Game e resolução de problema chegam à universidade
Rob Kadel, especialista em aprendizado on-line, diz que educação superior deverá lidar com big data e certificação modular
por Patrícia Gomes 29 de julho de 2013
Considere duas formas de estímulo ao aprendizado na universidade. Na primeira, um aluno de uma disciplina de bioquímica deve estudar reações exaustivamente para responder às questões de uma prova. Na segunda, ele é submetido ao seguinte desafio: o mundo está diante de uma pandemia que pode causar a extinção da vida no planeta e ele deverá, acompanhado de uma equipe multidisciplinar – composta por jornalistas, especialistas em saúde pública e outros tantos que podem ajudar a resolver a questão a partir de outros pontos de vista além do bioquímico –, inocular o vírus e salvar o planeta. Em qual dos dois formatos o aluno aprende melhor? Provavelmente na segunda, que propõe um aprendizado baseado em problemas, opina o sociólogo Rob Kadel, professor da Universidade do Colorado e pesquisador do Centro de Aprendizagem Online e Rede de Inovação da Pearson EUA. Em visita ao Brasil, o especialista falou sobre o futuro do ensino superior.
O centro em que Kadel trabalha tem a missão de encontrar problemas de aprendizado e entender o que funciona melhor em educação. Para tentar responder a essa questão, ele e sua equipe estão desenvolvendo o game Contagion [Contágio], que deve começar a ser experimentado em maio do ano que vem em algumas universidades com alunos dos mais variados cursos. A intenção é propor um problema complexo que se apresente em forma de jogo on-line e que exija soluções elaboradas de diferentes áreas do conhecimento, num movimento que ele chama de “learnification of gaming”, ou a inserção de aprendizado significativo nos jogos. “O aprendizado baseado em resolução de problemas é uma tendência do ensino superior porque os alunos aprendem entre si e com seus mentores de uma forma mais parecida com a vida real. Os games também são tendência porque engajam mais os jovens”, afirma ele.
No decorrer do jogo, alguns desafios extras são adicionados à situação já difícil: se a internet ficasse inacessível, como seria o plano de comunicação do combate a essa epidemia global? Se a cura fosse encontrada, mas ela dependesse do sacrifício de crianças, o que fazer? Kadel diz que, neste ponto, entram discussões sobre ética com professores especializados no tema. “O papel do professor passa a ser muito mais de um facilitador, que vê os alunos aprendendo, oferece informações importantes e específicas, desafia cada um”, afirma ele. E, como na vida real, o jogo pode não ter vencedores porque nenhum grupo chegou à cura da doença ou o grupo vencedor pode ser aquele que salvou mais vidas.
De acordo com as pesquisas que vem desenvolvendo no centro da Pearson, Kadel aponta o uso de big data na educação superior como mais uma forte tendência. “Nós hoje já temos muitos dados a respeito do aprendizado dos alunos. O que ainda não descobrimos direito é como usá-los para personalizar o aprendizado”, afirma o pesquisador. Ele acredita que o caminho que a universidade deve seguir é o que a educação básica já vem experimentando com as plataformas adaptativas. “Em breve, os softwares serão capazes de dizer que um aluno aprende melhor vendo vídeo do que lendo um artigo. Que aprende mais no fim da tarde do que de manhã. Aí a plataforma envia vídeos por e-mail na hora que o aluno aprende melhor sobre aquilo que ele ainda não aprendeu”, afirma ele.
Um terceiro movimento apontado pelo pesquisador para essa etapa do aprendizado é, de fato, os Moocs (cursos on-line, gratuitos, de nível superior e para grandes públicos). “Ainda temos um problema que os Moocs não são cursos on-line. São videoaulas gravadas de aulas tradicionais. Mas fazer ensino on-line não é só filmar uma aula, mas aproveitar as ferramentas digitais para promover interatividade”, diz o professor. “Apesar disso, os Moocs estão e vão se tornar cada vez mais populares. Mas precisamos dar um passo atrás e entender a melhor forma de entregar o conhecimento”, afirma ele, que acredita na sala de aula invertida como um meio de potencializar os cursos. “Com esse modelo, os alunos estudam o material da aula antes e têm a oportunidade de trabalhar em grupo.”
Com os Moocs, também a forma de acreditação deverá ser repensada, uma vez que os cursos poderão indicar mais especificamente o que cada estudante é capaz de fazer, numa espécie de “certificação modular”. Os ambientes on-line permitem, defende o especialista, que o aprendizado possa ser expressado em outras formas além das provas. Portfólios digitais, áudios, vídeos também são maneiras válidas de o aluno mostrar que sabe. “Sem ir muito longe, acho que já é possível dizer que a educação do futuro não vai ter uma divisão clara do que é presencial e do que é on-line. Vamos ver isso de maneira integrada”, conclui ele.