Sabático de 1 ano ajuda a ‘hackear’ a educação
Gap Year, criado por Dale Stephens, propõe currículo baseado em desenvolver habilidades necessárias para a vida real
por Patrícia Gomes 5 de julho de 2013
Alunos prestes a terminar o ensino médio, não raramente, passam por maus bocados para decidir o que estudar na universidade. Fazer a escolha também não significa que o incômodo passou, já que o estudante pode entrar na faculdade e descobrir que não era bem aquilo que esperava ou mesmo se desencantar com a universidade propriamente dita. Essa situação é tão comum, mas tão comum, que Dale Stephens, 21, ganhou notoriedade ao falar de seu descontentamento com o sistema educacional tradicional e lançou o movimento UnCollege. As discussões que o jovem promoveu tiveram tantos interessados e agregaram tanta gente que ele e sua equipe começam a oferecer, em agosto próximo, um programa de um ano, chamado Gap Year, voltado justamente para esse público.
“Começamos fazendo um programa de desescolarização de um fim de semana. Ficamos surpresos das redes que os participantes eram capazes de criar em tão pouco tempo”, disse Dale, que ouviu de um mentor a proposta de criar um programa de cinco anos baseado em sua ideia de estimular a meta aprendizagem – a habilidade de aprender a aprender. “Mas cinco anos é um quarto da minha vida! Achei muito. Mas aí desenvolvemos um programa de um ano, o Gap Year”, afirma o jovem, que esteve no Brasil nesta semana.
A primeira turma, que começa em agosto, terá 10 pessoas de oito nacionalidades diferentes, metade de egressos de ensino médio e metade de pessoas que abandonaram a faculdade e estão procurando novos rumos. Elas viverão juntas em uma casa em San Francisco durante o primeiro módulo do curso, que dura três meses e se destina a fazer com que os alunos se tornem aprendizes mais eficazes. O currículo dessa etapa se apoia em três pilares: 1) autodesenvolvimento, voltado a trabalhar habilidades que os alunos precisam aprender na vida, como a habilidade de se comunicar e promover seu próprio bem estar; 2) conhecimentos gerais, que traz uma seleção de assuntos que, nas palavras de Dale, “as pessoas esperam que você saiba”, como filosofia, história, cálculo e literatura; e 3) “hackademia”, uma brincadeira com as palavras “hacker” e “academia”, que são desafios práticos a serem completados a cada semana.
Assim, em uma das semanas, por exemplo, no autodesenvolvimento, os alunos deverão trabalhar sua habilidade de comunicação; nos conhecimentos gerais, estudarão música; na hackademia, o desafio prático é dar uma palestra. Em outra, os pilares se repetem, mas dessa vez os jovens deverão aprender a militar em causa própria no autodesenvolvimento, aprenderão sobre internet e memes nos conhecimentos gerais e precisarão criar um site pessoal, na hackademia. Também estão programadas reuniões semanais de feedback, uma vez que o programa não prevê provas tradicionais.
Ao terminar o primeiro módulo, os alunos iniciam a segunda etapa, também de três meses de duração, que consiste em uma viagem para um lugar onde nunca tenham estado e que, preferencialmente, não dominem a língua. Entre as sugestões de atividades que a organização do curso dá para esse módulo estão trabalhar em uma fazenda de alimentos orgânicos na Espanha, ensinar inglês a crianças nepalesas ou aprender karatê no Japão.
No terceiro módulo, o Gap Year vai colocar à disposição dos alunos sua rede de contatos para que cada um encontre um estágio em uma empresa inovadora. Entre as instituições parceiras estão o Google e a Ideo. Por fim, no quarto e último módulo, os estudantes deverão desenvolver um projeto que possa ser vendido. “Queremos que eles desenvolvam algo que tenha realmente valor. Pode ser uma apresentação de dança, um evento, um aplicativo a ser apresentado no fim do curso”, afirma Dale.
Filipe Russo, 21, foi o primeiro brasileiro a garantir vaga no curso, na turma que começa em janeiro. Depois de deixar o ensino médio por acreditar que estava perdendo tempo na escola, ser diagnosticado com superdotação intelectual e, na sequência, também se desiludir com o curso superior de design de games, agora ele parece ter se encontrado. “Pela primeira vez na vida, as coisas estão se encaixando. Essa é uma alternativa que eu não tinha”, diz ele, que até já sabe o que vai fazer de projeto final: um aplicativo móvel.
As inscrições para os Gap Years de 2014 já estão abertas. O custo para participar do programa é de US$ 13 mil, valor que inclui acomodação e algumas refeições do primeiro módulo (em que a turma divide uma casa em San Francisco), além de um acompanhamento pessoal e acesso às redes de contato do movimento UnCollege. Dale conta que a procura para o primeiro programa foi tanta que vai abrir novas turmas a cada três meses.