Plataforma entende estratégias dos alunos
DreamBox, que oferece ambiente adaptativo de matemática até o 6o ano, chega a registrar 50.000 dados/aluno/hora
por Patrícia Gomes 3 de abril de 2013
Suponhamos que você, leitor, esteja no segundo ano do ensino fundamental e que a pessoa que escreve este texto também. Somos colegas de classe. Como se pode supor, você tem muito mais habilidade com números do que eu. Em dado momento, nos é dada a mesma tarefa: com blocos coloridos, cujos tamanhos variam de acordo com o número de unidades que agregam (o material dourado, lembra dele?) precisamos formar o número 37. Você pega três peças que valem 10 unidades, uma peça que vale 5 e duas que valem 1. De um jeito sofisticado para quem está no segundo ano, você formou o 37. Já eu, que não sou tão hábil quanto você, pego 37 unidades simples para formar o 37. Ambos completamos a atividade, mas usamos caminhos bem diferentes para tal.
Em uma aula tradicional, eu e você seguiríamos adiante, embora claramente não estejamos no mesmo nível de aprendizado. Em um ensino personalizado facilitado por plataformas adaptativas, porém, a proposta é outra. Como aprendemos de formas diferentes, nos seriam propostos caminhos adaptados às nossas necessidades. Você poderia seguir para exercícios de subtração e eu voltaria para consolidar o aprendizado de agrupamentos. Você não se sentiria entediado porque a lição é fácil demais para você nem eu me frustraria por não conseguir acompanhar o seu raciocínio. Cada um teria uma experiência de aprendizado bem específica e customizada para suas necessidades.
O exemplo acima foi dado por Jessie Woolley-Wilson, CEO da DreamBox, empresa norte-americana que disputa com a Knewton – que estará no Transformar, amanhã – o título de plataforma mais adaptativa do mundo. Voltada para o ensino da matemática da educação infantil ao 5o ano, a DreamBox tem 1.100 lições dispostas em atividades interativas. Ao iniciar na plataforma, os alunos escolhem um avatar que seguirá nas aventuras gamificadas disponíveis no ambiente on-line e que entrecruzam o conteúdo tradicional de conceitos matemáticos.
A disputa com a Knewton ocorre porque, mesmo que uma plataforma seja considerada adaptativa, ela pode apresentar maior ou menor grau de adaptabilidade, conforme a inteligência com a qual foi desenvolvida e o número de informações sobre o aluno que é capaz de considerar. A disputa por ser mais adaptativo implica em desenvolvimento contínuo do software a partir da observação em sala de aula. Quanto mais dessas informações ela souber interpretar, mais adaptativa é a plataforma. A DreamBox, por exemplo, é capaz de captar 50.000 informações por aluno em uma hora.
“A plataforma aprende sobre o aluno em cada clique que ele dá. Nós aprendemos com o aluno enquanto o aluno aprende”, diz Jessie, que completa: “Quanto mais tempo o aluno passa na plataforma, mais a plataforma aprende sobre ele”. Entre os fatores que o sistema leva em consideração estão, claro, fatores como se o aluno acertou ou errou a questão, o tempo que ele gastou para resolvê-la, se hesitou antes de acertar ou que tipo de erro ele teve antes de chegar, enfim, ao resultado correto. Mas além dessas informações que Jessie chama de “óbvias”, plataformas mais sofisticadas são capazes de identificar a estratégia que o aluno empregou para completar uma atividade, como no caso do agrupamento dos blocos dado há pouco.
Plataformas adaptativas são capazes ainda de entender que tipo de estímulo traz mais resultados para cada um. Voltemos ao nosso exemplo inicial. Como eu tenho mais dificuldade que você, talvez, antes de ser apresentada a exercícios de múltipla escolha, eu ainda precise praticar bastante com os materiais geométricos virtuais que a plataforma tem, ao passo que você não vê mais razão nisso e já está preparado para aprender com um game mais sofisticado. A plataforma tenta otimizar seu desempenho sugerindo atividades com vídeos, textos ou outros recursos, conforme você responda bem a eles.
Para os alunos, o benefício é claro. Ter exatamente o que se precisa faz com que as experiências de aprendizado sejam mais ricas, o conhecimento seja adquirido mais rapidamente e os alunos se sintam empoderados e responsáveis pelo que têm alcançado. Além disso, ressalta Jessie, o dia a dia do aluno fora da escola está imerso em tecnologia e, ao trazê-la para a educação, a escola está preparando seus alunos para o que vão ter de enfrentar no mundo. “Os alunos se sentem desafiados a continuar aprendendo”, diz ela.
Para o professor, a plataforma fornece dados que o ajudam a tomar decisões pedagógicas. Agora, diferentemente do que ocorria antes, os educadores não são mais os detentores da informação, mas os mediadores do aprendizado. Para escolas e sistemas escolares, os dados que a ferramenta disponibiliza os ajudam a traçar estratégias e a usar com mais chance de bons resultados os recursos que têm. “Os distritos [escolas públicas] estão cada vez com mais alunos por professor. A plataforma os ajuda a fazer mais com menos”, ressalta Jessie.
A DreamBox atua nos EUA e no Canadá e não tem previsão de começar a atuar no Brasil. Por aqui, esse tipo de ferramenta ainda é muito raro, apesar de algumas iniciativas já terem dado seu pontapé inicial – Geekie e QMágico, por exemplo, entraram de cabeça nesse desafio e ainda estão desenvolvendo e aprimorando seus produtos. Para o futuro, Jessie diz esperar que a DreamBox melhore sua adaptabilidade em matemática e comece a atuar em outras disciplinas. “Começamos por matemática provavelmente porque era o que os EUA mais precisavam, mas é possível expandir isso”, promete ela.