Quem cuida da saúde mental do gestor escolar? - PORVIR
Crédito: Ildar Abulkhanov/iStock

Inovações em Educação

Quem cuida da saúde mental do gestor escolar?

Muito se fala do apoio socioemocional aos estudantes e aos professores, mas a quem o diretor deve recorrer quando o assunto é saúde mental? Confira as indicações de profissionais e especialistas da área

Parceria com Isaac

por Ana Luísa D'Maschio ilustração relógio 16 de janeiro de 2023

A postura dos diretores escolares impacta diretamente diversos aspectos da escola: o clima, a cultura, o bem-estar de professores e de alunos. Mas, para que isso aconteça, o desenvolvimento pessoal e profissional desse gestor precisa estar em equilíbrio. Tal tarefa não é fácil: administrar equipes, resolver problemas delicados como conflitos e inadimplência, e manter hábitos saudáveis, se não bem distribuídos na agenda, podem causar crises de ansiedade, picos de estresse e comprometer a liderança.

“Nunca se falou tanto em saúde mental como nos últimos anos, com uma sociedade mais adoecida e acometida pela catástrofe da Covid-19”, pontua Cristiane Coelho, diretora da Escola Afro-Brasileira Maria Felipa, em Salvador (BA). Rubi Silva de Alencar, proprietária do Centro Educacional Rubi, em Macapá (Amapá), lista alguns itens que podem contribuir com o adoecimento do diretor escolar. “Além do fato de não procurar uma ajuda especializada nos momentos de crise, a saúde pode ser prejudicada quando se centraliza excessivamente as atividades, quando você está fechado aos feedbacks (retornos avaliativos) de clientes e da equipe de trabalho. Sem contar os maus hábitos alimentares, ausência de exercícios físicos e falta de tempo para o lazer e descanso.” 

Como o gestor pode cuidar melhor de sua saúde mental? A quem recorrer para pedir apoio para a resolução de questões socioemocionais?

“À semelhança dos casos envolvendo alunos e professores, é salutar que a instituição de ensino possua, dentro de seu quadro fixo, um profissional da área de psicologia”, sugere Rubi. “Esse atendimento se estende ao corpo diretivo da instituição. “No meu caso, faço terapia para lidar com as demandas internas do trabalho e externas da minha vida pessoal”, recomenda.

Respeito e escuta ativa

Primeira escola afro-brasileira do Brasil registrada no MEC (Ministério da Educação), inaugurada em 2018, a Maria Felipa também conta com o apoio da psicologia para manter sua gestão baseada na socialização dos saberes de cada integrante. 

Com abordagem educacional voltada aos elementos da cultura africana e afro-brasileira, Maria Felipa leva esse nome em homenagem à escravizada que combateu marinheiros, tida como uma das heroínas da independência do Brasil e da Bahia. Tem como foco a educação para a inclusão e a diversidade. 

“Enquanto diretora, posso dizer que não é fácil harmonizar rotina administrativa e saúde mental. Porém, além de termos uma profissional de psicologia, praticamos o afro-afeto, partilhamos as decisões, sentamos juntos e juntas para pensarmos estratégias de condução das ações”, explica Cristiane. “O nosso Projeto Político-Pedagógico é um documento real, efetivo e afetivo de direcionamento. Nós nos amparamos enquanto seres humanos nesse quilombo intitulado escola Maria Felipa”, reforça a diretora.

Tal modelo de gestão compartilhada e de afro-afeto, de acordo com Bárbara Carine, idealizadora e consultora da instituição, é ancestral. “É um modelo que vem das nossas mais velhas. Não está em literatura nenhuma, não está um modelo de gestão ocidental vindo dos manuais de administração e de gestão brancos. Isso vem muito do olhar sensível das nossas ancestrais, do olhar sensível das nossas das nossas vivências dentro da cultura do Axé, da organização dos terreiros… Mesmo que uma mais velha seja profissional da limpeza, ela é mais velha. Dentro da ordem da cultura africana, o ancião é quem tem a sabedoria”, explica. “Em outro espaço, uma pessoa que aparentemente não teria a contribuir com uma decisão da gestão escolar, aqui ela tem muito a nos ensinar com sua experiência de vida, sua espiritualidade, sua ancestralidade. Por isso, buscamos ouvir todas as pessoas na escola. Nossa noção de sabedoria é diferente da noção ocidental”, explica a professora e empresária. 

A equipe do Maria Felipa preza pela diversidade, seja de gênero, de religião ou de nacionalidade: por lá, já passaram professores do Uruguai e da Argentina, por exemplo. “São pessoas de locais diversos, que trazem suas constituições culturais. Nos processos decisórios, é muito importante ouvir a todos”, afirma Bárbara. E a saúde mental da gestão e de toda a equipe é tratada como tema central. “A psicóloga escolar tem um olhar sensível para a demanda das crianças, dos e das profissionais da escola, incluindo o gestor e a gestora, em constante lugar de cobranças e sobrecarga. O olhar especializado para esse sujeito visa seu bem-estar no espaço de trabalho e isso potencializa sua produção”, analisa Bárbara, também autora do livro “Descolonizando saberes: mulheres negras na ciência”. 

O que dizem os pesquisadores 

Um estudo da Universidade da Pensilvânia (Estados Unidos) reforça a importância de uma liderança escolar com foco socioemocional. O conceito, de acordo com os pesquisadores, reúne dois componentes: o primeiro é a competência social e emocional do diretor, sua capacidade de lidar com o estresse e ter uma postura carinhosa e competente com a comunidade escolar. O segundo item é garantir que todos os funcionários, alunos e pais se sintam seguros, respeitados e valorizados. 

“Atualmente, a aprendizagem socioemocional é reconhecida como componente essencial da educação, visto por profissionais e formuladores de políticas como fundamentais para o sucesso escolar e os resultados dos alunos”, mostra um trecho do documento. “Em um ambiente educacional caracterizado pela crescente desigualdade social, violência, intimidação e agressão, os diretores reconhecem a aprendizagem socioemocional para melhorar suas habilidades como líderes, construir um clima escolar acolhedor e apoiar o desenvolvimento dos estudantes.”

O estudo aponta, ainda, que 98% dos diretores da educação básica nos Estados Unidos concordam que as habilidades socioemocionais são ensináveis e reconhecem que elas podem ajudar a promover igualdade e reduzir disparidades no ambiente escolar. No entanto, eles também relataram a necessidade de orientação sobre a implementação. 

Para avançar no debate, a pesquisa oferece algumas recomendações. Entre elas, está a inclusão de programas e cursos de desenvolvimento profissional focados no desenvolvimento socioemocional dos gestores, a fim de entender os impactos e os benefícios na rotina desse profissional. 

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Tecnologia como aliada

A tecnologia pode apoiar a melhoria dos processos internos e, consequentemente, uma organização que permita um ambiente mais saudável na escola. É o que aponta Danilo Yoneshige, CEO da Layers Education, edtech brasileira que unifica soluções tecnológicas da educação em um único ambiente digital.

Ele traz um exemplo que costuma ser uma das grandes preocupações da gestão escolar: a boa comunicação com pais e responsáveis. “Para estabelecer uma relação de confiança com as famílias, é necessário ter transparência na comunicação. E a estratégia primordial para aproximá-los é escolher bem os canais de troca de informações, de forma organizada e direcionada. E acredite: não basta ter aplicativos de mensagens. Existem soluções que foram exclusivamente desenvolvidas para esta finalidade”, explica. “É necessário investir em uma iniciativa tecnológica para otimizar a gestão, capaz de integrar todas as ferramentas necessárias em um único ambiente. Essa possibilidade potencializa a visão 360º da instituição. Desta forma, tudo está ao alcance de um clique, na palma da mão, com apenas um login e senha.”

Para Danilo, gestores e mantenedores precisam olhar para a proposta pedagógica da instituição, a fim de identificar as oportunidades que podem ser auxiliadas pela tecnologia. “Considerar os componentes curriculares também é necessário para entender de que forma soluções tecnológicas podem integrar as áreas no sentido de apoiar o aprendizado e o cuidado dos alunos.”

Todos os sistemas da escola precisam conversar e funcionar em conjunto, acredita o CEO da Layers Education. “Enquanto as ferramentas para a gestão fazem seu papel na administração, as soluções de educação apoiam o aprendizado dos estudantes. Desta forma, temos um ambiente completo e integrado, o que também chamamos de interoperabilidade – modalidade que pode ser entendida como uma característica que se refere à capacidade de diversos sistemas e organizações trabalharem em conjunto”, conclui Danilo.

5 dicas para o gestor escolar cuidar melhor da saúde mental

Especialistas na área de liderança escolar, com mais de 20 anos de experiência com coordenação pedagógica e gestão, Marcelia Fernandes e Maria Carolina Paixão são consultoras da “Midas da Educação”.

Com 29 mil seguidores no Instagram, por onde mantêm diálogo direto com diretores, esclarecendo dúvidas e os apoiando com orientações, as consultoras também realizam uma série de formações. “A saúde mental da gestão escolar é fundamental para o equilíbrio e resultado do trabalho na instituição”, afirmam. Para as especialistas, cuidar da saúde emocional na gestão visa o bem-estar da equipe, assegurando, de forma indireta, também a saúde emocional da coordenação.

A pedido do Porvir, Marcelia e Carol listaram 5 dicas essenciais para que os gestores escolares cuidem melhor da saúde mental. Confira:

1) Controle o WhatsApp
O uso do WhatsApp na vida dos brasileiros se tornou algo natural, mas isso tem sido um problema quando o aplicativo de mensagens instantâneas fica disponível o tempo todo, gerando um excesso de informações e estresse na vida dos gestores escolares.

Ao usar o aplicativo, o gestor pode desligar as notificações para que não cause a ansiedade de responder ou “zerar” essas notificações, respondendo as mensagens em horários delimitados.

Deve-se ter o mesmo cuidado ao enviar mensagens fora de hora para a coordenação. Por mais simples que ela seja, ainda sim é trabalho que acaba sobrecarregando ambas as partes (direção e coordenação), prejudicando a saúde emocional.

2) Encontre hobbies
Nem só de escola vive um gestor. Por isso, é necessário criar maneiras de lazer próprias para descansar a mente. Artesanato, atividades esportivas, assistir séries… Encontre sua alternativa para relaxar. É importante ter um tempo de qualidade com algo que não se relacione ao trabalho.

3) Aprenda a gerenciar o tempo
Cuidar do próprio tempo e equilibrar horários de trabalho, lazer e família é de extrema importância para saúde mental. Pesquisar informações sobre como gerenciar melhor seu tempo pode ser uma forma de aprender a balancear melhor os dois mundos (trabalho e pessoal).

4) Pratique exercícios físicos
Parece clichê, mas a verdade é que se exercitar regularmente faz com que o seu cérebro descanse e alivie tensões do dia a dia, sendo uma forma de extravasar. Por isso, uma forma de se manter saudável, mental e psicologicamente, é fazer atividade física. Não vale apenas academia: qualquer tipo de exercício é bem-vindo.

5) Busque terapias
Atuar com demandas escolares é desafiador e faz com que diariamente você precise passar por situações estressantes. Aprender a se controlar é uma forma de cuidar de si e dos seus colaboradores. Ter acompanhamento psicológico profissional pode ajudar a lidar melhor com as tensões e questões diárias de forma saudável.

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Isaac

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gestão escolar, socioemocionais, tecnologia

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