querem implementar o modelo já presente em mais de 20 centros urbanos e apontado como uma solução para corrigir deficiências na formação dada nas faculdades para preparar mestres de alta qualidade.