‘A escola se tornou um jogo de superar estágios’, diz educador espanhol
Antoni Zabala, um dos mais importantes pesquisadores sobre fundamentos do construtivismo, defende mudança do sistema educacional durante palestra no Brasil
por Marina Lopes 27 de setembro de 2018
O educador espanhol Antoni Zabala é considerado um dos mais importantes pesquisadores e divulgadores de fundamentos do construtivismo, concepção que valoriza o repertório prévio dos alunos para a construção de novos conhecimentos. No entanto, durante sua visita ao Brasil, que aconteceu na última semana, em São Paulo (SP), a convite do Grupo de Escolas Critique, ele preferiu relativizar o termo e fugir de qualquer tipo de rótulo. “Quando o nome aparece, também surgem aqueles que são a favor e aqueles que são contra, mas a escola é muito mais complexa do que isso”, alertou.
Ao invés de se concentrar na definição ou defesa de termos, Zabala começou sua apresentação com uma ideia chave: a necessidade de transformação do sistema educacional. De acordo com ele, mais do que pensar em como ainda estamos distantes do objetivo, a preocupação central de todos deveria ser como chegar nesse lugar e ser a escola do século 21.
Seja na Catalunha, comunidade autônoma da Espanha que é sua terra natal, ou em qualquer outro lugar do mundo, ele diz que alguns problemas educacionais são universais. “Eles vêm de um modelo onde a escola se tornou um jogo de superar estágios, de tal maneira que o objetivo é passar do primeiro para o segundo, do segundo para o terceiro.”
Para ele, a função da escola não é selecionar, mas orientar cada aluno para encontrar um lugar na sociedade e ser feliz. Ao mesmo tempo, Zabala menciona que as instituições educacionais devem ter propósitos claros, inclusive no que se refere ao que será trabalhado. Ele fala dessa necessidade ao citar que muitos alunos sabem responder questões sobre mitose e meiose, mas são incapazes de explicar o que acontece com o sangue quando cortam alguma parte do corpo.
Na visão do educador, dar respostas aos desafios da vida significa ter um conhecimento e saber usá-lo. A escola não deveria focar apenas nos conteúdos, mas no desenvolvimento de competências. “Aprendemos quando estabelecemos vínculos entre os novos conhecimentos e os conhecimentos prévios”, diz. No entanto, conforme ele ilustra de forma simples, o que acontece muitas vezes é que a escola não ensina a fazer um omelete, mas fala da teoria do omelete, da história do omelete, da estrutura do omelete e das diferentes formas que alguém pode fazer um omelete. Tudo isso sem considerar os conhecimentos prévios dos alunos sobre o tema.
“Ninguém gosta de jogar um jogo que sempre perde. Algumas crianças, dadas suas capacidades e condições pessoais, se não atenderem a alguns princípios da escola nunca vão ganhar”, afirma, ao mencionar que é preciso criar estratégias para que todas as crianças tenham sucesso. “Elas têm talentos para a vida, e eles precisam ser explorados.”
Zabala defende que o objeto de estudo das disciplinas deveria ser a vida, e não apenas os conceitos. “O objeto de estudo da física é a vida. O importante não é saber cinemática, mas conhecer o movimento dos corpos”, exemplifica.
O educador espanhol ainda apresenta mais uma ilustração para mostrar como o modelo atual de escola tem suas fragilidades: se os professores que estão no topo da pirâmide do conhecimento recebessem uma folha de papel para escrever tudo o que sabem sobre uma disciplina que não é de sua área de formação, provavelmente eles não iriam preencher muitas páginas. “Isso é o resultado de um sistema educacional que, por vezes, defendemos. É, portanto, importante refletir para melhora que nós queremos”, conclui.