Escolas de negócio querem formar líderes sustentáveis
Projeto 50+20 procura responder à demanda crescente do mercado por profissionais preocupados com questões sociais
por Mariana Fonseca 14 de junho de 2012
Um novo modelo para educar líderes e gestores pautado pela sustentabilidade. Essa é a proposta que um grupo de representantes de escolas de gestão e negócios e empresários do mundo todo, inclusive do Brasil, vão apresentar nesta sexta-feira durante a Rio+20. Reunidos desde 2010 no projeto 50+20, três organizações internacionais e 15 escolas de administração sugerem formas de tornar mais “verde” e socialmente responsável o currículo das escolas que formam líderes globais.
“Essa é uma iniciativa para tornar as escolas de negócios mais proativas na sustentabilidade”, afirma Heiko Spitzek, professor da Fundação Dom Cabral, uma das instituições brasileiras que participou das discussões internacionais. Segundo ele, há uma forte demanda do mercado por profissionais com essa formação. “Temos vários clientes no mundo e a pressão da sustentabilidade está chegando por diferentes frentes. Seja para empresas que exportam para os EUA e Europa e precisam se mostrar mais ‘limpas’ seja uma pressão do consumidor para construir uma cadeia de valor, como faz a Natura.”
Para Spitzek, o maior desafio das faculdades e universidades da área de gestão está em colocar a sustentabilidade no currículo de forma transversal. “Muitas já colocam o tema em um módulo isolado, como se estivessem resolvendo a questão. É necessário incluir o tema de forma multidisciplinar, ao longo do curso.” O brasileiro defende ainda que a sustentabilidade não seja encarada como um problema. “Temos uma grande oportunidade de inovar e encontrar um bom negócio no mercado.”
Uma exemplo de inovação focada em problemas sociais, de acordo com o professor, seria o M-Pesa (M de mobile e Pesa de dinheiro, em suahili) criado pela Vodafone, no Quênia. “Por lá, 60% da população usa telefone celular e só cerca de 20% têm acesso a serviços bancários. Eles criaram um aplicativo mobile que permite a transferência de dinheiro, via celular, sem necessidade do banco. Hoje eles movimentam R$ 600 milhões no sistema por mês, o equivalente ao valor das movimentações de cartão de crédito no país. Uma empresa de telefonia que compete com bancos.”
50+20
Foi com a preocupação de repensar o currículo das escolas de negócios que Thomas Dyllick, professor da universidade suíça St. Gallen e cofundador do WBSCSB (um conselho mundial de escolas de negócios sustentáveis) e líderes de escolas de negócio se reuniram, há dois anos, no Canadá. Eles queriam saber como a academia havia adotado as ideias levantadas na Eco 92, no Rio de Janeiro. “Concluímos que houve iniciativas pontuais, mas pouca coisa foi feita nas instituições. Por isso, começamos a nos organizar para pensar o futuro que queríamos para as escolas de gestão”, afirma. Ali nascia o 50+20.
A entidade de Dyllick uniu-se então a outros organismos internacionais para levantar diretrizes que pudessem ajudar as escolas a trabalhar um currículo voltado para o desenvolvimento sustentável e que incluíssem a discussão de problemas sociais. “Queríamos encontrar formas de colocar o ensino de gestão no meio da sociedade. Promover a formação de lideranças mais responsáveis para um mundo sustentável.”
O nome, 50+20, se deve exatamente a uma onda de mudanças nos currículos dessas escolas que nos últimos 50 anos passaram de uma grade mais técnica para uma focada em estudos científicos. “Ter um ensino mais científico foi um grande passo, mas fomos além, deixamos de lado a prática. Muitas escolas ficaram voltadas só para o mundo acadêmico. Estamos trazendo a necessidade de se abrir novamente, lidando com problemas sociais. O +20 faz referência à conferência na qual lançaremos nossas propostas para sustentabilidade.”
De olho no mundo
Nas discussões, o grupo chegou a três preocupações que as instituições de ensino deveriam ter: educar e desenvolver líderes globalmente responsáveis (pela educação), permitir que empresas sirvam ao bem comum (pela pesquisa) e engajar-se na transformação dos negócios e da economia (pela prestação de serviços públicos).
Nas metas de educação estão, por exemplo, a transformação do processo de aprendizagem que, segundo Dyllick, deveria focar não só o desenvolvimento do intelecto, mas também a relação com o mundo a sua volta. “Aprendemos contabilidade, finanças, marketing, mas não somos orientados a lidar com questões de gênero, pobreza e imigração.”
Já para as áreas de pesquisa, as metas incluem a busca por trabalhos que sirvam à sociedade e estudos que deem suporte aos gestores no tratamento das questões ambientais. Quanto aos serviços, a sugestão é um maior engajamento em questões de interesse público. “Temos obrigação de contribuir com o debate público. Os professores precisam opinar publicamente sobre diferentes temas, escrevendo para jornais, se abrindo para a sociedade.”
Os detalhes das propostas do 50+20 ficarão disponíveis para o público no site do projeto, em inglês, após a apresentação oficial que acontece às 12h de amanhã e também serão organizados em um livro, ainda sem data de lançamento.