Escola em Cabrobó (PE) restringe celular antes da lei e vê impactos positivos

Fones de ouvido conectados, acesso constante a redes sociais, trocas de mensagens e ofensas online, além do hábito de fotografar a lousa com o celular, era algo comum nas salas de aula em todo o Brasil. Na EREF (Escola de Referência em Ensino Fundamental) Evandro Ferreira dos Santos, em Cabrobó (PE), a situação não era diferente. Em 2023, essas práticas foram as principais queixas levadas à direção sobre o uso descontrolado de celulares pelos estudantes.

Nossa escola, que funciona em período integral e atende 150 alunos do 6º ao 9º ano, enfrentava um grande desafio: os professores estavam frustrados por competir com o que chamavam de “máquina da distração”. Os alunos pareciam cada vez mais imersos no mundo virtual e menos envolvidos nas atividades escolares. O impacto no processo de ensino-aprendizagem era evidente, tornando a disputa entre professores e dispositivos desleal.

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Diante disso, tomamos a iniciativa de buscar soluções. Após muitos debates na equipe pedagógica, analisamos os prós e contras e decidimos restringir o uso de celulares no ambiente escolar, permitindo seu uso apenas quando autorizado pelo professor para complementar conteúdos – medidas tomadas antes mesmo da Lei 104/2015que acaba de entrar em vigor nacionalmente.

A proposta foi apresentada na reunião de acolhida de pais e responsáveis, antes mesmo do início do ano letivo de 2024, e recebeu aprovação unânime. Posteriormente, comunicamos os estudantes por meio de mensagens nos grupos de WhatsApp das turmas. Recomendamos, inclusive, que as famílias reforçassem a conversa em casa. Isso facilitou a implementação da medida: 60% dos alunos retornaram à escola já cientes da decisão.

Claro que houve reclamação de alguns jovens, mas demos espaço para que eles argumentassem: assim que as aulas começaram, eu passei de sala em sala para conversar e ouvir a turma, além de explicar o motivo da restrição. Eles queriam jogar na hora do intervalo, principalmente na hora do almoço (como a escola é integral, a turma almoça na escola). Com o tempo, eles mudaram as atividades do recreio, focando nas conversas e nas brincadeiras, como falarei adiante. 

Regras acordadas sobre o celular na escola:

1. Os pais devem monitorar se os filhos deixam o dispositivo em casa, antes de sair para a escola. Em caso de descumprimento do acordo, a gestão irá recolher o celular e somente o responsável pelo estudante poderá recebê-lo de volta. 
2. Os estudantes que moram distantes da escola e necessitam de transporte para chegar até a unidade podem trazer o aparelho, mas devem deixá-lo com a gestão, na hora da entrada, e pegá-lo de volta apenas na hora da saída. 
3. A equipe escolar é responsável em manter a comunicação entre pais e estudantes enquanto estão na unidade escolar. 
4. Caso o uso do celular seja necessário para o desenvolvimento de alguma aula, os pais são comunicados com antecedência.

Os professores também foram orientados a usar seus celulares apenas para fins pedagógicos, como chamadas nominais, já que o diário de classe é eletrônico, ou atividades complementares. Apesar de não contarmos com laboratório de informática, temos 10 tablets disponíveis para pesquisas e trabalhos em grupo.

A aceitação foi rápida, e a adaptação surpreendeu positivamente toda a equipe.

O bom uso do celular na escola

Compreendemos que o aparelho celular poderia ser mais um recurso pedagógico, quando usado com este fim. Muitas vezes, porém, há um abismo entre o planejamento com o objetivo do uso do celular em sala de aula e a aplicação desse planejamento. E o verbo já é usado no futuro do pretérito (poderia) porque nos parece uma realidade difícil de mudar.

Além disso, pesquisas apontam o impacto negativo do uso excessivo de celulares na sala de aula. Em 2022, o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) revelou que 80% dos estudantes brasileiros se distraem com dispositivos eletrônicos durante as aulas, comprometendo o foco e o aprendizado.

Desde 2018, a OMS (Organização Mundial da Saúde) reconhece a dependência digital como um transtorno, conhecido como “nomofobia” — o medo irracional de ficar sem o celular ou outros dispositivos eletrônicos.

Impactos positivos

Crianças e adolescentes já nasceram imersos em um universo tecnológico voltado exclusivamente para a diversão, muitos sem a conotação de responsabilidade. Nesse contexto, a escola acaba sendo vista como a vilã.

Mas, ao refletir sobre nossa experiência no último ano, identificamos impactos positivos significativos. Os alunos demonstraram maior atenção nas aulas, realizaram as atividades com mais dedicação, eliminaram os distratores online e ampliaram a socialização com os colegas. Além disso, houve um aumento no repertório de diálogos entre os pares.

Outro destaque foi o resgate de brincadeiras e jogos físicos nos intervalos, como jogar bola, pular corda, corridas e jogos de cartas, como Uno, baralho e trilhas.

É importante destacar que cada escola tem suas particularidades, e os resultados podem variar conforme a realidade local.

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