Memes são ferramentas para iniciar qualquer discussão em sala de aula
Montagens simples conseguem resumir assuntos complexos de forma criativa – e de um jeito que os estudantes entendem
por Vanessa Fajardo 10 de junho de 2020
Com linguagem sintética e bem-humorada, os memes além de divertirem a internet podem ser um bom instrumento para serem trabalhados em sala da aula. Até mesmo de forma remota durante o período da quarentena. Com mensagens que resumem assuntos complexos de forma criativa, eles fazem parte do universo dos jovens e têm potencial para serem grandes aliados dos professores.
Muitos deles trazem boas oportunidades para abordar assuntos de relações internacionais, geopolítica, atualidades, conceitos históricos ou até de física ou astronomia. Afinal por que não levar para a aula o meme que questiona o poder da natureza, de forma irônica, e mostra o sistema planetário com todos os planetas redondos, com exceção da Terra? Por que não aproveitar a enxurrada de memes para falar de comunismo, socialismo, fascismo?
De tão famoso, em 2017, o meme ganhou até um museu virtual inteiramente dedicado a ele em um projeto da UFF (Universidade Federal Fluminense). O Museu de Memes reúne um acervo disponível para pesquisadores e curiosos, além de referências bibliográficas e fontes de pesquisa sobre a “memesfera”.
Assim como demais peças de mídia, entretanto, o uso dos memes exige alguns cuidados. O primeiro é que ele não é indicado aos alunos de todas as idades. Como requer certo repertório, crianças dos primeiros anos do ensino fundamental não têm discernimento para interpretá-los.
Mariana Ochs, coordenadora do Educamídia, lembra que antes de consumir este tipo de linguagem, a criança precisa aprender a refletir sobre ela. “O meme tem muitas camadas, de humor, sátira, e até a possibilidade de um discurso ofensivo. É um tipo de mensagem que sintetiza muita coisa.”
Leia mais:
– A educação midiática como vacina contra a infodemia
– 4 planos de aula para combater a desinformação em tempos de coronavírus
– Como ajudar seus alunos a identificar fontes confiáveis de informação
Meme pode perpetuar discurso de ódio ou preconceito
O primeiro passo para introduzir este tipo de material é checar a fonte de informação e ter uma preocupação com o direito de imagem. Embora o meme não possa ser uma fake news, já que ele não se vende como conteúdo jornalístico, pode reproduzir uma desinformação, além de expor pessoas a situações ridículas na internet.
Depois de avaliar a imagem em si, é fundamental se atentar à mensagem e entender se ela dissemina e perpetua algum tipo de preconceito ou discurso de ódio.
“A imagem e o humor juntos são muito poderosos, por isso o meme se engaja rapidamente e viraliza, ele é muito sintético e fácil de se passar adiante. Por isso há possibilidade, por meio dele, de fazer chegar uma imagem danosa a alguém”, explica Mariana.
Fácil execução e possibilidade de agregar em várias disciplinas
Tomados os devidos cuidados, os memes podem ser trabalhados na escola em todas as disciplinas. Mariana Ochs afirma que os memes “encapsulam” pesquisa, comunicação e outras temáticas da educação midiática. “É importante descascar as camadas e refazê-las percebendo as diferenças entre impacto positivo e negativo. Aí você percebe que na comunicação sempre há escolha.”
O meme ainda tem outra vantagem: é uma peça de fácil execução. “Com um celular e uma frase em cima você faz um meme, tecnicamente não é complicado. Sinto que às vezes falta a compreensão dele enquanto texto profundo. Todo professor que tem capacidade de trabalhar com essa mídia, depende só de reconhecer essa possibilidade.”
Aula prática e ‘memetodologia’
Para quem se animou e pretende introduzir os memes nas aulas mesmo que a distância neste período de isolamento social e ensino remoto, a comunicadora e designer Karla Vidal montou um plano de aula disponível no site do Educamídia.
Karla atua com formação de professores por meio de um projeto chamado ProfLab, em Recife, e introduz o uso da mídia para abordar metodologias criativas. Para ela, os memes vieram como recurso de estímulo do pensamento criativo e podem trazer camadas da educação midiática para o dia a dia da escola.
“Um meme é um recurso que não vai esgotar um assunto e você vai usá-lo para desenhar a aula da forma que achar melhor. Vai ser um disparador de uma discussão, é uma forma de ilustrar um conceito e tem de fazer rir. Quando os alunos captam a mensagem que está ali, super funciona”, afirma Karla.
Os professores podem pedir que os alunos “interroguem” o meme, respondendo perguntas sobre qual contexto ele foi criado, mensagem, e linguagem adotada.
Pensando em uma atividade mais “mão na massa”, os docentes podem sugerir que a classe crie seus próprios memes. Para isso, Karla desenvolveu o que ela chama de “memetodologia”, que são seis passos para a criação de um meme. O primeiro é ter algo a dizer (falar sobre memes), em seguida, vem a pesquisa sobre o tema e a reflexão sobre as referências. Na sequência, a elaboração da mensagem; e a execução, de fato, neste passo vale passar o meme a um amigo para ver sua reação. Por fim, a análise e a conclusão (o amigo riu?); e o compartilhamento, se o material tiver boa intenção, claro.
Ao criar um meme, o aluno fará o exercício de sintetizar uma mensagem com sátira para que alcance o máximo de pessoas possíveis. Saberá, ainda, o que ele é capaz de ativar na cabeça das pessoas e encontrar mensagens subliminares.
O professor também pode montar seus próprios memes para iniciar debates e envolver os alunos [confira exemplos para te inspirar].
‘Curiosidade do aluno é pérola’
Jornalista há 20 anos, Tatiana Rosa, se formou também em pedagogia e há um ano ingressou na rede municipal de ensino de Jundiaí, no interior de São Paulo. Ela ministra oficinas de comunicação para alunos dos 4º e 5º anos do ensino fundamental onde pretende inserir um trabalho com os memes.
“Quero fazer um plano de aula específico porque o meme gera uma oportunidade grande de fazer os alunos pesquisarem e entenderem o contexto daquela imagem. O que está embutido naquela frase? Se não existe conhecimento prévio, eles vão buscar. Se o aluno se vê curioso, ali tem uma pérola que não pode ser desperdiçada.”
Compartilhe a sua aula com o Porvir e o EducaMídia
Se você utilizar memes para desenvolver alguma atividade de educação midiática durante as aulas remotas, compartilhe a experiência com a gente. A sua prática pode ser publicada no Diário de Inovações para inspirar outros professores brasileiros. Envie o seu relato aqui.