Organização prévia apoia inserção e uso de tecnologia na escola
Intencionalidade pedagógica e reflexão sobre tempos e espaços de atividades ajudam estudantes a se sentirem seguros e acolhidos por propostas estruturadas
por Maria Victória Oliveira 22 de junho de 2022
Por mais que a tecnologia já faça parte da vida de muitas crianças e jovens, introduzir ferramentas digitais na escola pode não ser uma missão tão fácil, justamente por conta da mudança na forma como a tecnologia deve ser encarada em momentos de estudo e em momentos de brincadeira e descontração. Por isso, o que pode ajudar educadores nesse contexto é a organização do tempo e espaço escolar.
Michelly Vedova, coordenadora pedagógica de matemática da Brink Mobil, comenta que essa organização prévia é uma forma de fazer com que os estudantes se sintam mais seguros e acolhidos por propostas estruturadas.
“Quando são apresentados a contextos de aprendizado organizados para propiciar investigação e descobertas, pensados para respeitar o tempo de cada um nesse processo, os alunos se sentem pertencentes e vivenciam as propostas com interesse.”
Importância da intencionalidade pedagógica
Para Ana Karine Chiquim, coordenadora pedagógica da Brink Mobil, a organização de um espaço está diretamente conectada à intencionalidade do docente em cada prática. Ou seja, quando ele organiza um espaço para que uma atividade aconteça, significa que houve um momento de reflexão e planejamento prévio, além de uma orquestração de elementos e ferramentas para que tal proposta pudesse ganhar vida.
“O professor ou professora antecipa o que vai acontecer e seleciona, a partir dos organizadores de ação pedagógica, quais materiais serão necessários para atender à demanda. Então ele já sabe qual grupo, espaço e materiais serão usados e quais intervenções serão feitas. Isso contribui para uma prática mais efetiva e de qualidade”, afirma.
Pensar e trabalhar a intencionalidade pedagógica para depois partir para a prática é, para Karine, o caminho mais indicado para que as propostas façam mais sentido e, assim, a organização do tempo e espaço das experiências flua com mais facilidade. É imprescindível ter abertura, entretanto, para o que pode surgir no meio do caminho a partir da percepção e contribuição dos alunos.
Ao se deparar com um inseto de jardim, por exemplo, os alunos podem fazer investigações e registros e levar a atividade para o laboratório, com o objetivo de aprofundar o conhecimento utilizando a tecnologia e recursos mais refinados para engajar na aprendizagem. “Nessa perspectiva de planejamento flexível e aberto, a tecnologia com certeza é um facilitador da ação pedagógica.”
Tempo certo
Michelly defende que a organização do tempo e espaço deve estar presente no dia a dia da escola, o que não é diferente quando o assunto é tecnologia.
Um dos pontos a serem pensados na hora de de inserir equipamentos e ferramentas tecnológicas na escola é uma reflexão sobre o momento específico que essa introdução acontecerá.
Por isso, Michelly elenca alguns pontos a serem considerados na organização do tempo para inserção da tecnologia:
– Como será a instrução inicial com relação ao uso da tecnologia?
– Como serão organizadas as turmas e grupos para as propostas de modo que todos tenham oportunidade de interação;
– Quais serão os desafios a serem resolvidos com o apoio da tecnologia?
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Organizando um espaço
Um dos principais pontos positivos do avanço da tecnologia é a mobilidade, ou seja, o fato de não ser necessariamente fixa, possibilitando que os dispositivos sejam movidos e transportados para diferentes ambientes. Isso significa que, para incorporar o uso de ferramentas tecnológicas no currículo, não é imprescindível ter um espaço exclusivamente dedicado, como um laboratório de tecnologia, por exemplo, como explica Karine.
Muitas escolas, principalmente as instituições da rede pública de ensino, enfrentam desafios de infraestrutura básica, não dispondo de espaços vagos para serem transformados em laboratórios. “Temos que desconstruir a ideia de que usamos elementos concretos ou a tecnologia. Hoje entendemos que, na verdade, a junção das duas linguagens é o melhor resultado na perspectiva educacional e da aprendizagem das crianças”, reforça Karine.
Dessa forma, voltar a atenção para a organização do espaço, dos elementos que serão trabalhados e por quanto tempo isso será feito pode suprir a ausência de um espaço dedicado. No caso da Brink Mobil, a coordenadora comenta sobre carrinhos que podem ser transportados para diferentes ambientes, ajudando a criar a atmosfera que o professor ou professora desejar dentro da perspectiva dos laboratórios.
“A professora pode selecionar os materiais e recursos que vai precisar para sua prática, colocar no carrinho e levá-lo para o ambiente que estiver disponível. Pode ser a própria sala de aula, pode ser um laboratório mesmo, pode ser o pátio ou até o refeitório se for o espaço livre no momento. Eu sempre digo que professores devem fazer o que podem com o que têm”, exemplifica.
Potencial da tecnologia
Uma das milhares de aplicações possíveis da tecnologia atualmente é apoiar o educador na compreensão de que cada criança e jovem aprende em sua própria perspectiva. Para Karine, é importante que o professor esteja sensibilizado e aberto para a questão temporal dos alunos, compreendendo que não existem aqueles que sabem mais e os que sabem menos, mas sim momentos e saberes diferentes. “Não existe o ‘não saber’, existe o aluno que está no que chamamos de ‘em processo’”.
Entretanto, para que ele possa usar a tecnologia como ferramenta estratégica no processo de aquisição do conhecimento, é necessário que tenha clareza sobre a concepção, filosofia e metodologia de ensino com as quais trabalha, bem como o perfil de seus alunos.
As chamadas trilhas de aprendizagem podem ser aliadas na realização de um diagnóstico de aprendizagem, nas quais os alunos fazem registros reflexivos e, a partir deles, conseguem deixar mais claro ao educador em que ponto de desenvolvimento estão. Nesse contexto, crianças que já alcançaram determinado ponto podem ajudar outras que enfrentam algum tipo de dificuldade.
É possível, portanto, o docente dar respaldo à aprendizagem de forma individual ou em grupo usando tecnologia. Tudo depende, para Karine, da postura e visão do docente à frente da proposta.
Experiências com óculos de realidade virtual, por exemplo, são individuais quando se considera que o estudante imerge sozinho no ambiente virtual, mas as trocas e construções coletivas que ocorrem antes ou depois ajudam a consolidar o aprendizado. Também há a opção de jogos educacionais digitais que já preveem o uso coletivo, seja em uma perspectiva colaborativa ou competitiva.
“Independentemente da tecnologia, o que vem se mostrando indiscutível é que as ferramentas e recursos digitais estão disponíveis para somar nos processos de ensino e aprendizagem favorecendo o desenvolvimento das crianças e jovens”, completa Michelly.
A vivência de laboratórios ou espaços destinados à ciências, por exemplo, também permite, a partir das aulas experimentais, que os estudantes vivenciem seu aspecto social, uma vez que essas são aulas naturalmente desenvolvidas em grupos.
“As aulas experimentais estimulam a argumentação e discussão entre os indivíduos e, com isso, propiciam a convivência em grupo, mediados pela cultura na qual estão inseridos, algo que aulas meramente expositivas não conseguem alcançar. Aulas experimentais trazem motivação para as salas de aula. Traga um problema interessante, permita que os alunos experimentem, sejam criativos e você verá um engajamento enorme por parte deles”, defende Thomas Sievers, coordenador de ciências da Brink Mobil.