Escola sul-coreana vivencia educação ao ar livre
Filial de tradicional escola dos EUA abre na Coreia, levando educação por projetos, criação de galinha e chance de errar
por Patrícia Gomes 12 de novembro de 2012
Quando se fala em educação sul-coreana, talvez uma das primeiras imagens que venha à cabeça seja uma sala de aula com estudantes quietos, impecavelmente vestidos, compenetrados nos problemas de matemática de um espesso livro de exercícios. Mas na Chadwick International, filial de uma escola independente norte-americana fundada há 75 anos, não é bem assim. Funcionando há três anos em Yeonsu-gu, a 32 km da capital Seul, a escola aposta na educação ao ar livre para colocar os jovens em posição de sugerir, criar soluções para problemas, interagir, acertar e – por que não? – errar. A partir de uma fórmula que aposenta os livros didáticos e reforça a importância do aprendizado baseado em projetos, a escola pretende preparar melhor os alunos para a vida e, assim, se firmar como “um modelo para a revolução na educação sul coreana”.
“A Chadwick é uma escola muito especial porque ela foca não apenas na excelência acadêmica, mas nos próprios alunos, enfatizando o desenvolvimento da liderança e da autodescoberta a partir de um aprendizado experimental”, diz Unna Huh, diretora de assuntos internacionais da Chadwick International, que reforça o caráter competitivo da sociedade sul coreana e da pressão que os pais fazem nos filhos para conseguirem vagas nas melhores universidades. “Mas vivemos o tempo da mudança, na era da informação, da criatividade e da inovação e as pessoas estão começando a reconhecer isso”, afirma a educadora, que viu o interesse das famílias pela escola galopar. Desde que abriu, com apenas 230 alunos do 7o ano, passou para 530 no ano letivo seguinte e atualmente conta com 707 jovens de 7o, 8o e 9o anos. Para o próximo ano, já há famílias na lista de espera e a perspectiva é que o número de matriculados cresça ainda mais.
E essa mudança é traduzida na escola por uma lógica e uma série de atividades idealizadas pela Chadwick norte-americana – e replicada na instituição de Yeonsu-gu – que subvertem o modelo a que a disciplina sul-coreana está acostumado. A primeira grande inovação é a ausência de livros didáticos. “O currículo evolui à medida que tópicos são discutidos, pesquisados, analisados e sintetizados em várias formas de projetos. O estudante assume a responsabilidade de explorar soluções e colaborar com os colegas. Eles usam os livros da biblioteca, internet e outras fontes para referência e pesquisa”, afirma Huh. As respostas para os problemas que os alunos têm de enfrentar podem ser expressos por meio de entrevistas, documentários em vídeos, performances em grupo e até em uma competição de barcos de papelão na piscina. “Estudantes experimentam desafios e sucessos. Essas experiências levam o aluno a ter autoconfiança, habilidade de resolver problemas com criatividade. A Chadwick está tentando oferecer aos alunos habilidades para toda a vida”, afirmou.
Muitas vezes, porém, a busca por soluções dentro da escola não é suficiente. É aí que entra a educação ao ar livre, recurso pedagógico que é levado tão a sério na instituição que até um diretor específico tem. “Os estudantes são muito ativos em vários serviços comunitários, como visitas aos campos de refugiados norte-coreanos para ensiná-los inglês. Também vão a campo limpar os resíduos deixados pelos pássaros migratórios”, diz a diretora.
Huh conta que os alunos do 8o ano passaram uma semana em um monte. Mas para esquematizar a ida desses jovens, a diretora estudou as montanhas dos arredores, consultou dez especialistas norte-americanos para conceber e executar as atividades, desde a parte logística – o grupo que prepara o café e o grupo que lava a louça – até a pedagógica. “Essa experiência foi, para muitos alunos, a primeira vez que estiveram longe de suas famílias por uma semana inteira. Muitos deles nunca nem sequer haviam feito o café da manhã ou lavado louça”, diz a sul coreana, que ressaltou também a oportunidade que esses jovens tiveram de interagir com a comunidade local, aprender com os colegas e enfrentar desafios de ordem, inclusive, física. “Talvez os alunos tenham entendido pela primeira vez palavras e expressões como paciência, desafios do mundo lá fora, aconchego do lar, conveniência das tecnologias modernas, cooperação deixa as coisas mais fáceis, empatia, faça sozinho, instinto de sobrevivência, estar sozinho, beleza da natureza, dialogar com os amigos etc.”
A participação dos professores também é fundamental, ressalta Huh. O corpo docente, que hoje conta com 100 profissionais, participa das atividades práticas do contraturno. O rol de opções é tão vasto quanto robótica, discussões sobre problemas do mundo e criação de galinhas. “Os professores participam constantemente de vários programas de desenvolvimento profissional, como treinamento em TI, em desenvolvimento de currículo e estratégias para usar o método Socrático de diálogo.”
A Coreia do Sul costuma estar entre os países mais bem colocados do mundo no Pisa, exame internacional realizado a cada três anos com alunos de 15 anos de todo o mundo. Apesar dos bons resultados nos exames, a fama dos alunos que a proficiência não é tão grande quando o assunto é criatividade, comunicação e improviso. “Governantes coreanos, educadores, pais entendem que nós precisamos de um tipo diferente de educação”, diz Huh, que completa, confiante: “É por isso que eu acho que estamos tentando uma abordagem que todas as escolas coreanos precisam ter. A Chadwick vai definir o modelo da reforma educacional coreana”.
Huh estará no Brasil em 29 de novembro durante o TEDx Unisinos, realizado em Porto Alegre.