Masculinidades: por que falar sobre isso na escola?
Educador Caio Cesar Santos vê o conceito como construção social que acaba amplificada na escola
por Ruam Oliveira 6 de janeiro de 2022
É muito provável que em algum momento da sua vida você já tenha ouvido a expressão “homem não chora”. Pode ser que a tenha ouvido, inclusive, dentro da escola. Já parou para pensar se isso faz sentido?
Cada vez mais presentes, as discussões sobre gênero e masculinidade têm levantado debates significativos sobre como os homens se vêem e se comportam em sociedade. Em oficina sobre o tema durante o 3º Congresso LIV Virtual, o educador e facilitador Caio Cesar dos Santos, relatou que grande parte do que se entende por masculinidades e a forma como elas foram construídas ao longo do tempo estão pautadas em violência.
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“Dentro do ambiente escolar, onde há uma intensificação desse processo, isso traz um gasto de energia e de atenção muito grande para os meninos, que se preocupam muito em cumprir todos esses processos para serem considerados ‘homens de verdade’, especialmente nessa idade em que eles tentam se provar como alguém”, explica.
O educador atua como facilitador do Projeto Memoh, uma iniciativa que que pensa e desenvolve diversas ações como rodas de conversa, mentorias e oficinas para tratar sobre masculinidades.
Nesse contexto em que os meninos precisam se provar como “homens de verdade”, Caio afirma que acaba se criando um ambiente onde a violência – não só por uma questão física, mas também de outras ordens – acaba sendo naturalizada, o que impacta na aprendizagem.
E o que a escola tem a ver com isso?
Levando em consideração que a escola é um espaço de conflitos e construções, deve também desempenhar um papel de lançar luzes sobre os impactos da masculinidade. Caio aponta que o próprio conceito de masculinidade é algo construído, baseado em regras que a sociedade impõe a meninos e homens para que sigam uma espécie de “comportamento esperado” que faz com que sejam considerados “homens de verdade”.
Caio destaca que “é importante falar disso na escola, não só porque a escola é um ambiente onde essas regras são intensificadas, mas porque também existe uma série de consequências negativas em relação ao comportamento, desempenho e às relações que são construídas nesse ambiente”.
Ter espaços onde os meninos possam falar sobre seus sentimentos e sobre como se sentem pode ser benéfico não apenas para eles mesmos, como também para as relações que constroem com as meninas. O ambiente tem um peso grande e se a pessoa não se sente confortável, não aprende, mesmo quando educadores adotam a melhor didática possível.
“Não adianta incentivar os meninos a falarem se a sala de aula, ou a escola como um todo, não está ainda preparada, não está ainda entendida de que esse vai ser um processo positivo para todo mundo. Mais do que criar esse ambiente confortável, é preciso tornar isso natural e ter uma continuidade”, diz.
No caso do corpo docente, uma maneira de contribuir é entendendo que também fazem parte do processo e eles próprios devem rever atitudes e questões pessoais que talvez estejam reforçando masculinidades negativas.
“Eu costumo sempre dizer que os professores têm uma responsabilidade muito grande no processo de vivência de uma sala de aula, que vai além da questão acadêmica, de ensinar matéria, passar conteúdo, mas de fato prover um ambiente bom para os alunos dentro de sala de aula, nas suas relações. E acho que a maneira de se contribuir passa muito por uma questão estrutural da escola, de como a escola permite, ou não, que esse debate aconteça de maneira contínua, organizada e de maneira conjunta com a família”, diz Caio Cesar.
É também uma mudança de postura. Para o educador, quando docentes têm uma maior proximidade com a turma, os estudantes tendem a ouvir mais e absorver o que está sendo dito, o que facilita conversas.
Em suma, falar sobre o assunto de maneira natural, propiciando espaços e situações onde os meninos não serão “zoados” por expressarem seus sentimentos é um papel fundamental para a escola que pensa em criar conversas sobre masculinidades. “É uma coisa bem prática mesmo. Incentivar os alunos a trazerem suas expressões de sentimento a partir de uma prática contínua”, diz o educador.