Como escola indígena adaptou atividades durante pandemia
Com a maioria de professores indígenas, a escola Tainá, de Formoso do Araguaia (TO), conta com algumas dificuldades da realidade local, como a timidez dos estudantes, a infraestrutura e as adaptações necessárias em função da Covid-19
por Edilane de Souza Bezerra Martins 6 de janeiro de 2021
Conheci a escola indígena Tainá, por um anúncio na página do Instagram enviado por uma colega. Por se tratar de uma área rural, de acesso mais difícil, a vaga ainda estava disponível quando entrei em contato. A escola fica a, mais ou menos, 154 quilômetros de onde moro, em Gurupi (TO).
Logo após esse contato, tive que me apresentar no dia seguinte, então não houve realmente um tempo para preparação. No entanto, ainda na faculdade, cursei uma matéria sobre educação indígena, o que me deu um pouco de embasamento para a realidade na qual eu começaria a trabalhar.
As dinâmicas de uma escola indígena são diferentes das demais. Temos turmas multisseriadas e tentamos trabalhar com os alunos da forma mais lúdica possível, para que eles possam aprender a partir da observação e de atividades práticas. Na aula de inglês, por exemplo, a professora coloca músicas para que crianças e jovens ouçam e possam aprender o vocabulário pela letra.
Nossa infraestrutura é simples. Temos apenas seis salas de aula e uma sala para professores e coordenação. Quando o assunto é internet, há sinal na escola, e todos os professores e estudantes conseguem acessar. Como a maioria dos alunos não têm internet em casa, nem celular ou computador, é na escola que eles conseguem fazer trabalhos e pesquisas.
Muitos dos nossos professores gostam de realizar suas atividades com os alunos ao ar livre. As atividades mais legais são aquelas que retratam bem a cultura indígena, como por exemplo as pinturas corporais. Os estudantes, claro, gostam muito. Dos nove professores da escola, apenas dois não são indígenas. Na sala dos professores, eles acabam conversando mais em seu idioma.
Nossas maiores dificuldades estão em ajudar os estudantes a superarem alguns desafios. Eles sentem muita vergonha de tudo, de falar e de se expressar. Eles não falam português de forma fluente, então quando não sabem algo, acabam recorrendo à língua indígena. Na escola há aulas das duas línguas: portuguesa e indígena.
Todos os professores seguem as normas e diretrizes estabelecidas pela BNCC (Base Nacional Comum Curricular). As atividades são pensadas de forma geral de acordo com os anos e adaptadas conforme as facilidades ou dificuldades dos estudantes.
Depois da pandemia, tudo teve que ser mudado. Temos trabalhado para garantir que os alunos tenham acesso às atividades, e fazemos isso entregando cópias impressas do material, já que nem todo aluno indígena tem computador em casa ou um celular.
Muitas vezes, três famílias que moram juntas, por exemplo, têm um único celular. Assim, a forma mais fácil é a elaboração de atividades e impressão. Quando as apostilas ficam prontas, a parte administrativa avisa na aldeia que já estão disponíveis para retirada na escola, tomando todas as medidas de segurança.
Para fazer essa adaptação, alguns professores, por exemplo, procuraram elaborar roteiros detalhados a partir da CLOE, plataforma digital de aprendizagem ativa da Camino Education. Eles acompanham o roteiro de atividades para direcionar os estudantes a realizarem as propostas, que deveriam ser simples e claras para facilitar a compreensão. Outra estratégia utilizada foi antecipar algumas dúvidas que os alunos poderiam ter na hora de fazer a atividade e colocar as explicações no roteiro, o que favoreceu mais retornos positivos.
Durante esse período de quarentena, professores de língua portuguesa, por exemplo, priorizaram atividades que mantivessem os alunos engajados, e favorecessem que lembrassem dos conteúdos trabalhados. Por isso, elaboraram propostas envolvendo leitura, escrita, interpretação de textos, análises e outras atividades.
Todas as avaliações são adaptadas à realidade da escola. Na quarentena, os estudantes estão sendo avaliados de acordo com suas participações nas atividades. Ou seja, se fazem e acertam, serão avaliados; se fazem e respondem de forma fora do contexto, também serão avaliados. Seguimos esse modelo, que acredito ser o mesmo para muitas escolas rurais.
* Com a colaboração de Leomárcia Ferreira Maia, professora de língua portuguesa de Ensino Fundamental e Médio na escola Tainá
Edilane de Souza Bezerra Martins
É coordenadora pedagógica da escola Tainá, localizada na aldeia Canoanã, na cidade de Formoso do Araguaia, no Tocantins. Formada pela Universidade de Gurupi (UnirG), mora em Gurupi (TO)