Plataforma para gravar aula apoia criação de trilhas de formação continuada - PORVIR
Crédito: THANANIT/Fotolia

Inovações em Educação

Plataforma para gravar aula apoia criação de trilhas de formação continuada

Kanttum, ex-Reply4.me, evolui produto de gravação de atividades em sala de aula para facilitar trabalho de mentoria entre equipe pedagógica e professor

por Redação ilustração relógio 27 de março de 2018

Fundada em 2014 em Uberlândia (MG), a startup Kanttum – inicialmente chamada de Reply4.me – surgiu com a ideia de permitir que estudantes gravassem aulas para poder revê-las mais tarde. No entanto, logo identificou uma demanda que considerou mais significativa no campo da educação, voltada para recursos que ajudassem as instituições a avaliar seus professores e melhorar a qualidade das aulas a partir desses levantamentos. Assim, a jovem empresa mineira tomou um outro rumo: o da formação continuada de professores por meio da metodologia da observação de aulas.

Em vez de ser usada pelos alunos para rever lições, a solução criada pela startup passou a gravar as aulas para serem depois assistidas pelos professores, com o objetivo de eles mesmos se avaliarem e de serem avaliados pelos chamados mentores outros docentes ou coordenadores pedagógicos, a cargo da instituição que a utiliza. As funcionalidades já desenvolvidas, voltadas para a gravação de vídeos com possibilidade de fácil upload e de comentários, passaram a servir à nova função. Mas a empresa decidiu investir mais em recursos especificamente desenvolvidos para a formação de professores.

Assim, a solução digital ganhou um novo projeto, que gerou a plataforma TeachGrowth, em versões para dispositivos móveis e computadores. A principal inovação é que, em vez de oferecer apenas ferramentas separadas, ela permite a criação de trilhas de formação docente, de acordo com a necessidade de cada instituição, com etapas que vão sendo cumpridas e acompanhadas e poderão ser reiniciadas, de forma cíclica. As novas funcionalidades, criadas para somar às já existentes na Reply4.me, já foram aprovadas pelos clientes, e serão lançadas a partir de maio deste ano.

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O processo começa quando os professores gravam e fazem o upload das suas aulas para, então, assisti-las e rever os pontos em que obtiveram sucesso na exposição do tema, ou avaliar momentos que resultaram incerteza aos alunos e por isso não fluíram tão bem, por exemplo. A solução da Kanttum permite que, após a autorreflexão e o compartilhamento das aulas pelos professores, os mentores assistam também às gravações, avaliem as aulas e escrevam seus comentários, dando um retorno aos docentes na própria ferramenta. As mensagens são de texto, mas mensagens por áudio também serão possíveis. Como explica Pablo Sales, um dos fundadores da Kanttum, para o processo de formação é importante que a reflexão do professor seja feita primeiro, para que depois os coordenadores opinem também. Mas Pablo acredita que um dos grandes desafios é justamente tornar esse processo parte da cultura educacional no Brasil.

A partir de maio deste ano, a ferramenta da Kanttum irá transpor para o digital a rubrica – um documento que, como Pablo ressalta, é usado nos Estados Unidos dentro do contexto da formação de professores baseada na observação de aulas, por instituições que procuram pontuar os objetivos que desejam que seus professores persigam. A startup planeja lançar, ainda em maio, os relatórios de desenvolvimento docente, que permitirão o acompanhamento dos resultados do processo de formação. A mentoria via videoconferência está prevista para setembro. Também no segundo semestre entra no ar o review (revisão), que permitirá o reinício do ciclo formativo. As funcionalidades serão disponibilizadas de forma independente, para que as instituições que as adotarem possam compor com os recursos da maneira que considerarem mais adequada para montar seu programa de formação docente.

kanttumsiteCrédito: Reprodução

Selecionada pelo Programa de Especialização Docente

A Kanttum deu um passo importante quando, em 2015, foi selecionada para participar do programa de mentoria Start-Ed, da Fundação Lemann. Era a única empresa focada na formação de professores, entre as 200 que se candidataram. Durante seis meses, a equipe recebeu mentoria para aprender sobre formação docente, já que o assunto era então novo para o time. Ao fim do programa, já tinha como clientes os grupos Ânima e Eleva.

Em dezembro de 2016, a solução tecnológica da Kanttum foi selecionada pelo Centro Lemann em Stanford para ser a plataforma do PED (Programa de Especialização Docente Brasil. Trata-se de um programa voltado para o desenvolvimento profissional de professores baseado nos princípios e práticas do Stanford Teacher Program). Aqui no Brasil, em parceria com sete universidades localizadas em Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Paraná, o programa implantou uma pós-graduação lato sensu voltada para professores de matemática ativos em sala de aula.

A especialização é dividida em dez módulos. Ao final de cada um deles, a ideia é que os alunos levem os conhecimentos adquiridos no curso para as salas de aula em que trabalham. Para isso, gravam as suas aulas e compartilham os vídeos com os professores da pós – que atuam como mentores – e também com os outros alunos do curso. “O uso da ferramenta (da Kanttum) é aplicado na observação prática do aluno da pós-graduação em seu dia a dia, em seu local de trabalho”, conta Pablo, que relata também que ao fim de cada módulo ocorre uma sessão reflexiva em grupo, ocasião na qual os alunos compartilham trechos de suas aulas e discutem tanto as práticas bem-sucedidas como os pontos que precisam melhorar.

Doutoranda na Universidade de Stanford, a brasileira Barbara Born, que é também professora, trabalhou no desenho geral do currículo da especialização e, mais especificamente, nos desenhos dos módulos ligados a planejamento de currículo e avaliação para a aprendizagem. Atuou ainda no treinamento dos formadores responsáveis por implementar o programa nas universidades brasileiras. Ela conta como se deu a escolha pela solução da Kanttum. “Nós precisávamos de uma ferramenta que nos ajudasse a acompanhar a sala de aula, pois o mentor não tem condições de ir a múltiplas salas e fazer esse acompanhamento in loco”, explica, ressaltando que a utilidade da plataforma para o PED vai além de proporcionar a simples observação das aulas, já que consiste em um recurso com ênfase em uma perspectiva pedagógica.

No Brasil, é muito difícil o uso de vídeo na sala de aula porque as pessoas se sentem muito monitoradas

Dentre as características da plataforma, Barbara destaca uma que considera essencial: a possibilidade de o professor selecionar os momentos filmados que deseja compartilhar. “No Brasil, é muito difícil o uso de vídeo na sala de aula porque as pessoas se sentem muito monitoradas”, explica. Na opinião dela, a garantia da flexibilidade e da liberdade ao professor contribuiu, portanto, para que a solução encontrada pela Kanttum se mostrasse adequada às necessidades do modelo de educação que o PED propõe.

Rafael Ávila, diretor de Inovação do grupo Ânima, conta que parte dos professores do grupo já utilizam a solução da Kanttum para a formação continuada, por pertencerem a universidades envolvidas no PED. Mas o plano é que essas e as outras instituições pertencentes ao Ânima passem a utilizar esses recursos de forma estruturada, incluindo as novas funcionalidades da solução e seguindo um planejamento feito para evoluir a maneira como os seus professores são formados para dar aulas no ensino superior.

As ferramentas da Kanttum estão em sintonia com a mudança na cultura da formação docente que Rafael relata estar em andamento no Ânima. O foco para as universidades do grupo é a ideia do docente como mentor. Ele observa que os professores tendem a ter mais facilidade para promover mudanças quando os colegas os incentivam do que quando o impulso para determinada transformação parte da direção, por exemplo. Com isso em vista, o grupo aposta em oficinas de técnicas para a sala de aula e formação para a mentoria, e estimula que os professores troquem experiências entre si para se desenvolverem cada vez mais em sala de aula. “A ferramenta da Kanttum ajuda a potencializar e aumentar a escala desse processo de mentoria”, diz Rafael.

Ao ser questionado sobre uma possível resistência dos professores quanto a ter suas aulas gravadas e comentadas, Rafael comenta que os docentes têm se mostrado cada vez mais à vontade com o processo. Em decorrência de alguns deles estarem participando de uma formação para o ensino superior em parceria com um consórcio de universidades da Finlândia (conforme reportagem do Porvir), uma quebra de preconceitos vem sendo observada, e com isso os professores se mostram abertos a assistir e debater as suas aulas. A ideia é que a próxima turma a participar dessa capacitação utilize a plataforma da Kanttum para ajudar a formar novos docentes.

Neste momento, a startup fornece a sua solução a oito clientes, com seis mil professores utilizando as ferramentas. Por ano, cerca de dez mil aulas são gravadas e geram avaliações – a projeção é triplicar esse número em 2018. Na Kanttum, por enquanto, a maior parte do time é formada por profissionais de tecnologia e produto ou da área de negócios – marketing, vendas e afins. Apesar de a equipe ainda não ter uma área pedagógica, em função do crescimento vivido e da transição para o campo da formação continuada os fundadores já têm data para inaugurá-la, o que deve ocorrer em abril. O novo setor terá orçamento para realizar pesquisas que gerem informações sobre o impacto que a solução vem produzindo na educação – uma das maiores preocupações de seus criadores, como Pablo ressalta.


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aplicativos, competências para o século 21, empreendedorismo, formação continuada, personalização, tecnologia

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