Aulas de matemática apoiam o debate sobre pesquisas eleitorais - PORVIR
Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Inovações em Educação

Aulas de matemática apoiam o debate sobre pesquisas eleitorais

Planos de aula do projeto #FaketoFora auxiliam professores a reconhecer estratégias de apresentação das pesquisas eleitorais e entender a ciência por trás dos números

Parceria com Educamídia

por Ana Luísa D'Maschio ilustração relógio 30 de junho de 2022

Intenção de voto, margem de erro, amostragem. Basta acessar o noticiário político para encontrar os conceitos matemáticos em diversas notícias e análises. As pesquisas, responsáveis por medir a temperatura da disputa, são parte fundamental das eleições. E, além de colaborar para a decisão do eleitorado, os números, quando debatidos em sala de aula, apoiam os estudos por meio da reflexão gráfica e da comparação de resultados, de maneira mais visual e objetiva.

O projeto #FakeToFora – quem vota se informa, do Educamídia, traz planos de aula voltados à análise eleitoral e sua divulgação, voltados a professores de todas as áreas, principalmente das exatas. “A matemática ajuda a entender melhor as pesquisas e pode auxiliar na compreensão da integralização dos votos, especialmente dos representantes do legislativo, que são eleitos pelo voto proporcional. Conceitos como quociente eleitoral, quociente partidário e cláusula de barreira só são compreendidos adequadamente com ajuda da matemática”, explica o professor Estevão Zilioli, responsável pelo desenho dos planos. 

Para o professor, a matemática contribui com qualquer assunto e, nas eleições, tem o papel de reduzir fatores emocionais na hora da escolha. “Escolher um candidato com base em indicadores objetivos, como redução da pobreza em seu mandato, ou o número de vezes que ele votou a favor ou contra princípios que o eleitor defende, parece-me ser bem mais responsável do que se basear apenas no que o candidato diz na campanha”, defende.

Para além da matemática

Pesquisador titular do IMPA (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), Roberto Imbuzeiro Oliveira reforça a importância das conexões citadas por Estevão e alerta sobre os cuidados que devem ser considerados quando as pesquisas de intenção de voto são abordadas. “Nada impede que as pessoas mudem de ideia depressa, como aconteceu na eleição de Wilson Witzel para o governo aqui no Rio de Janeiro, em 2018. Dias antes da eleição, ele ainda não era muito conhecido, mas foi para o segundo turno e ganhou”, exemplifica. 

Na pesquisa da véspera da eleição, o candidato tinha 14% das intenções de voto. No dia seguinte, do primeiro turno, Wilson obteve 41,2% dos votos válidos e passou para o segundo turno. “A pesquisa não é uma previsão, ela diz como está o eleitorado naquele momento”, ressalta Roberto. 

Outro ponto importante, de acordo com o pesquisador, é entender que os levantamentos eleitorais também lidam com outras questões, não só com a matemática. “Fazer uma pesquisa envolve desde o jeito que você a formula e apresenta as opções para o eleitor, até como você escolhe as pessoas para participar dessa pesquisa. As empresas trabalham para que as distorções sejam pequenas, mas, mesmo assim, é importante que o aluno entenda a distância entre o mundo ideal da matemática e o mundo de fazer uma pesquisa no chão das cidades, dos estados.” 

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Variações e manipulação

Os resultados da mesma pesquisa podem manipular uma eleição? Por que variam tanto? Os sugestionamentos vêm da matemática ou das interpretações? De acordo com Roberto Imbuzeiro, as respostas para tais perguntas têm a ver com amostragem e a escolha aleatória de quem vai ser pesquisado. Há também o lado psicológico do eleitor: qual o momento que realmente resolve em quem votar? 

“Um candidato aparece bem nas pesquisas e tem chance de se eleger contra o candidato que eu mais odeio. Então, vou votar nele, não no meu candidato favorito, para o cara que eu odeio não ir para o segundo turno ou ser eleito no primeiro”, exemplifica o pesquisador. “A pesquisa é feita para dar informação e não para mudar a opinião do eleitor por causa dos números, mas comumente ela tem esse efeito.” 

Se não for bem feito, o levantamento pode, sim, dar margens para manipulação. Um exemplo traduzido pelo pesquisador, ligado à pesquisa de opinião, ilustra essa situação: “Vamos imaginar que alguém vá até o seu bairro e pergunta se você é a favor de construir uma fábrica de sabão que vai gerar empregos. A resposta é sim ou não. Em seguida, outra pessoa pergunta se você tem medo da fábrica que vão construir. Só de ouvir a palavra medo, já fica com o pé atrás. Os alunos podem trabalhar isso em aula, pensando em como formular perguntas de maneira mais ou menos neutra para induzir, ou não, a resposta de um entrevistado.”

A narrativa da matemática depende, portanto, de sua construção ética. Segundo Estevão, não adianta fazer o levantamento estatístico de uma maneira primorosa se, na hora de fazer uma pergunta, ela for formulada de maneira enviesada, que induza o entrevistado ao erro. “Sozinha, qualquer área do conhecimento vai enxergar apenas uma parte do problema e terá muito menos chances de encontrar a solução. É preciso que as conexões entre as áreas aconteçam em qualquer aula”, ressalta.

No Brasil e no mundo, os grandes institutos de pesquisa usam critérios sociais e econômicos e consideram a diversidade da população antes de iniciar as entrevistas, destacam os pesquisadores.

Para combater as fake news

Uma das propostas dos planos de aula do projeto #FakeToFora é reconhecer a estratégia de apresentação de dados dos candidatos, levando os estudantes a refletir sobre confiabilidade e impacto das mensagens na mídia. Outras sugestões são conduzir uma pesquisa na prática e entender a ciência por trás dos levantamentos das intenções de votos. 

As atividades apoiam a checagem e validação dos dados. O professor pode, ainda, verificar o registro das pesquisas no site do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que informa todos os dados do levantamento, desde a metodologia utilizada até quem pagou pela pesquisa. “Muitas vezes, são usadas informações de enquetes em redes sociais, vídeos de manifestações e entrevistas não aleatórias como se tivessem o mesmo peso estatístico de uma pesquisa eleitoral registrada”, diz Estevão. “Outra forma de desinformar é usar os dados de uma pesquisa registrada, mas criar gráficos enganosos, com escala que não começa no zero, por exemplo, para dar a impressão de que um candidato está melhor do que diz o resultado”, comenta. 

O senso de responsabilidade do eleitor não deve ser esquecido, ainda mais para quem vota pela primeira vez. “Antes das pesquisas, que são um retrato e não garantem o resultado, é preciso, primeiro, entender o que cada candidato representa, quais valores, princípios e projetos são defendidos, olhar seu histórico e entender se aquilo que ele diz defender é o que faz na prática”, sugere Roberto. “Uma coisa é você olhar para a pesquisa e pensar estrategicamente. Outra, é votar sem pensar direito no que está fazendo porque toda a sua família e seus amigos vão votar naquela pessoa. Nunca, por razão nenhuma, qualquer pessoa deve se deixar levar por uma onda, seja a dos amigos ou a que aparece no Datafolha ou no Ibope”, completa. “É preciso votar de maneira responsável.”

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eleições, ensino médio, matemática

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