Professor da Bahia mobiliza escola e famílias ao levar Libras à educação infantil
Com aulas remotas e conteúdo pertinente à faixa etária, educador trabalha inclusão e empatia na cidade de Abaré (BA)
por Danilo Dias 1 de fevereiro de 2022
O projeto “Libras na Escola Inclusiva” é uma iniciativa voluntária, sem fins lucrativos, que surgiu da necessidade de aprofundar meus estudos de pesquisa acerca da Língua Brasileira de Sinais. Também busquei refletir sobre a importância do ensino de Libras desde a educação infantil para crianças ouvintes, a fim de criar um espaço de cidadania e inclusão, mostrando como essa língua pode influenciar o desenvolvimento de respeito e empatia – além, claro, de favorecer aprendizagens consideradas essenciais no Currículo Municipal e nas competências da BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Essa proposta foi idealizada no Centro de Educação Infantil Imaculada Conceição, localizado em Abaré (BA).
Minha principal motivação foi a experiência de vida de uma criança surda, de 4 anos, que estive acompanhando de maneira remota durante o período de isolamento social devido à pandemia da Covid-19. Pude conhecer de perto as dificuldades, os desafios de comunicação e de acessibilidade que ela enfrenta diariamente.
Por essa razão, levei a proposta de inserir Libras no cotidiano da escola. A partir da abordagem de conteúdo pertinente à educação infantil, foram desenvolvidas atividades de forma remota: os participantes vivenciaram momentos síncronos (interação virtual via Google Meet) e assíncronos (com roteiro de atividades).
No momento de acolhida das crianças e seus familiares, desenvolvi um bate-papo estimulando a participação e a socialização dos conhecimentos prévios sobre as diferentes formas de se comunicar. Nessa primeira etapa, vivenciamos uma experiência visual por meio da exibição de um episódio do desenho animado “Min e as mãozinhas”, totalmente em Libras (inclusive, é o primeiro desenho em Libras do YouTube). Essa atividade teve por intuito provocar a curiosidade dos alunos, aproximá-los da forma de comunicação utilizada pelas comunidades surdas brasileiras, e mostrar a naturalidade em ser e se comunicar de forma diferente.
Para apoiar o processo de aquisição da língua e desenvolvimento do vocabulário em Libras, propus que aprendessem a sinalização do próprio nome, sinais de cumprimento e apresentação pessoal. Nessa fase, a ideia é promover a interação e fazê-las interagir com os seus pares numa pequena conversa, reconhecendo o eu e o outro.
Na sequência, de maneira assíncrona e com o auxílio dos pais e responsáveis, foram realizadas atividades lúdicas inclusivas, estimulando a produção de recursos didáticos acessíveis em Libras, utilizando materiais recicláveis. Os estudantes realizaram uma produção por dia, atentando para as instruções compartilhadas por meio de vídeos gravados e acessados através da leitura de QR CODE presente nos roteiros.
É importante destacar que as atividades propostas possibilitaram a problematização do mundo real, e, assim, os alunos puderam exercitar a empatia, tendo consciência da aplicabilidade da aprendizagem da língua para incluir os amigos surdos que venham surgir no decorrer das suas vidas.
As crianças aprenderam brincando e, para estimulá-las, foram desenvolvidas ainda as seguintes propostas em Libras:
– a aprendizagem das cores, por meio da confecção de massinha de modelar caseira;
– os números de 0 a 10, com a produção de um boliche reciclável com garrafa pet;
– sinais do contexto familiar, ao criar uma uma árvore genealógica;
– sinais de materiais escolares, com uma atividade tátil;
– sinais das as estações do ano por meio da produção artística com representatividade do clima da sua localidade;
– sinais de sentimentos por meio de emojis;
– sinais do contexto de prevenção contra a Covid-19 por meio de cards, gravação de vídeos e sinalização de música temática.
Clique na seta amarela na imagem abaixo para visualizar a galeria de imagens.
A reprodução do vídeo e das imagens das aulas foram autorizadas pelos pais e responsáveis dos alunos.
Para verificação e consolidação das aprendizagens, encerramos o projeto com uma live. Nesse momento interativo, tivemos a presença de modo virtual da criança surda que me inspirou a idealização do projeto. Também participaram estudantes das outras turmas, pais/responsáveis e toda a equipe da escola. Na tarde de culminância, as crianças ouvintes tiveram a oportunidade de colocar em prática suas aprendizagens em Libras, estabelecendo uma comunicação básica com a coleguinha surda.
Dessa forma, o espaço escolar buscou a garantia dos direitos de aprendizagem, considerando que, antes mesmo da ação pedagógica, é importante se preocupar em trabalhar de maneira inclusiva. A inserção da Língua Brasileira de Sinais no cotidiano pedagógico permitiu quebrar as barreiras de comunicação existentes e contribuiu com o desenvolvimento dos estudantes ouvintes. Vale ressaltar que, por meio dessa ação, as crianças serão capazes de se reconhecer como sujeitos de direitos, respeitar as diferenças e construir a consciência de fortalecimento de políticas públicas para o bem comum de todos.
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Danilo Dias
Pedagogo, intérprete de Libras e estudante de Letras-Libras. Atualmente, é coordenador técnico da educação infantil do município de Abaré (BA).