Até os Beatles precisavam de um mediador de conhecimento

Em 1958, em Liverpool, na Inglaterra, um jovem guitarrista chamado George se juntou aos Quarrymen, uma banda formada por dois outros músicos, John e Paul. Os três tocavam rock and roll em bares e pequenas casas de show sempre que podiam e tiveram algumas passagens por Hamburgo, na Alemanha. Foi só em 1962, quando foram contratados pelo produtor George Martin, que se juntaram ao baterista Ringo e fizeram sua primeira grande gravação. Em seus 10 anos de vida, os recém-batizados Beatles foram pioneiros em termos de gravação, composição musical e apresentação artística – e se tornaram uma das bandas mais influentes de todos os tempos.

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Neste caso, George Martin pode ser considerado um “intermediário musical”. Ele conectou músicos com grandes públicos. Mas não foi um processo simples nem passivo. Martin ajudou a desenvolver sua criatividade e forneceu produção inovadora, enquanto os Beatles tiveram que ajustar o tempo de algumas de suas músicas e adotar uma abordagem profissional de performance.

Mais do que apenas um intermediário

Assim como os intermediários musicais estão entre os músicos e o público, os intermediários de pesquisa ou conhecimento estão entre os produtores de pesquisa e os usuários de pesquisa. Os intermediários no setor da educação buscam ampliar a tomada de decisões baseada em evidências e uma cultura de uso da pesquisa em políticas e práticas. Para isso, eles não apenas movem o conhecimento dos produtores de pesquisa para seus usuários: eles fazem muito mais.

Primeiro, os intermediários podem ser gerenciadores de conhecimento. Eles criam e traduzem conhecimento, adaptam-no em diferentes formatos e os disseminam ou difundem. Um claro exemplo disso é o kit de ferramentas de ensino e aprendizagem, desenvolvido pela Education Endowment Foundation (EEF), uma curadoria cuidadosa de evidências educacionais sobre mais de 40 abordagens para melhorar o ensino e a aprendizagem. O material está disponível em inglês.

Em segundo lugar, os intermediários podem atuar como agentes de ligação. Eles criam e promovem relacionamentos e redes ligadas ao conhecimento e, por meio deles, permitem a multiplicação e expansão das melhores práticas. 

E terceiro, os intermediários podem desempenhar um papel de capacitação. Eles desenvolvem e apoiam a compreensão, habilidades, capacidades e condições necessárias para criar, adaptar, comunicar e usar o conhecimento para um desenvolvimento sustentável e escalável de práticas e processos de uso da pesquisa.

No entanto, esses são apenas os três papéis mais conhecidos. Os intermediários também podem atuar como coordenadores de nível de sistema ou interatores, líderes estratégicos para aprimorar o uso de evidências ou defensores do uso de pesquisas.

Diferentes necessidades, diferentes intermediários

Os intermediários podem desempenhar apenas um desses papéis ou uma junção deles. Os papéis desempenhados são definidos por dois fatores principais. Por um lado, os recursos, experiência, capacidades e intenção dos próprios intermediários (como George Martin) ou de seus financiadores. Por outro lado, os interesses e objetivos dos beneficiários pretendidos, sejam eles produtores de pesquisa (os Beatles), usuários de pesquisa (todos os amantes da música) ou ambos.

Assim, atuar como intermediário exige flexibilidade e receptividade, pois os intermediários precisam adaptar seu trabalho às necessidades das partes interessadas. Essa fluidez e dependência do contexto sugerem que para cada necessidade particular, há um papel específico de intermediário para satisfazê-la, que pode ser desempenhado por uma ou várias organizações – ou mesmo nenhuma. 

Não existe uma “receita mágica” sobre o que um intermediário deve ser ou fazer. No caso de George Martin, ele trabalhou com os Beatles e uma série de outras estrelas. No entanto, outros produtores musicais se destacaram em outros gêneros usando uma variedade de técnicas diferentes.

Como sabemos se eles funcionam?

Os intermediários, portanto, podem transformar seus setores. No setor de educação, eles podem ter um impacto duradouro na aprendizagem dos alunos e na qualidade do ensino. Ainda assim, sabemos muito pouco sobre seu impacto real e sob quais condições esse impacto ocorre. Seu trabalho tem sido amplamente negligenciado no que diz respeito ao monitoramento e avaliação. Entre 3% e 13% das atividades identificadas de mobilização de conhecimento foram avaliadas, e quando o foram, a avaliação ocorreu principalmente no formato de relatórios de “fim de projeto”. Além disso, a maioria das avaliações se baseia em medidas como número de visualizações de páginas da web, cliques e artigos baixados, enquanto a extensão e a qualidade do uso da pesquisa permanecem ocultas. O impacto mais amplo em políticas e práticas, bem como os resultados sociais finais, muitas vezes são negligenciados.

No entanto, existem algumas sugestões interessantes a serem consideradas a partir das poucas avaliações feitas. Iniciativas que tornam as evidências acessíveis e aquelas que incentivam a interação, embora promissoras e necessárias, não são suficientes para aumentar o uso da pesquisa. Elas devem ser apoiadas pelo aumento da motivação, das oportunidades e das capacidades dos professores e formuladores de políticas para o uso da pesquisa.

A falta geral de compreensão das atividades intermediárias pode afetar negativamente o desenvolvimento, o apoio, a percepção e o valor dos intermediários de pesquisa. É necessário estudar o que é eficaz para alcançar uma cultura de uso da pesquisa em políticas e práticas, sob quais condições e como os intermediários podem ajudar a fazê-lo. Caso contrário, podemos perder os próximos Beatles da educação.

Principais destaques do artigo:

• Para um uso mais eficaz de evidências na educação, precisamos de pessoas e organizações que ajudem a conectar os mundos da pesquisa, prática e políticas: são os intermediários do conhecimento.
• As necessidades específicas de professores, escolas e ministérios vão influenciar os papéis e atividades desses intermediários.
• É importante compreender melhor quais formas de atividades dos intermediários funcionam para fortalecer o uso de pesquisas para quem e em quais condições.

*Artigo originalmente publicado no site da OCDE Education and Skills Today (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e publicado mediante autorização.

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